Uma nova lei sancionada em 31 de outubro pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) impede a guarda compartilhada de crianças e adolescentes em casos de violência doméstica. De autoria do senador Rodrigo Cunha (Podemos/AL), a Lei 14.713/23 modifica o Código Civil e o Código de Processo Civil e passa a prever que, durante a audiência de guarda, o juiz deverá perguntar às pessoas envolvidas e ao Ministério Público se há risco de violência doméstica, conforme o histórico.

“Apesar de entender que a regra da guarda compartilhada foi um avanço em nosso país, visto que a responsabilidade das crianças sempre fica a cargo das mães, entendo que ela não serve para situações onde existe violência”, avalia Damaris Drulla, advogada de família.

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Damaris Drulla | Crédito: arquivo pessoal.

Drulla é especializada na defesa de mulheres e atua em casos de pedido de guarda por vítimas de violência doméstica. “Muitas vezes, mesmo que o pedido inicial seja para a fixação da guarda unilateral, tendo em vista alguns indícios de violência, é comum que seja fixada a guarda compartilhada, por ser regra”, relata.

A advogada lembra que, apesar da nova legislação não especificar um gênero, as mulheres são as vítimas majoritárias em casos de violência doméstica. Somente em 2022, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, a cada dia, 673 mulheres se deslocaram até uma delegacia de polícia para denunciar um episódio de violência doméstica, totalizando mais de 245 mil casos.

Filhos são usados para intimidar

“Acredito que a nova lei vai reduzir o contato direto entre agressor e agredida, e facilitará o fim da perpetuação de um ciclo violento que se repete, principalmente porque, muitas vezes, os próprios filhos são utilizados como instrumentos de vingança”, diz a advogada.

Segundo a especialista, muitas mulheres não denunciam violência doméstica ou saem do convívio com o agressor por receio de perder a guarda dos filhos.

“Muitas vezes, ele é o detentor do dinheiro naquela relação e ameaça que vai ‘tirar’ a criança da mãe, o que, muitas vezes, faz com que ela volte para casa e o ciclo da violência continue”, destaca Drulla.

Atualmente, a advogada atua em um caso em que um agressor e vítima ainda residem no mesmo local, porque a mulher agredida é dependente financeiramente e tem medo de perder a guarda do filho.

“Eles não se falam e já tentamos diversos acordos para resolver a situação. Há alguns dias, ele deixou uma minuta de acordo em cima da mesa, com a determinação de que a guarda e a residência fixa do filho de quatro anos seriam dele, e ela ficou desesperada. Essa não é a primeira, nem a última mulher a passar por algo assim”, conta.

Como irá funcionar?

A lei prevê que a guarda compartilhada não poderá ocorrer “quando houver elementos que evidenciem a probabilidade de risco de violência doméstica ou familiar”. Drulla explica que, como a legislação é nova, ainda não se sabe exatamente quais serão os elementos exigidos, mas cita possibilidades.

“Acredito que esses elementos deverão ser baseados, em um primeiro momento, em mensagens, fotos, declarações de testemunhas e na palavra da própria vítima, que tem muito peso. O índice de mulheres que mentem sobre situações de violência é baixíssimo, por esse motivo, acredito que em um pedido liminar, isso deva ser considerado”, fala.

“Em um segundo momento, acho importante que esses elementos sejam devidamente confirmados em prova pericial com psicólogas e assistentes sociais, visto que é uma das provas mais robustas dentro das ações de família”, complementa.

Guarda compartilhada

A Lei 11.698, que regulamenta a guarda compartilhada no Brasil, foi sancionada em 2008. Ela prevê que, em caso de separação judicial ou divórcio, a responsabilização e exercício de direitos e deveres devem ser cumpridos em conjunto entre pais e mães. Na guarda unilateral, a tutela é atribuída a somente um dos genitores ou pessoa responsável, como avó ou tia, por exemplo.

A guarda unilateral ou compartilhada pode ser requerida por consenso pelo pai e pela mãe, e também ser decretada pelo juiz, em atenção às necessidades específicas da criança ou adolescente.

“Diferente do que muitos pensam, na guarda compartilhada não existe a divisão da criança em dias iguais, ou seja, a criança não fica 15 dias com a mãe e 15 dias com o pai, alternando sua residência. A guarda compartilhada só divide as responsabilidades e decisões conjuntas, sendo que a pensão e a convivência são igualmente determinadas, e a criança possui uma residência fixa”, finaliza a advogada.

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  • Daniela Valenga

    Jornalista dedicada à promoção da igualdade de gênero para meninas e mulheres. Atuou como Visitante Voluntária no Instit...

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