“O portal de notícias do futebol feminino”. Essa é a definição do Fut das Minas, portal de jornalismo fundado em 2019 por Amanda Porfirio e que hoje reúne 18 mulheres, entre jornalistas, comunicadoras e uma advogada. Este ano, elas irão cobrir a Copa do Mundo de Futebol Feminino, que acontece na Austrália, entre os dias 20 de julho e 20 de agosto. Amanda e a repórter Mariana Santos irão estar presencialmente no país.

“Eu sempre falo que crescemos com o futebol feminino. O Fut das Minas era um em 2019, e é outro agora, assim como o futebol feminino se desenvolveu nesse período. É como se você estivesse em família. Eu me sinto em casa e vamos estar literal e presencialmente em casa, porque vamos estar exatamente entre aquilo que falamos e vivemos tanto: o futebol feminino. É surreal”, descreve Amanda. “Em 2019 eu acho que foi uma evolução de 50 anos em um, foi uma competição que mudou completamente o futebol feminino, talvez fique marcada como a Copa que mudou tudo. O Brasil se mostrou, apesar de tudo, como um país muito interessado”, complementa Mariana. Segundo as previsões, a Copa de 2023 deve superar a anterior e quebrar novos recordes.

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Mariana e Amanda com a pinguim Tazuni, mascote da Copa do Mundo de Futebol Feminino 2023 | Crédito: arquivo pessoal.

O Catarinas conversou com as duas sobre as expectativas para a cobertura da principal competição de futebol feminino do mundo e como é o trabalho do Fut das Minas. Confira a entrevista:

Como foi a fundação do Fut das Minas?

Amanda: Eu decidi criar o Fut das Minas oficialmente em 2019, no começo do ano. Mas a ideia começou no final de 2018, quando eu fui participar de uma Libertadores da América, em Manaus, de forma voluntária, porque eu já acompanhava o futebol feminino há um tempo e trazia para a pauta de um programa de TV que eu fazia em Natal. Eu estava cada vez mais interessada em me aprofundar e eu sabia que, na época, uma equipe feminina de Manaus, que é o Iranduba, tinha interação intensa entre a torcida e a equipe. Basicamente, olhando para Manaus, dava para perceber que o futebol feminino funciona muito bem lá, e eu achava curioso, porque estamos falando do Norte do Brasil, que tá fora do eixo Rio-São Paulo de desenvolvimento e crescimento do futebol feminino. Minha curiosidade me levou até Manaus e a vivenciar aquela Libertadores.

Vivenciar isso ampliou ainda mais o que eu sentia que o futebol feminino poderia chegar em outras pessoas. Eu lembro que meu pensamento foi “caramba, o Brasil precisa saber que isso aqui acontece”, porque isso é realidade: as pessoas vão para os estádios, tem uma torcida que grita o nome das jogadoras, torce, conhece mesmo o time.

Eu sentia falta de ter um veículo que tivesse todas as informações sobre futebol feminino: de atletas, de quando se leciona, trazer resultado de jogos e campeonato, porque nem isso tinha direito na época, mas também trazer outras coisas para além disso. Na ausência de um veículo específico que tivesse tanta informação só sobre futebol feminino, eu decidi criar. Na época, eu nem sabia mexer em site direito, mas recebi a ajuda de alguns amigos e criei no início de 2019. Eu nem tinha pensado nisso, mas coincidiu de ser o ano de Copa do Mundo de Futebol Feminino na França e acabou que entre antes da Copa para depois, explodiu e cresceu muito em números, engajamento e tomou uma proporção que nem eu esperava. Depois fomos ampliando, com Instagram, Facebook, Twitter, TikTok, chegamos a fazer Podcast. Mas eu acho que desde a criação até agora, o propósito não mudou, que é fazer com que mais pessoas conheçam e consumam o futebol feminino.

Como foi e está sendo esse caminho de cobrir a Copa?

Mariana: A Copa não começa agora para nós. Desde que entrou mais meninas na equipe, em abril de 2020, é um sonho e uma meta que tínhamos, de poder cobrir grandes competições. Ficamos esperando um bom tempo para saber se a Copa seria na Colômbia ou Nova Zelândia, que estavam na final. Se fosse na Colômbia, seria melhor para nós, mas no fim, ficou Austrália. Na época pensamos “beleza, talvez na próxima vamos”. Mas como faltava um tempo ainda, começamos a estruturar a ideia de que tínhamos tempo e poderíamos tentar ir para a Austrália e começamos a trabalhar com isso.

Desde abril de 2020, temos feito o trabalho para conseguirmos ir, pelo menos, eu e a Amanda, nesse primeiro momento. Começou com a gente guardando dinheiro, procurando parcerias, vendo o preço da passagem. Hoje o site não tem financiamento, mas para a Copa do Mundo, estamos no caminho de conseguir custear tudo. Tivemos a perda do Instagram no meio do caminho, que tínhamos um público alto e as marcas estavam começando a olhar, mas o nome Fut das Minas continua forte. O que nos segurou é a força do projeto que está sendo construído desde 2019 pela Amanda.

Falando dessa equipe, são todas jornalistas, estudantes de jornalismo, temos uma advogada, uma designer e as outras são todas profissionais da comunicação. Prezamos por um portal que seja realmente sério e trabalhe total no jornalismo e na ética. Eu acho que isso também é nosso diferencial: saber que por trás de todo o nome do Fut das Minas existe uma equipe profissional. Apesar de ser um trabalho voluntário, levamos muito a sério.

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A equipe é formada por 18 profissionais, entre elas, a repórter Isabelle Galvão | Crédito: arquivo pessoal.

E como estão as expectativas para a Copa?

Amanda: Conversamos que tem tanta coisa para resolver que ainda não caiu a ficha que vamos cobrir uma Copa do Mundo. As expectativas são as melhores. Até a Mariana adiantou do quanto orgulho é ter um veículo que é totalmente artesanal, que embrionamos e vimos crescer ter esse reconhecimento. Estamos indo cobrir uma Copa, levando o nome dele no crachá, acho que isso é o que mais nos orgulha. Mas é muito trabalho: não temos agência de viagem, estamos resolvendo toda a nossa logística, para um país que conhecemos pouco. Ainda não está dando muito frio na barriga, mas vai dar muito quando resolvermos tudo o que tem. Vamos cobrir o maior evento de futebol feminino do planeta.

Eu sempre falo que crescemos com o futebol feminino. O Fut das Minas era um em 2019, e é outro agora, assim como o futebol feminino se desenvolveu nesse período. É como se você estivesse em família. Eu me sinto em casa e vamos estar literal e presencialmente em casa, porque vamos estar exatamente entre aquilo que falamos e vivemos tanto: o futebol feminino. É surreal.

A Amanda comentou dessa mudança no contexto do futebol feminino. Como é cobrir o futebol feminino no Brasil, hoje?

Amanda: Para mim, se eu fosse fazer uma comparação, todo mundo fala que a pandemia fez vivermos dez anos em dois, e se olhar para quatro anos atrás, eu vou ter a mesma perspectiva em relação ao futebol feminino. Apesar de que ainda precisamos avançar muito, existem coisas que até regrediram, como as transmissões. Temos um campeonato brasileiro, hoje, que tem como detentora a Globo e está sendo menos transmitido do que antes, tem jogos que estão sem transmissão.

Mas quando eu falo sobre Copa do Mundo, de olhar pro global, o futebol feminino cresceu e avançou muito. Às vezes é assustador a velocidade que isso aconteceu, mesmo tendo uma pandemia no meio. Eu me sinto realmente crescendo junto com ele. Foi até uma conversa que eu tive com um colega da mídia independente lá atrás: o futebol feminino está se profissionalizando cada vez mais e precisamos nos profissionalizar cada vez mais, porque é algo que sempre esperamos, torcemos para acontecer, mas precisamos acompanhar, porque só dessa forma vamos engrandecer a modalidade. A sensação que eu tenho é exatamente essa: de um crescimento, tenho até medo de falar acelerado, porque precisa ser ainda mais, mas aconteceu muita coisa em um curto espaço de tempo. E que bom.

Eu acho que a Copa de 2019 foi uma grande virada de chave em todos os setores, seja mercado, gestão, clubes, sociedade. Parece que acordaram e disseram “caramba, as mulheres merecem atenção, investimento, desenvolvimento”.

Olha, 2016 para 2017, eu estava escrevendo um artigo científico dizendo exatamente que era difícil encontrar informação sobre futebol feminino nos portais e hoje temos uma infinidade de páginas independentes de mídia e a grande mídia falando. É só um exemplo de como mudou e estou falando de seis anos atrás. É algo assustadoramente bom acompanhar esse crescimento, mas sabemos também que ainda existe muito mais.

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Amanda Porfirio é a fundadora do Fut das Minas | Crédito: arquivo pessoal.

Vocês gostariam de adicionar mais comentários?

Mariana: Eu queria falar que, como a Amanda disse, a Copa de 2019 foi uma mudança chave que eu acho que as pessoas nem esperavam que fosse, e a de 2023 é o contrário: as pessoas esperam que vai ser. Todos os recordes que foram batidos em 2019, provavelmente vão ser batidos neste ano.

Em 2019 eu acho que foi uma evolução de 50 anos em um, foi uma competição que mudou completamente o futebol feminino, talvez fique marcada como a Copa que mudou tudo. O Brasil se mostrou, apesar de tudo, como um país muito interessado.

O jogo das oitavas de final contra a França foi um dos mais assistidos da história da Copa do Mundo. A final foi mais assistida no Brasil do que em qualquer outro lugar no mundo. Isso de certa forma mostra que, apesar de ser passos lentos, o Brasil tem se mostrado interessado na Copa do Mundo e talvez esse ano, se mostre ainda mais e passe a investir mais.

Outra coisa que queria adicionar, que eu e a Amanda sempre conversamos, é sobre as categorias de base. A CBF convocou pela primeira vez a seleção sub 15, meninas pela primeira vez vão representar e treinar pela seleção, isso era inimaginável, porque antes brigavamos por ter um profissional ou uma seleção principal com base. Pode ser que não tenha jogos oficiais, por conta da idade é difícil, mas só de saber que elas vão se reunir para treinar e vestir a camisa da seleção, vai ser muito mais fácil quando essa menina que hoje tem 15, tiver 20, 22 e chegar na profissional. O investimento em base melhorou, não é o ideal, não é o essencial, mas é um passo muito grande que temos dado aqui e em outros lugares no mundo. Seleções que estão sendo campeãs lá fora, são seleções que investiram na base.

Amanda: Eu queria colocar um exemplo: eu acabei de ver comentários de pessoas que estavam na fila virtual para comprar ingresso para a Copa do Mundo e tinha lentidão, aquelas que coisas que acontecem quando a coisa estoura. Como a Mariana falou, esperasse que a Copa quebre recordes, mas essas coisas ainda me surpreendem. Estamos falando de uma Copa na Oceania e de brasileiras cruzando o oceano para assistir ao Brasil e outros países jogarem. É uma loucura para nós, da mídia independente, que está indo, imagina para torcedoras. O que mais me deixa feliz é ver que é um interesse de todos.

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  • Daniela Valenga

    Jornalista dedicada à promoção da igualdade de gênero para meninas e mulheres. Atuou como Visitante Voluntária no Instit...

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