A porta de ferro se abre e os cartazes com as cores do arco íris chamam a atenção logo na entrada. Pela decoração dos corredores da Escola de Educação Básica Irmã Maria Teresa, já dá pra perceber que a pauta homofobia saiu das rodas de conversas dos 1.500 estudantes da unidade de ensino e ganhou o espaço escolar. Numa ação inovadora um dos maiores colégios públicos de ensino médio da Palhoça, região da grande Florianópolis, realizou entre os dias 14 a 17 de maio a Semana da Diversidade com o tema “A educação transforma”.
A atenção do grupo de adolescentes vidrados na palestra do professor Robson Ferreira Fernandes, chamava atenção de quem entrava na sala. Robson falava de um tema complexo até para quem estuda a respeito, explicava sobre identidade de gênero e como se denominam cada letra da sigla LGBT. Entre vídeos e explicações, o professor que já foi premiado em 2015 pela Secretaria de Direitos Humanos do governo federal por debater o tema da diversidade numa escola estadual da região, apresentava aos estudantes os altos índices brasileiros de violência contra os homossexuais. “A homofobia mata e começa a matar quando você dá aquele apelido ao seu amigo e ele não gosta”.
As informações do professor foram baseadas no levantamento feito pelo Grupo Gay da Bahia (GGB) divulgado em janeiro deste ano, em que apresentou os dados de 2017. Com um número de violência contra os LGBT três vezes maior que o observado há 10 anos, os dados constataram 445 mortes entre lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais por motivos de homofobia. O local das mortes em sua maioria foram registrados nas vias públicas (56%) e dentro da casa da vítima (37%). A forma de violência também foi levantada: 136 foram com armas de fogo; 111 com armas brancas; 58 suicídios; 32 por espancamento; 22 por asfixias e ainda registros por apedrejamento, degolamento e desfiguração do rosto. Em abril o GGB divulgou dados do trimestre que registrou 126 mortes de janeiro a 10 de abril de 2018.
.:. Dados atualizados diariamente revelam que no 140º dia do ano, 153 pessoas morreram por causa da homofobia. Acesse o link aqui e acompanhe os dados.
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Conforme o professor falava, Nathalia Gonçalves Defreyen e Luiza D’Avila Lourenço, ambas estudantes do terceiro ano do ensino médio, balançavam a cabeça num gesto de concordância com o professor ou esboçavam indignação quando Robson apresentava dados sobre o preconceito no Brasil. Sentadas na primeira fila do auditório lotado, as duas se identificaram como feministas. Segundo Nathalia, o tema sobre homossexualidade demorou pra ser debatido na escola. “O que a gente debate aqui, a gente já conversa há muito tempo entre nós, com os nossos amigos e pela internet. Mas assim, dentro da escola, com professores e gente que estuda sobre isso, é a primeira vez que vi”. Para as estudantes toda a experiência está sendo muito importante, por que ajuda a quebrar alguns tabus de colegas e até de professores.
A atividade que contou com o envolvimento do corpo docente e teve respaldo da direção escolar, foi pensada ainda na construção do calendário no início do ano. “Primeiro a gente queria fazer em um dia, trazer um palestrante apenas, mas depois percebemos a necessidade de expandir e promover algo maior que pudesse mexer com todos os alunos”, explicou Regina Gomes de Oliveira Flor, professora da escola e uma das organizadoras da semana da diversidade.
Arte na escola para falar da homofobia
Para os estudantes o tema também chegou com antecedência. Com o concurso de cartazes sobre o combate à homofobia, um mês antes os alunos se debruçaram sobre a pauta e construíram 40 cartazes que além de colorirem os corredores da escola, trouxeram reflexões feitas pelos adolescentes sobre os impactos do preconceito na vida das pessoas. Na exposição dois cartazes foram eleitos através de voto, como os que transmitiram a melhor mensagem.
Durante a semana até os intervalos das aulas o tema da diversidade estava presente, através do grupo de teatro Insanus, composto por alunos da escola o recreio de 20 minutos ganhou arte com a apresentação de esquetes que refletiam sobre a descoberta da sexualidade e o enfrentamento ao preconceito.
A iniciativa da escola gerou algumas polêmicas nas redes sociais do colégio, assim como o pedido de dois pais para que os filhos não participassem das atividades. Num total de 1.500 estudantes, a professora da comissão organizadora Regina avaliou como positiva a semana. “Foram quatro dias de intenso debate que usamos a arte, o vídeo e tantas outras ferramentas pedagógicas para conversar com os estudantes e professores da importância do respeito para as escolhas individuais e respeito à orientação sexual”.
Ações práticas já foram encaminhadas a partir da organização e realização da Semana da Diversidade. Um grupo de estudo que se encontra extraturno a cada 15 dias, debate feminismo, gênero e diversidade. Coordenado pelo professor Robson, ele destaca que a diversidade sexual não pode ser ignorada. “Ela está no meio da escola, dos adolescentes. É aqui que nasce esse reconhecimento. Se o preconceito nasce em casa, nos ciclos de convivência, é na escola que vai combater, com conhecimento e informação”.