Magna Kaimbé é Técnica em Enfermagem. Tem 40 anos e uma filha de 11. É indígena Kaimbé do estado da Bahia, aldeia Massacará com mais de 1.200 pessoas, atual território do município de Euclides da Cunha. Morou 20 anos em São Paulo e trabalhou na Casa de Saúde Indígena (CASAI). Retornou para a TI no ano de 2012 onde trabalha no posto de saúde dentro da comunidade. Não existem casos de coronavírus dentro de Massacará, mas há pessoas contaminadas no município a 30 km. As barreiras sanitárias foram feitas por meio de decretos com o fechamento de estradas junto com a FUNAI. A Secretaria de Saúde do Município de Euclides da Cunha têm colaborado com a questão indígena na doação de materiais de proteção individual como máscaras, álcool em gel e luva, mas não em quantidade adequada para os profissionais. Ela fala um pouco sobre o cotidiano da comunidade.
“No momento, como nós somos linha de frente à saúde, a equipe toda está trabalhando, mas a escola está suspensa até segunda ordem porque foi feito aquela paralisação, o governo do estado da Bahia paralisou as escolas, aqui a escola é estadual. Então a escola está paralisada até que se defina como vai ser o ano letivo. As crianças estão em casa e fazendo algumas atividades enviadas via online para os alunos. A gente fala online, mas nem todos os indígenas, nem todas as crianças dentro da comunidade têm acesso aos meios de internet, aí fica difícil para algumas crianças estarem fazendo ou visualizando essas atividades. Mas esse processo é feito da melhor forma possível. Os professores estão engajados nisso porque também os professores, como sabemos, não têm nenhuma especialização com trabalho online, então todos estamos procurando as melhores opções para estar fazendo esse trabalho”, conta Magna Kaimbé.
A equipe de Saúde Indígena vem trabalhando de diversas maneiras na prevenção da pandemia, pois há diferentes profissionais indígenas capacitados atuando na área. A Terra Indígena está isolada com barreiras sanitárias, semanalmente dentro da TI fazem atividades educativas com vídeos, carro de som e folhetos explicativos, reuniões para o esclarecimento de notas técnicas em boletins informativos do Ministério da Saúde. As informações são repassadas para as lideranças, para os conselheiros em reuniões convocadas pela equipe multidisciplinar de saúde indígena e aos agente de saúde para orientar a população da importância de permanecer em casa. Todas as lideranças precisam autorizar a entrada ou saída de um morador caso seja necessário, ou algum prestador de serviço, como é o caso de serviços de entrega de alimentos que abastecem os mercadinhos dentro da comunidade.
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“A aldeia ainda continua fechada com isolamento para aqueles que chegam de outros estados, principalmente de São Paulo, que nós temos muitos indígenas daqui que moram em São Paulo. Então, os que estão passando por dificuldades em São Paulo, não tem como se manter por conta do emprego ou está afastado do trabalho, retorna para a aldeia. Nesse retornar ele chega na aldeia e o agente de saúde procura ele, entrega um questionário, ele assina um termo para ficar em isolamento domiciliar por 14 dias. Só a partir daí que essa pessoa tem acesso livre às outras dependências da comunidade. É difícil fazer essa orientação. Muitos não querem porque se sentem em casa. A gente tem esse trabalho também, mas com muita orientação e com muito esforço da equipe de saúde a gente consegue resolver algumas situações juntamente com as lideranças que são os caciques, que nós temos três, e são as lideranças mesmo, os conselheiros, que ajudam a equipe de saúde nesse combate, nessa orientação”, relata.
De acordo com boletim divulgado (08/07) pela Plataforma de monitoramento da situação indígena na pandemia do novo coronavírus no Brasil, no DSEI de Alagoas e Sergipe já foram 87 indígenas infectados com 2 óbitos, no do Ceará 336 infectados com 4 mortes, no do Maranhão 868 com 14 mortes, no de Pernambuco foram 113 infectados com 7 mortes, na Bahia são 58 casos confirmados com 1 óbito.
No semiárido baiano, o Território Kaimbé é marcado por um processo histórico intenso de colonização e ocupação. É um grupo que reivindicou a demarcação do território pela autodenominação como indígena. A partir do século XVII os Kaimbé foram perseguidos pelos jesuítas para a expansão territorial da Colônia e a formação da Missão Jesuítica do Massacará. A retomada da terra se iniciou na década de 1980, quando as lideranças indígenas Kaimbé e Kiriri reivindicaram que uma área pertencente a fazenda Mirandela fosse demarcada como indígena. Apesar do conflito instalado o Governo Federal regularizou a situação fundiária a partir da organização coletiva dos grupos indígenas.
Segundo dados da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) os povos indígenas estão presentes tanto na área rural quanto na área urbana. Sendo que, cerca de 61% dos indígenas estão concentrados na área rural. A região que concentra a maior população em números absolutos é a região nordeste com 106.150 mil indígenas. Estima-se que atualmente no território brasileiro estão presentes 305 etnias, falantes de mais de 274 línguas diferentes. O Censo IBGE 2010 demonstrou que cerca de 17,5% da população indígena não fala a língua portuguesa num total de 817.963 pessoas. Destes, 315.180 vivem em áreas urbanas e 502.783 em áreas rurais. Segundo a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), na América Latina vivem cerca de 45 milhões de indígenas em 826 povos que representam 8,3% da população.
*A série do Portal Catarinas Filhas da Terra: Mulheres indígenas em luta contra a pandemia Covid-19 irá publicar textos que irão abordar o contexto de como as mulheres indígenas estão vivendo na atualidade e de que forma a pandemia de coronavírus vem afetando o cotidiano dos povos indígenas. Acompanhe nossas postagens quinzenais e conheça o que as mulheres indígenas têm a dizer.
Equipe: Vandreza Amante (jornalista), Inara Fonseca (jornalista), Paula Guimarães (jornalista), Pietra Dolamita Kuawa Apurinã (conselho editorial) e Bruna Mairatã (ilustradora).