Três juristas são indicadas na campanha Ministra Negra Já!, lançada pelo movimento Mulheres Negras Decidem (MND). A campanha quer sensibilizar a sociedade civil e a comunidade jurídica sobre a importância de haver mulheres negras ocupando cadeiras no Superior Tribunal Federal (STF). A juíza carioca Adriana Cruz, a promotora baiana Lívia Sant’Anna Vaz e a advogada gaúcha Soraia Mendes são os nomes defendidos pelo movimento para assumir uma cadeira na alta cúpula do Poder Judiciário, com a saída da então Ministra Rosa Weber em outubro.
Se uma das juristas assumir o cargo, será a primeira vez que o Brasil terá uma mulher negra como Ministra do STF, em 132 anos de atuação do órgão. “Não se trata de representação, apenas. Nosso maior objetivo com a campanha é chamar atenção para um assunto que define a vida cotidiana da população brasileira”, afirma Tainah Pereira, Coordenadora de Política do MND.
Dados reunidos pela Gênero e Número mostram que dos 170 ministros que já atuaram no órgão somente três eram negros. Além disso, revelam que desde sua criação, o STF teve suas cadeiras ocupadas 95% do tempo por homens brancos, 2,4% por mulheres brancas e 2,7% por homens negros.
“Enquanto o Poder Judiciário for formado majoritariamente por pessoas brancas, a aplicabilidade das leis será baseada no falso argumento de que ‘não existe racismo no Brasil’, e isso mantém pessoas negras em lugar de vulnerabilidade em todos os setores da sua vida social”, destaca Pereira.
Adriana Cruz é doutora em Direito Penal pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, mestra em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e especialista em Direito Processual Civil pelo Instituto Brasileiro de Direito Processual. Pesquisa os impactos dos processos de criminalização na democracia, além de relações raciais e de gênero nas instituições do sistema de justiça. É Juíza Instrutora no Supremo Tribunal Federal desde 2015.
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Lívia Sant’Anna Vaz é doutora em Ciências Jurídico-Políticas pela Universidade de Lisboa, mestra em Direito Público pela Universidade Federal da Bahia e especialista em Estudos Afro-latino-americanos e Caribenhos pelo Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales. É promotora de justiça do Ministério Público do Estado da Bahia desde 2004 e atua na Promotoria de Justiça de Combate ao Racismo e à Intolerância Religiosa desde 2015.
Soraia Mendes é pós-doutora em Teorias Jurídicas Contemporâneas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, doutora em Direito, Estado e Constituição pela Universidade de Brasília e mestra em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Tem mais de vinte anos de docência e diversos livros publicados, especialmente na área de Direito Criminal e Gênero, citados tanto no STF quanto na Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Movimentações
Em março, um documento intitulado “Manifesto por juristas negras no Supremo Tribunal Federal”, assinado por mais de 80 entidades da sociedade civil, incluindo o MND, foi entregue à presidência sob o argumento de que a indicação de uma mulher negra seria a oportunidade de suprimir uma lacuna na democracia brasileira, como mostramos em uma reportagem sobre a importância de uma jurista negra no STF.
“Evidentemente, há muitas mulheres negras com notório saber jurídico e reputação ilibada, que assim preenchem os requisitos constitucionais para serem Ministras do STF. Ademais, muitas são também comprometidas com o espírito emancipatório e progressista inerente à nossa Constituição Federal e os direitos de trabalhadoras e trabalhadores em geral, foco desse Governo de Reconstrução”, destaca o manifesto.
O MND é uma organização da sociedade civil que qualifica e promove a agenda liderada por mulheres negras na política institucional, através da elaboração de pesquisas, dados e publicações. Ao longo dos meses agosto e outubro, uma série de ações serão realizadas pela organização em todo o país. Entre elas, o lançamento do estudo “Por que uma jurista negra?”.
Para a Coordenadora de Dados e Cuidados Coletivos do MND, Beatriz Amparo, o estudo vai fomentar o campo de discussão sobre a participação de mulheres negras em espaços de decisão na política institucional e servir de insumo para pensar políticas públicas. “É um material que vai nos permitir entender que é urgente ter representantes orientados em análises profundas sobre a realidade da população brasileira, respaldadas em fatos históricos, dados, autocrítica, interesse no indivíduo, na confluência comunitária e emancipatória para todas as pessoas. E reparação”, ressalta Amparo.