Por Camila Rufato Duarte.

Na última semana, escrevi no perfil do Instagram, no qual me dedico a falar sobre Direitos das Mulheres e empoderamento feminino, um post com o mesmo título deste artigo, baseado no pensamento da filósofa e pesquisadora estadunidense Marilyn Frye, sobre o fato de a cultura heterossexual masculina ser homoafetiva.

No perfil direito.dela buscamos trazer temas complexos da forma mais acessível possível e, sem dúvidas, usar o BBB de exemplo é uma maneira eficaz para análises tanto jurídicas quanto de empoderamento feminino, na medida em que se trata de um programa de muita visibilidade e que, por ser um experimento social, traz questões extremamente relevantes para o debate.

E foi assim que ao ver a relação Projota x Arthur x Carla percebemos que se tratava de um perfeito exemplo dos pensamentos de Marilyn, uma vez que a relação de amizade de Arthur Picolli com Projota era baseada em admiração, respeito e afeto – algo realmente bonito de se ver -, ao passo que o mesmo Arthur tinha posturas completamente diferentes com Carla Diaz, com quem estava se relacionando. Ambos chegaram a protagonizar muitos beijos e cenas quentes embaixo do edredom. Mas era só. Fora isso, não havia conversa, carinho, afeto e pouquíssimo respeito por parte dele, mesmo com a dedicação e as cobranças dela.

A situação acima é precisamente a análise que Marilyn, estudiosa no âmbito do sexismo, fez em seu livro “Políticas da Realidade: Ensaios sobre Teoria Feminista” quando concluiu que os homens héteros devotam o amor a outros homens e que o olhar para a mulher é apenas sexual.

Nas Palavras de Marylin:

“Dizer que um homem é heterossexual implica somente no fato de que ele mantém relações sexuais exclusivamente com o sexo oposto, ou seja, mulheres. Tudo ou quase tudo que diz respeito ao amor, a maioria dos homens heterossexuais reservam exclusivamente para outros homens. As pessoas que eles admiram, respeitam, adoram, reverenciam, a quem honram, imitam, idolatram e formam profundos vínculos, a quem estão dispostos a ensinar e com quem estão dispostos a aprender, e cujo respeito, admiração, reconhecimento, honra, reverência e amor eles desejam, essas são, esmagadoramente, outros homens. Nas suas relações com as mulheres, o que passa por respeito é bondade, generosidade ou paternalismo, o que passa por honra é a remoção do pedestal. Das mulheres querem devoção, serviço e sexo.’’

Além do ‘’caso do BBB’’ podemos ver as conclusões de Frye em várias situações com as quais temos contato diariamente. Sabe a ‘’friendzone’’? Para mim é um dos maiores exemplos da visão masculina de que a mulher deve estar atrelada ao seu prazer sexual. Para homens, mulheres não servem para ser amigas. Muitos se casam e, mesmo tendo escolhido dividir a vida com aquela mulher, nem de perto a considera uma amiga. Quantos amigos homens cis e héteros você tem ou já teve? Desses, quantos te admiraram sem te desejar sexualmente? A “zona do amigo’’ nunca é suficiente com uma mulher, se ele está sendo legal com você, você ‘’deve’’ a ele um envolvimento sexual. A amizade com uma mulher, muitas vezes, faz parte do ‘’jogo’’ da conquista, não é algo genuíno, pois das mulheres eles esperam servitude e sexo.

Quando estão com os amigos os homens se sentem livres, falam sobre tudo, riem alto; O exato oposto de quando estão com suas namoradas e esposas quando parecem se preocupar mais com o celular ou se afundam no mais absoluto silêncio em frente à TV. Homens viram a noite com amigos sem ver a hora passar e quando estão com suas parceiras querem logo voltar para casa porque ‘’estou cansado’’, ‘’está chato’’, ‘’amanhã tenho compromisso’’. Homens riem de mulheres no trânsito e endeusam os amigos imprudentes que andam acima da velocidade. Homens crucificam mulheres por uma traição e acolhem outros homens na mesma situação. Homens tratam mulheres como sua propriedade e querem controlar o cabelo, a roupa, as palavras, o jeito, as amizades, a vida.

A história não deixa dúvidas que os homens nos limitaram às suas propriedades enquanto foi possível. Nos impediram de votar e de sermos votadas, de estudar, de praticar determinados esportes, de trabalhar, de ter um salário decente, de dirigir e até hoje tentam nos impedir de ter autonomia sobre nossos corpos.

Uma mulher andando sozinha ouve todo tipo de absurdo, se for à noite corre um imenso risco (e ser assaltada é o menor deles). Já se estiver acompanhada de um homem esse risco diminui consideravelmente. Isso porque homens não respeitam mulheres, homens só respeitam outros homens. Que mulher, em uma festa, disse ‘não’ para um homem e teve que justificar, e a única justificativa plausível é ter alguém (e que seja outro homem, porque se for outra mulher é fetiche pra ele); E se esse companheiro chega perto, a desculpa pelo incômodo não se direciona à mulher, mais ao homem: ‘’seu dono’’.

E antes que venha a enxurrada de críticas doídas: NÃO estou sendo generalista, estou somente apontando pontos de convergência que enquanto mulher, percebi em vários homens ao redor. Não odeio homens, inclusive sou casada com um porque sim, há exceções que se propõem a desconstrução! E andam aumentando consideravelmente, homens que buscam se despir dessa masculinidade tóxica que nos mata (Brasil é o 5º país que mais mata mulheres no mundo), mas que também traz muitos malefícios para os próprios homens que são privados de escolhas básicas e de seus sentimentos para performar a masculinidade que não deixa dúvidas sobre a sua sexualidade.

Porque SIM, questionar a sexualidade de um homem cis e hétero costuma ser mais grave do que questionar seu caráter.

Você já deve imaginar no que deu quando postei sobre isso tudo aí em cima no Instagram, né? HATE, HATE, HATE! Muita concordância por parte da maioria das mulheres e muito ódio e ameaças, por parte da maioria dos homens que, com seu corporativismo típico, se uniram para denunciá-lo. O Instagram derrubou. Sentença: Discurso de ódio.

Repostamos – não vão nos calar: O segundo post foi viral, chegou a quase meio milhão de pessoas, mais de 150 mil likes. Essas mulheres histéricas chegaram longe demais. Novamente o Instagram derrubou, dessa vez sem nem explicar o motivo.

No final das contas, até o presente momento, o Instagram retirou do ar nossa postagem três vezes, diminuiu nosso alcance e está impedindo o compartilhamento dos nossos posts por alguns seguidores.

Fiquemos atentas, mulheres! As formas de nos silenciar estão cada vez mais refinadas, nossa voz ressoando e questionando é uma afronta ao patriarcado!  E com isso, deixo o lembrete de que nossa luta é diária, por mais direitos e, não se enganem, para a manutenção dos que já temos, pois como precisamente disse Simone de Beauvoir: ‘’Basta uma crise política, econômica e religiosa para que os direitos das mulheres sejam questionados.’’ #naovaonoscalar.

Referências:
Livro ”The Politics of reality: Essays in feminist Theory” de Marilyn Frye; Artigo ”Homens não gostam de mulheres” de Paula Garruth.

*Camila Rufato Duarte é advogada e cofundadora do IG @direito.dela.




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