Todo o primeiro domingo do mês, a partir das 10 horas, casais que formam famílias diversas, a maioria delas de dupla maternidade, chegam junto das filhas e dos filhos à Nossa Arena, em São Paulo, capital. Enquanto algumas das mães e pais recebem coletes para formarem os times para o jogo de futebol, outras pessoas vão para as quadras de areia, jogar tênis ou vôlei. Em um espaço próximo, as crianças brincam entre elas, acompanhadas pela equipe de recreação e pelas mães e pais que não estão praticando esportes, mas conversam entre si, trocando experiências, desafios, desabafos e comemorações. Perto do meio-dia, o churrasco fica pronto e o grupo se reúne para almoçar. Após a refeição, retomam os jogos e brincadeiras. Assim são os primeiros domingos de todos os meses das famílias que participam do Coletivo Rainball.

Foto Coletivo Rainball
Integrantes do Coletivo Rainball posam em campo de futebol junto com os filhos. Foto: Arquivo Pessoal

O Rainball, nome que mistura as palavras “arco-íris” e “bola” em inglês, surgiu em 2021, a partir de um convite de uma mãe para jogar futebol no grupo “Dupla Maternidade”, sobre o qual contamos a história na segunda reportagem do nosso especial de Dia das Mães. O primeiro encontro reuniu cerca de 15 famílias. “Foi um dia muito gostoso com um jogo bem recreativo, que é o que a gente faz até hoje. Não temos um time estruturado, no qual sempre vão as mesmas pessoas, temos um espaço para que as pessoas possam realizar esporte e fazer essa troca com quem vivencia realidades similares”, explica Natalie Paz, 36 anos, mãe das gêmeas Julia e Luiza, e membra da organização do Rainball.

Apesar de ter surgido no grupo de dupla maternidade, hoje o coletivo também é formado por outras famílias diversas, como casais de dupla paternidade e pais ou mães trans.

“Nos fortalecemos também nas outras diversidades, fazendo os nossos filhos conhecerem famílias com representatividade”, diz Natalie.

Atualmente, são mais de 130 famílias participantes, compostas, na grande maioria, por casais de mulheres. A cada domingo, até 40 famílias participam dos encontros.

Diversidade e inclusão

“Tem uma coisa que a Pat, minha companheira, sempre fala brincando: o time é quando a gente brinca de ser maioria, porque é como a gente se sente, acolhidas e vendo pessoas que vivem uma realidade muito próxima”, compartilha Day Monteiro, 36 anos, mãe da Martina junto de Pat Albuquerque, 36 anos, ambas integrantes do coletivo Rainball que participam desde o primeiro encontro.

“É um espaço onde as pessoas se encontram, estão juntas e encontram pares para se sentirem incluídas, a gente se sente pertencente”, reforça Juliana Castelo Branco, 42 anos, mãe do Matheus e do Rafael, e membra da organização do Rainball.

O coletivo já recebeu convites para participar de torneios, mas como não há um time fixo, as integrantes não se sentiram confortáveis em aceitar as propostas. “Os jogos vão acontecendo ao longo do dia com pausas, como é um jogo recreativo, tem pessoas que aguentam jogar cinco minutos, há outras que jogam a manhã inteira. É algo tranquilo, não precisa ser um atleta”, explica Juliana.

O grupo reúne desde mulheres que já praticam esportes, até aquelas que querem começar a jogar. “Têm muitas pessoas que jogavam no passado e agora viram a oportunidade de jogar novamente em um ambiente mais acolhedor, tem gente que nunca jogou e quer experimentar como é o futebol”, aponta a mãe do Matheus e do Rafael. O coletivo incentiva as mães que participam dos encontros, mas não necessariamente jogam, para que participem dos esportes. “Tem pessoas que nunca jogaram, por conta de ser mulher ou sentir que não tem uma estrutura corporal, e reforçamos: vai lá tentar, estamos aprendendo junto. Não tem cobrança, é tudo tranquilo e divertido”, relata Natalie.

Para além do esporte, os encontros no primeiro domingo do mês, também é um momento de lazer e trocas de experiências entre as famílias. “Com um grupo que você se reconhece, se identifica e tem uma potência, você consegue construir espaços de conexão”, diz Natalie. Day ressalta a importância de as mães realizarem as atividades que têm interesse. “Eu diria para as mães que elas podem absolutamente tudo. Eu lembro que eu ouvi uma frase quando ia ser mãe ‘você vai morrer e nascer outra pessoa’ e isso é muito assustador, dá medo de perder tudo o que você é. Você também pode se encontrar, retomar seus hobbies, a vida segue, continua e se transforma, tem que achar o que te faz feliz”, sugere. Natalie também deixa um conselho para as mães: “busque seu clã, encontre um grupo para chamar de seu, isso fortalece demais no dia a dia, saber que tem pessoas que você se identifica e pode confiar”.

Espaço para as crianças conviverem com outras famílias diversas

O próprio lugar dos encontros foi escolhido pelo acolhimento às mulheres e famílias diversas. “Quando temos filhos, ficamos muito voltadas ao mundo da maternidade, renunciamos muita coisa. Ter um espaço a que podemos ir, que recebe e acolhe as crianças é muito importante para todas as famílias”, afirma Juliana.

Integrantes do Coletivo Rainball e filhos em momento de confraternização. Foto: Arquivo Pessoal

Júlia Vergueiro, sócia proprietária da Nossa Arena, conta que o local foi fundado com o propósito de oferecer um espaço acolhedor e inclusivo para mulheres praticarem esportes. “Sabemos que aqui, as famílias de dupla maternidade, sentem-se seguras e respeitadas e isso nos deixa com a sensação de dever cumprido”, completa Vergueiro.

Day reforça que o grupo foi importante para que a filha, Martina, convivesse com famílias como a delas e com o esporte.

“Para nós, isso é o maior valor: ver outras famílias como a nossa. A Martina é uma criança que já fala e ela costuma dizer ‘ela tem duas mamães igual eu, igual a Carmen, igual a Juju’, ela costuma falar isso porque ela vivencia no Rainball”.

Recentemente, algumas das crianças começaram a entrar em quadra também para jogar futebol com as mães e pais. A outra mãe de Martina, Pat, descreve que a filha adora os encontros do Coletivo e sempre pergunta se aquele é o dia de jogar futebol. “Levamos ela no estádio para ver o jogo das meninas do Palmeiras e São Paulo e ela ficou esperando a hora dela participar do jogo também. Para ela, não existe uma distância do esporte”, conta.

Já Day recorda que nunca teve o costume de jogar futebol por não receber incentivo, pelo fato de ser mulher. “Eu não quero que a Martina viva algo similar. Quero que ela tenha uma relação diferente com o esporte, como a Pat teve. E o time trouxe isso para a gente. Nossa filha é uma menina que joga futebol e ela tem essa experiência de ver outras mulheres jogando, isso, para mim, já é sensacional”, complementa.

Como participar?

Para participar dos encontros do Rainball, é só entrar em contato com o projeto, pelo perfil no Instagram @instarainballoficial, para integrar a lista de participantes do próximo encontro, ou a lista de espera, e realizar o pagamento.

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  • Daniela Valenga

    Jornalista dedicada à promoção da igualdade de gênero para meninas e mulheres. Atuou como Visitante Voluntária no Instit...

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