Crônicas da incontingência da clausura – cotidianos da pandemia será lançado em transmissão online no próximo domingo (4).
O cotidiano na quarentena narrado pela historiadora Marlene de Fáveri aos domingos no Portal Catarinas virou livro. Crônicas da incontingência da clausura – cotidianos da pandemia é uma obra que reúne 25 crônicas publicadas entre março e agosto de 2020, “quando a pandemia fez o tempo de nos amotinar em claustros que, embora sem muros, cerceou os ir e vir e os abraços num lastro de medo”, como contextualiza a autora. O lançamento ocorre em formato online, em 4 de abril, às 18h, com participação da autora e das/os convidadas/os, a escritora Urda Alice Klueger, o diretor da Editora Letras Contemporâneas, Fábio Brüggemann, e a diretora executiva do Portal Catarinas, Paula Guimarães, na página do Catarinas no Facebook e no canal no Youtube.
Historiadora de profissão e professora da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), Marlene de Fáveri publicou várias obras historiográficas, inclusive premiada em 2005 com o livro Memórias de uma (outra) guerra: cotidiano de medo durante a Segunda Guerra Mundial em Santa Catarina pelo Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina.
“Tão cientista da História por toda uma vida, Marlene se apoiou naquela ciência para derramar no papel (pois ela escreve a mão, num caderno) sua alma de poeta, rasgando as vísceras do que era estar presa pela Covid, irremediavelmente prisioneira por um vírus invisível, mais prisioneira, como também estou, dentro de uma casa do que se ela possuísse muros inescaláveis”, pontuou a escritora Urda Alice Klueger na apresentação que abre o livro de Marlene.
São crônicas que versam sobre o cotidiano de uma mulher já na idade madura que, de susto, se viu confinada no interior, na casa de sua mãe em Turvo (SC) por força de decretos de isolamento social, e ali “calçou as botas”, como disse. Nestas narrativas a autora vai amiúde desde as vísceras do cotidiano ordinário de uma casa camponesa e rural, em Turvo (SC), e o espaço urbano, Florianópolis, onde mora, captando sentidos desses entrelugares na experiência de viver uma pandemia.
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Nada se passa que não tenha o olhar atento da historiadora que é também poeta: trata dos medos, das incertezas, dos aprendizados e memórias na convivência com sua mãe octogenária, da sexualidade, dos silêncios, das perdas, dos reencontros, das solidariedades, das solidões e angústias, das amizades, das lides na terra, plantas e animais domésticos, dos preconceitos, dos protocolos e cuidados para evitar o contágio, do negacionismo e tantos outros sentidos. “Entremeadas ao cotidiano na pandemia, estão as iras com o que se passa na política e as insanidades no trato com a moléstia medonha, bem como denúncias ao desmonte das políticas sociais, ambientais, educacionais, de saúde com críticas severas ao ferrabrás das cavernas que governa este país”, revela.
Em todas as crônicas, há um manifesto contra violências históricas contra as mulheres. São narrativas engajadas que mostram a feminista que a autora é, e no que acredita.
“As violências estruturais reverberam com ainda mais força em tempos de exceção, de crise econômica e sanitária como estes que estamos vivendo. É preciso identificá-las e denunciá-las”, enfatiza Marlene.
“Crônicas da Incontingência da Clausura” é sobre o feminismo nosso de cada dia, por isso uma contribuição às lutas das mulheres e feministas do país, como analisa a jornalista Paula Guimarães, responsável pela edição de parte dos textos no Portal. “A violência sexual contra meninas e mulheres, tão frequente e silenciada pelas famílias, a criminalização do direito ao aborto, a interdição do exercício da sexualidade das mulheres, a perpetuação dos papéis sociais forjados para subjugar e explorar, a violência doméstica como castigo para aquelas que se rebelam, o racismo que adoece e mata; são temas costurados nos retalhos das suas escritas”, relata a jornalista na apresentação do livro.
O furor da escrita a faz cotejar verbos e misturar poemas que mostram uma escritora dedicada às artes de juntar palavras e construir textos que até sangram, mas sem perder a ternura. Nas palavras do cronista, escritor e poeta Viegas Fernandes da Costa, seus textos são “crônicas de fôlego que retratam nossas experiências, medos, frustrações, revoltas e solidariedade ao longo dos primeiros meses da pandemia no Brasil. Um documento valioso, necessário e riquíssimo”, de “uma poeta que dedica sua vida à historiografia, à educação e à luta por uma sociedade igualitária.” Como lemos da própria autora: “Escrever é o meu vício: alimento-o no exercício de catar palavras e desdobrar verbos.”
Originalmente publicados em sua coluna semanal no Catarinas, a obra tem o selo da editora Letras Contemporâneas, em 264 páginas, com projeto e diagramação de Angelita Maria Corrêa e o olhar atento de Rejane Wilke e Fábio Brüggemann. Está à venda pelo site da livraria Livros & Livros e na própria livraria, em Florianópolis (centro de Eventos da UFSC).
A autora continuou escrevendo tanto que, em breve, publicará o Volume 2, com as crônicas de número 26 até a de número 54, no mesmo estilo leve e com a mesma densidade das que estão neste volume 1, perfazendo um ano da pandemia de os decretos de isolamento social no Brasil, em meados de março.