Ontem foi divulgada a grave notícia de que a jornalista feminista Schirlei Alves, de Santa Catarina, foi condenada de maneira covarde a pagar R$ 400 mil em indenizações e cumprir um ano de prisão em regime aberto pela justiça catarinense. 

Em sua decisão, a juíza Andrea Cristina Rodrigues Studer, da 5ª Vara Criminal da Comarca de Florianópolis, considerou que a jornalista cometeu o crime de difamação contra funcionário público, previsto no Código Penal, por ter publicado no The Intercept Brasil, em 2020, a reportagem que denunciava a atuação do promotor Thiago Carriço e do juiz Rudson Marcos no julgamento de André Camargo Aranha

Aranha era acusado de estuprar a jovem promoter catarinense Mariana Ferrer no Café de la Musique, durante uma festa em 2018. Ele foi inocentado no julgamento. Ferrer não teve a mesma sorte: foi duramente revitimizada, tendo suas fotos em redes sociais escrutinhadas e usadas contra sua honra pelo advogado de defesa, sem que juiz e promotor agissem para cessar aquele espetáculo de misoginia.

Em decorrência da reportagem corajosa de Schirlei Alves, foi sancionada a Lei Mariana Ferrer, que hoje protege vítimas de crimes sexuais em julgamentos. 

Na última terça (14), o Conselho Nacional de Justiça aplicou uma pena de advertência por escrito ao juiz Rudson Marcos pelo caso Mariana Ferrer. A sanção escolhida foi a mais leve prevista na Lei Orgânica da Magistratura Nacional.

Enquanto isso, em Santa Catarina, de maneira totalmente desproporcional, Schirlei foi punida com a pena máxima prevista no Código Penal, tendo seu direito fundamental de ir e vir cerceado. O episódio também fere a liberdade de imprensa. 

Este é o retrato da misoginia, ou seja, do ódio por meninas e mulheres perpetrado pelo Estado. Quanto vale a vida de duas mulheres vítimas de violência patriarcal quando o judiciário prioriza a honra dos homens que cruelmente agiram contra elas?

O Catarinas se solidariza com Schirlei Alves, jornalista cujo trabalho nos emociona e inspira. 

Perseguição a jornalistas

De acordo com o Repórteres sem Fronteiras (RSF), o Brasil está na “zona vermelha” do Ranking Mundial de Liberdade de Imprensa, ocupando a 110ª posição entre 181 países. Este é o 2º país mais letal para jornalistas no continente, atrás apenas do México. Foram ao menos 30 assassinatos de profissionais na última década. 

É extremamente preocupante que tenhamos que trabalhar sob tamanha pressão, com medo de perder a liberdade, pagar multas incompatíveis com os nossos ganhos, receber xingamentos, agressões e até mesmo sofrer risco de vida.  

Em 2022, de acordo com dados da Federação Nacional dos Jornalistas, o Brasil registrou, em média, uma agressão a jornalistas por dia, entre ataques físicos, ameaças e intimidações, além do assassinato brutal do jornalista Dom Phillips.

Quem nos protege quando a violência é perpetrada pelo próprio Estado, por meio de seus três poderes? Diante desse cenário, ainda podemos falar em democracia? 

Nos últimos anos, falamos diversas vezes sobre as tentativas de criminalizar o nosso trabalho – inclusive para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

Após publicarmos, em parceria com o Intercept, a reportagem sobre a menina de 11 anos que teve o seu direito de abortar violado pela justiça catarinense, nas figuras da juíza Joana Zimmer e da promotora Mirela Dutra Alberton, a Assembleia Legislativa de Santa Catarina chegou a instalar uma CPI do Aborto para investigar os veículos que divulgaram informações sobre o caso que tramita em segredo de justiça.

A Organização das Nações Unidas pediu que o Estado brasileiro tome providências contra a intimidação das jornalistas que cobriram o caso, porém, esgotado o prazo, o governo não se manifestou. 

Estamos rompendo a tradição do silêncio, mas o sistema nos quer quietas. Esta sentença contra Schirlei é uma tentativa de vencer jornalistas feministas pelo medo, mostrando que as penalidades às desobedientes serão duras e desproporcionais.

Por aqui, mesmo sob intimidação, seguiremos com a nossa missão cidadã de informar. Schirlei também terá uma longa jornada pela frente, recorrendo dessa injustiça. Estaremos ao seu lado lutando para que sua voz não seja calada.

O jornalismo independente e de causa precisa do seu apoio!


Fazer uma matéria como essa exige muito tempo e dinheiro, por isso precisamos da sua contribuição para continuar oferecendo serviço de informação de acesso aberto e gratuito. Apoie o Catarinas hoje a realizar o que fazemos todos os dias!

Contribua com qualquer valor no pix [email protected]

ou

FAÇA UMA CONTRIBUIÇÃO MENSAL!

Últimas