Neste mês de junho, completa um ano e cinco meses que a pedagoga Iclairi Viana Figueiredo, de 29 anos, morreu por complicações após o parto do seu segundo filho na Ilha Hospital e Maternidade, instituição privada de Florianópolis (SC). A morte está sendo investigada como homicídio culposo — quando não há intenção de causá-lo — pela Delegacia de Proteção à Criança, ao Adolescente, à Mulher e ao Idoso. Em 25 de abril de 2023, o inquérito foi finalizado e remetido para o Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), mas retornou à autoridade policial dois dias depois para complementação das investigações. A falta de banco de sangue e de acesso à Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) é apontada como determinante para o desfecho fatal. “O médico disse que fez tudo o que podia e que se estivéssemos em um hospital público, ele teria como socorrê-la”, conta a mãe da pedagoga, Icleusa Viana, de 53 anos.

A seguir, contamos como foram as últimas horas de vida de Iclairi com base no prontuário ao qual tivemos acesso e na entrevista com sua mãe.

As últimas horas de vida de Iclairi 

Com 41 semanas, às 7h36 de 6 de janeiro de 2022, Iclairi foi internada na maternidade. Ela estava bem e desejava que o nascimento de Noah, que agora tem um ano e quatro meses, ocorresse de forma natural, pois anteriormente havia tido uma cesárea. A sua única preocupação era a ausência de dilatação, mas ela foi orientada de que poderia ser induzida com alguns protocolos. E foi assim que, às 10h30, após conversa com o marido e com a paciente, o médico autorizou a indução por ocitocina, hormônio que tem a função de promover as contrações musculares uterinas. 

Ao saber da notícia, através do seu genro que acompanhava o parto do hospital, Icleusa estranhou a decisão, pois na noite anterior a filha havia se mostrado contrária ao uso do hormônio. “Ela disse que a única coisa que não queria era ocitocina, que ela sabia que era muito prejudicial”, afirma. Icleusa seguiu de perto a gestação de Iclairi nos últimos meses, porém decidiu ir trabalhar no dia do parto, por se considerar muito ansiosa. “Eu estaria ocupada e sofreria menos. Não tinha nada que eu pudesse fazer naquele momento. Eu estava trabalhando, mas ligada”, conta.

Com quase oito horas de internação, às 15h30, a enfermeira obstétrica que estava junto à Iclairi informou ao médico obstetra sobre o início das contrações. Uma hora e meia mais tarde, a família foi comunicada do rompimento da bolsa. Às 18h30, o médico fez o primeiro exame pessoalmente na parturiente e constatou um sofrimento fetal agudo, o que indicava a necessidade de uma cesárea de urgência. 

Por volta das 19h, Noah já havia nascido e sido encaminhado para a UTI neonatal. Enquanto a parturiente seguia em cirurgia, já apresentando atonia uterina, quando o útero fica com o tônus reduzido e não para de sangrar. Infelizmente, o quadro evoluiu para a retirada do útero, procedimento chamado histerectomia puerperal. A família foi comunicada por volta das 20h de que fariam o procedimento. Iclairi, que sonhava em parir três filhos, não poderia mais gestar. A equipe médica recém havia coletado exames laboratoriais para entender o quadro geral da paciente. Neste mesmo horário, sua mãe, Icleusa, chegou à maternidade para acompanhar de perto o estado da sua filha, sem saber que a partir de agora os informes seriam cada vez mais escassos.

Duas horas depois, a enfermeira obstétrica deu uma notícia boa à família. “Ela nos comunicou que Iclairi tinha saído do centro cirúrgico, estava indo para a sala de recuperação e estava estável, que dali uns 30 ou 40 minutos ela acordaria”, conta a mãe. Porém, nos registros do prontuário, a situação era diferente. A paciente havia recebido duas bolsas de sangue, seguia instável, entubada, medicada e sob os cuidados da equipe de anestesistas. E aguardava vaga em UTI para ser levada a outro hospital.

A partir das 22h, a equipe médica passou a contatar vários hospitais para transferência dela a uma UTI, porém só conseguiu vaga por volta das 23h30, quando o médico responsável pelo Hospital de Caridade autorizou a transferência. Icleusa conta que com a ausência de informação, a angústia só crescia. “À meia noite nos comunicaram que ela seria transferida para o Hospital Caridade. Eu, meu marido e minha filha mais velha, que estávamos aguardando lá fora, fomos para lá, porque queríamos vê-la na chegada. Só que esperamos mais de uma hora, o que para mim foi uma eternidade. Aí o meu genro disse que ela não seria transferida, que não estavam conseguindo estabilizá-la”, diz. 

Por volta das 0h30 de 7 de janeiro, o médico da ambulância, ao chegar e avaliar a paciente, considerou muito arriscado realizar o transporte, devido às suas condições hemodinâmicas – de circulação de sangue. “Nós voltamos para a maternidade, a ambulância estava na frente da recepção, tinha um tumulto, ninguém dava informação ou explicava o que estava acontecendo. Minha outra filha conseguiu escapar, chegou lá e viu várias pessoas em volta da mesa tentando reanimá-la. Ela desceu acabada”, conta a mãe de Iclairi.

Por volta das 2h da madrugada, o médico socorrista falou com a família. “Foi a única pessoa que deu informações concretas”, diz Icleusa. Ele teria comunicado que a equipe médica tentou reanimar a sua filha naquele momento, e que não havia nada que ele pudesse fazer, pois ela não tinha condições de ser movimentada. 

“Ele explicou que faltou sangue para ela e que não tinha estrutura suficiente para os procedimentos técnicos de que ela necessitava. Não tinha estrutura para atendê-la naquele momento, o que, na realidade, era uma UTI. O meu genro explicou que ela recebeu duas bolsas de sangue, mas ela perdeu cinco. Não tinha na clínica, eles pediram para o Hemosc [Centro de Hematologia e Hemoterapia de Santa Catarina] e quando chegou ela já não estava em condições de receber”, afirma Icleusa. Ela acredita que naquele momento a filha já havia morrido. 

Nos andares de cima do hospital, no centro cirúrgico, às 1h10, a gestante havia recebido mais duas bolsas de sangue, porém dez minutos depois, ela teve uma parada cardiorrespiratória. O óbito de Iclairi foi declarado às 2h28. 

“Ficamos aguardando até às 3h30, quando o Dr. desceu e nos deu a notícia do falecimento dela. Ele segurou as minhas duas mãos e explicou o que havia acontecido de uma forma bem genérica. Disse que ele fez tudo o que podia e que se estivéssemos em um hospital público, ele teria como socorrê-la, ele falou umas duas vezes isso”, conta Icleusa. 

Morte materna em hospital privado de Florianópolis é investigada como homicídio culposo
Ilha Hospital e Maternidade afirma priorizar parto humanizado no seu site. | Imagem: Reprodução.

Protocolos médicos podem direcionar decisões e diminuir riscos 

Em 90% dos casos, o óbito materno é considerado evitável, pois as soluções para preveni-lo são bem conhecidas e estão relacionadas ao acesso a serviços e cuidados de saúde adequados. Conversamos com duas especialistas sobre práticas médicas e estruturas necessárias para evitar mortes maternas, como a de Iclairi.

Em entrevista ao Catarinas, a ginecologista Halana Faria explica que em situações de pós-datismo, quando a gestação se prolonga além da 41ª semana, existem protocolos para induzir o trabalho de parto que devem ser considerados para que o uso da ocitocina seja seguro. “Antes de mais nada é preciso preparar o colo. Se o colo é grosso, se o colo ainda está fechado, se não tem uma dilatação adequada e a paciente não tem contração, é preciso usar misoprostol para prepará-lo. Para o colo se afinar, amaciar, e depois iniciar a ocitocina”, afirma. 

A médica especialista em ginecologia e obstetrícia integrante do Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde, Mariana Pércia, adverte que todo parto que inicia com ocitocina, passa de baixo para alto risco. Conforme recomenda, a preparação do colo pode ser feita através do Método Krause. 

“Quando você está diante de uma paciente que tem uma cesárea anterior, você pode iniciar a indução do parto com um método chamado Krause, que você usa uma sonda e coloca dentro do colo para fazer um peso e uma dilatação mecânica. Esse é um método bem utilizado, que evita usar ocitocina antes do tempo. Muitos lugares não fazem, acabam iniciando com a ocitocina, e aumentando para doses muito altas. O que pode aumentar o risco de hemorragias pós-parto”, afirma. 

Além da preparação do colo, Halana Faria aponta outras questões que merecem atenção. “O uso desse medicamento exige avaliação de batimento cardíaco fetal a cada 30 minutos, e que a ocitocina seja aumentada aos poucos, por uma bomba de infusão. O que acontece em muitos casos é que a ocitocina não é colocada em bomba, mas direto no soro fisiológico. Isso aumenta em muito a chance de sofrimento fetal agudo e de necessidade de cesariana de emergência”, afirma. 

Diante de uma hemorragia pós-parto também existem protocolos bem estabelecidos. “Você inicia um protocolo com massagem uterina, tem uma sequência de medicações a serem feitas, entre elas o misoprostol, que ajuda nessa contração uterina. Você usa essas medicações como protocolo medicamentoso. Se elas não derem resultado e você está diante de uma cesárea, você deve procurar algum lugar sangrando naquela cicatriz uterina feita para abrir o útero e tirar o bebê. Se não tiver nenhum lugar sangrando, tem alguns protocolos cirúrgicos para seguir”, afirma Pércia. 

A médica explica que a histerectomia puerperal é uma das decisões que a equipe médica pode tomar em situações que chegam a este ponto.

“A retirada do útero no pós-parto imediato é complexa, tem um alto índice de complicações, porque é muito difícil tirá-lo por estar muito amolecido. Pode ter uma perda de sangue muito importante. Tem que ficar atenta com a situação hemodinâmica da paciência e entrar de maneira oportuna, se for necessário, com concentrado de hemácias e, quando necessário, de plasma também se tiver uma perda sanguínea maior do que o esperado, que na cesárea é entre 500 a 700 ml”, diz.  

Para Pércia, as vagas de UTI para gestantes muitas vezes são negligenciadas e, em partos que passam a apresentar complicações, têm que estar disponíveis.

“Diante de uma situação de histerectomia puerperal, de hemorragia maciça e a necessidade de uma transfusão sanguínea, é importante a existência de vaga de UTI, porque essa paciente que está em uma instabilidade hemodinâmica precisa de uma vigilância permanente. Muitas vezes ela desenvolve distúrbios hidroeletrolíticos e isso precisa ser corrigido em UTI, porque podem levar à morte da paciente”, afirma a obstetra. 

Óbito materno: uma violação de direitos que pode ser evitada 

Iclairi figura entre as 27 mortes maternas que ocorreram em Santa Catarina entre janeiro e novembro de 2022, segundo relatório da Diretoria de Vigilância Epidemiológica. Morte materna é o óbito de mulheres durante a gravidez ou até 42 dias após o seu término devido a qualquer causa relacionada ou agravada pela gestação, exceto causas acidentais ou incidentais.

“A mortalidade materna está relacionada a uma violação de direitos, porque a pessoa precisa ter acesso a um planejamento reprodutivo, ter autonomia para escolher as opções entre uma gama de recursos que estão disponíveis. Desde o método concepcional, que precisa estar garantido, até a decisão de ficar grávida, que também é dela. Isso tem que estar assegurado no sentido do direito à saúde, do acesso aos serviços, de um acompanhamento de qualidade que possa prever a identificação de fatores que possam transformar aquela gestação em uma gestação de risco”, afirma a epidemiologista Rosanna Iozzi, aposentada da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro. 

Na avaliação de Iozzi, o quadro apresentado por Iclairi é um muito comum em relação às causas de morte materna relacionadas a razões obstétricas diretas, aquelas que ocorrem por complicações durante a gravidez, parto ou puerpério por conta das intervenções, omissões, tratamento incorreto ou uma cadeia de eventos resultantes dessas causas. No Brasil, as principais causas desse tipo são: hipertensão, hemorragias, infecções puerperais e aborto. Também existem as causas obstétricas indiretas, causadas por doenças que estavam presentes antes da gravidez ou que surgiram durante a gravidez; e foram agravadas pelos efeitos fisiológicos da gestação, como tuberculose, HIV, doença cardíaca, malária, dengue, Covid-19.

Entre 2020 e 2021, o número de mortes maternas aumentou consideravelmente no país e em Santa Catarina, se comparado com anos anteriores à pandemia, segundo o Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM). Em 2019, no Brasil, foram registrados 1576 óbitos maternos. Em 2020, esse número subiu para 1965. Em 2021, escalou para quase o dobro de antes da pandemia: 3030. Em Santa Catarina, foram registradas 30 mortes em 2019. Em 2020 e 2021 esses números mais que dobraram, chegando respectivamente a 77 e 85 óbitos maternos. Alguns estudos publicados sobre o tema indicam que a morte dessas mulheres tiveram como causas, além do coronavírus, a falta de assistência e o acesso desigual ao sistema de saúde.  

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Fonte: Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM).

“Na pandemia de Covid, mulheres grávidas não foram postas no centro da resposta. O Brasil teve uma das taxas mais altas de morte materna na pandemia. Nenhum outro país experimentou tamanha tragédia. Não foi Covid o que matou essas mulheres: foi o fracasso na assistência, os sistemas de saúde não estavam preparados para cuidar da normalidade da gravidez no caos que o país viveu com Covid”, afirma Débora Diniz, pesquisadora da Anis Instituto de Bioética. 

A desigualdade presente no país impacta diretamente no acesso à saúde de gestantes e puérperas. Na área da saúde, leva-se em conta os chamados determinantes sociais, que se referem a fatores que podem colocar a população em risco como, por exemplo, aspectos econômicos, sociais, raciais, regionais, etc. Por isso, a evitabilidade das mortes maternas está diretamente relacionada com a distribuição igualitária de recursos.  

“A evitabilidade é a possibilidade de acesso, de manejo adequado, de tecnologia médica, diagnóstico, atenção à gravidez, parto e puerpério. A possibilidade de controle da fecundidade e de acesso a interrupção da gravidez. É esse conhecimento para prevenção de uma série de situações que a rede de serviços de saúde tem que estar organizada para atender. A evitabilidade está relacionada aos processos de trabalho, aos acessos dos bens de serviços, aos protocolos, às rotinas. Se temos tudo isso, porque não evitamos?”, diz Iozzi. 

Toda morte materna deve ser investigada pelos serviços de saúde  

O Brasil se comprometeu junto à Organização das Nações Unidas (ONU) a atingir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Entre as metas a serem alcançadas até 2030, está a redução da mortalidade materna para no máximo 30 mortes por 100 mil nascidos. No entanto, estamos muito longe disso. De acordo com dados do Observatório Obstétrico Brasileiro, em 2021, a razão de mortalidade materna alcançou 107.53 mortes a cada 100 mil nascidos vivos, ou seja, quase o dobro do ano anterior à pandemia, em 2019, quando a taxa foi de 55.31 a cada 100 mil nascidos vivos. 

“Apesar de vivermos uma situação em que a Razão de Morte Materna no país é elevadíssima, na vida de um grupo de profissionais de saúde, ela ainda vai ser baixa. Os profissionais poucas vezes vão experimentar uma situação de morte materna em sua vida profissional, cada uma dessas situações deve ser vista como um evento sentinela. Toda a sociedade, todo o grupo de pessoas que experimentou essa situação deveria se preocupar e olhar para isso com o máximo de atenção. O que aconteceu aqui? Como podemos fazer com que isso não volte a acontecer?”, afirma a ginecologista Halana Faria. 

Os óbitos maternos e os óbitos de mulheres em idade fértil, independentemente das causas declaradas, são considerados eventos de investigação obrigatória, desde a Portaria GM/MS n. 1.119 de 5 de junho de 2008. Cabe aos serviços de vigilância   epidemiológica identificarem e investigarem as circunstâncias que causaram essa morte com o objetivo de encontrarem os fatores determinantes, suas possíveis causas, e subsidiar a adoção de medidas que possam evitar uma reincidência. A coleta dos dados, a análise do óbito e a conclusão devem ocorrer dentro de 120 dias. Em Santa Catarina, em 2021, apenas 58% dos casos foram investigados dentro do tempo adequado. 

“No caso em questão, houve a necessidade do banco de sangue, que deveria estar disponível para que o desfecho não fosse o óbito. Esses óbitos vão para o Comitê de Prevenção do Óbito Materno para serem discutidos, mas o caráter é educativo, não é punitivo, não compete à saúde ter esse papel”, explica Iozzi. 

Segundo a epidemiologista, que atua em um projeto de fortalecimento dos comitês do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente, Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz), eles existem em quase todos os estados do país, porém alguns estão inativos. Podem ser de nível municipal, estadual ou regional, quando há o agrupamento de diversos municípios. São organizações de natureza interinstitucional, multiprofissional e confidencial, prevendo a participação da sociedade civil organizada, que também discute óbitos infantis e fetais. Em Santa Catarina, o comitê estadual e o da Capital estão em funcionamento, segundo informações da Secretaria de Estado da Saúde.

Para Faria, há um corporativismo médico que dá a sensação de que não se pode falar sobre as mortes maternas. “Não se trata de perseguir profissionais, essa é uma fatalidade que marca de uma forma muito dolorosa a vida de um profissional, mas não é sobre isso. É sobre romper com o pacto de silêncio que continua afetando a vida das mulheres”, afirma. A médica também critica as taxas de cesarianas elevadas em Florianópolis. Segundo informações do Datasus, 46,37% dos partos de nascidos vivos foram realizados por cesariana no município em 2021. Enquanto a OMS considera a taxa ideal entre 10% e 15%.

DPCAMI da Capital investiga a morte de Iclairi. | Imagem: Reprodução.

Inquérito sobre morte de Iclairi é encaminhado ao MPSC 

Em busca de algumas respostas, Icleusa registrou um Boletim de Ocorrência na Polícia Civil de Santa Catarina (PC/SC) quatro meses após a morte da filha. “O médico fez o que podia, mas faltou um pouco de capacidade técnica para ele, pelo que percebemos na análise pericial da Polícia Civil. Mas, se tivesse uma estrutura, uma UTI, ele teria como reverter o quadro dela. Essa questão e o fato de não ter sangue disponível, uma ou outra teria salvado a vida dela. Nesse aspecto, é importante responsabilizar a maternidade para que a sua estrutura sofra alterações e, de alguma forma, a justiça seja feita nesse sentido”, afirma Icleusa.  

Ela relembra do histórico da filha com a Ilha Hospital e Maternidade. Em setembro de 2019, no parto do seu primeiro filho, Nathan, Iclairi também teve uma cesariana de urgência. Após apresentar um estado febril, ela buscou atendimento na mesma maternidade, que afirma priorizar o parto humanizado no seu site. A equipe plantonista identificou uma taquicardia fetal, ou seja, a aceleração dos batimentos do feto, que indicavam a necessidade de uma intervenção cirúrgica. 

“Foi um parto muito forçado, quebraram um fio de costela dela para tirar o bebê. Ele nasceu com febre e foi direto para UTI, foi um desespero. Foi o primeiro parto dela e foi um trauma”, conta a avó materna de Noah e Nathan, agora o irmão mais velho tem três anos e oito meses. 

Após o parto, Iclairi tinha que ir caminhando para amamentar na UTI. “Ela andava arcada e dizia ‘mãe, eu não aguento de dor, não dá para andar’. Ela pediu muitas vezes para eles [equipe médica] vissem o que era, e eles falavam que era normal. Ela ficou internada alguns dias e não fizeram o raio X. Depois que saiu, ela fez e constatou a fratura, foi medicada e aliviou a dor”, relata Icleusa. Mesmo com essa experiência traumática, Iclairi escolheu a mesma instituição sob orientação do seu médico e pela logística, o local ficava mais perto de casa.

No primeiro parto de Iclairi não houve nenhuma consequência para a equipe médica ou para a maternidade. Mas desta vez, foi aberto um inquérito na Delegacia de Proteção à Criança, ao Adolescente, à Mulher e ao Idoso. A investigação foi finalizada e remetida ao Poder Judiciário em 25 de abril de 2023. Em nota, a Polícia Civil informou ao Catarinas que o documento estava sob análise do MPSC e que, considerando ainda não existir decisão judicial, o caso encontra-se sob sigilo. A autoridade orienta que, caso exista suspeita de ilícito penal em casos de morte materna ou infantil em maternidades e hospitais, o fato seja registrado por qualquer dos meios disponibilizados pela PC/SC. 

O Ministério Público, por sua vez, afirmou à reportagem ter recebido os autos na data indicada, mas dois dias depois solicitou “diligências à autoridade policial para complementação das investigações”. O médico responsável pelo caso, que teve a identidade preservada ao longo da reportagem, disse não ter interesse em conversar com o Catarinas. Fizemos contato com o Ilha Hospital e Maternidade por e-mail e por telefone, porém a instituição não respondeu às nossas perguntas até a publicação da reportagem.

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  • Fernanda Pessoa

    Jornalista com experiência em coberturas multimídias de temas vinculados a direitos humanos e movimentos sociais, especi...

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