Assistente social, DJ e ativista dos direitos da população LGBTQIA+, Lirous K’yo Fonseca Ávila, 40 anos, é candidata a deputada federal de Santa Catarina nas eleições 2022 pelo Partido dos Trabalhadores (PT) na coligação Federação Brasil da Esperança – PT/PCdoB/PV. 

Mulher trans, preta e bissexual, foi presidenta da Associação em Defesa dos Direitos Humanos com Enfoque na Sexualidade (Adeh), entidade que atua há mais de 20 anos em defesa dos direitos das pessoas trans e travestis.

A candidata é a segunda a responder ao questionário proposto pelo Catarinas para divulgar as candidaturas de mulheres comprometidas com a agenda política feminista, antirracista e LGBTinclusiva no estado. 

As entrevistas serão publicadas diariamente por ordem de chegada. Se você é uma candidata comprometida com a agenda de direitos mencionada acima, ou conhece uma candidatura com esse perfil, responda o formulário

Acompanhe a entrevista de Lirous K’yo Fonseca Ávila.

Conte sobre sua trajetória de vida/militância e quais motivações a levaram a disputar essas eleições.

Foram 20 anos de ativismo focado nos enfrentamentos às violências e no acolhimento às vítimas de violências que fizeram com que eu repensasse esse lugar. É impossível ficar somente na base amparando sem termos de fato leis que possam auxiliar nesse combate. O trabalho de base é essencial e poucos são aqueles que fazem, inclusive os que hoje se colocam como candidatos. Isso faz com que se desconheça a real necessidade das emergências que a nossa classe precisa. No final, a impressão é que as políticas públicas ficam somente com as pessoas com mais condições financeiras, de outras classes sociais com diversos privilégios, enquanto há um esquecimento de quem se encontra em situação de vulnerabilidade social. 

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Imagem: reprodução.

Você tem conseguido verba para a campanha? Como são divididos os fundos eleitoral e partidário entre as candidaturas? Você recebeu apoio e recursos do seu partido?

Olha, essa questão é bem delicada, porque ao mesmo tempo que temos apoio, percebemos que ele faz um recorte bastante equivocado. A linha de largada para os candidatos não é a mesma, tem uma diferença muito grande das pessoas que já foram eleitas e tem dinheiro, para os demais candidatos. Minha campanha por falta de financiamento iniciou depois dos demais que já haviam contratado suas equipes. O início deveria ser justo, com as pessoas todas com os seus respectivos valores na conta no mesmo dia, independentemente da diferença de valores. É injusto ver no primeiro dia de campanha, pessoas na Beira-Mar Norte cheias de material e bandeiras nas sinaleiras. 

Quais as principais questões a superar hoje em relação à desigualdade de gênero? E quais suas propostas para resolver essa questão no cargo que você quer ocupar?

Antes de discutir sobre a desigualdade de gênero, vamos ter que voltar muitas casas. Temos aí uma preocupação que parte do básico: a falta de alimentação, de educação, saúde, assistência, segurança e trabalho. É impossível não pensar que, neste momento, há famílias chefiadas por mulheres que não têm o que comer, nem o que colocar na mesa para os seus filhos.

Precisamos primeiro criar estratégias para nos mantermos vivas, com um olhar para o combate às violências. Esse trabalho deve ser efetivo na base, com as famílias em situações de vulnerabilidade. Trabalhar a segurança alimentar deveria ser a proposta de todas as candidaturas. 

Quais os principais temas a serem debatidos, hoje, em Santa Catarina e no Brasil? Quais propostas você apresenta para pautá-los?

Para além do que já é discutido, é necessário pensarmos em nos apropriarmos do que já temos de bom e ampliarmos aos demais espaços. Somos um polo tecnológico muito forte, podemos ampliar isso para que chegue a mais pessoas. Temos que pensar nas pessoas com deficiências, precisamos vê-las circulando os mesmos espaços que os demais, e com condições para que seja possível. É necessário termos mais de um professor em sala de aula para trabalhar as especificidades dos alunos, sem querer rotulá-los. Precisamos fortalecer a linguagem de sinais no Brasil para que as pessoas possam se comunicar e circular livremente pelos espaços. O feminicídio, o enfrentamento à exploração sexual e o tráfico de pessoas também são pautas fortes discutidas nas nossas propostas. 

Como você pretende atender as diferentes especificidades das mulheres, contemplando em seus projetos as mulheres negras, indígenas, lésbicas e mulheres trans?

Não há para fazer política para tamanha diversidade se não tivermos com elas nesses espaços.

Precisamos de um gabinete plural onde essas mulheres estejam trabalhando junto conosco. É necessário aprendermos que não existe equipe mais qualificada do que nós por nós mesmas.

É por isso que essa construção parte do princípio da pluralidade, da criação de espaços em que todas possam estar unidas, juntas nesses enfrentamentos.  

Na sua opinião, quais questões mais graves afetam as vidas da população LGBTQIA+. Quais suas propostas para enfrentá-las?

Ainda beiramos as discussões da década de 1970, tem pessoas que me acham até repetitiva quando proponho as mesmas pautas, mas não há como avançarmos em políticas públicas se não temos educação, trabalho, assistência e segurança.

A comunidade LGBT que mais se encontra em vulnerabilidade ainda corre risco de morte, dificilmente tem acesso à saúde, e sem educação de base não restam muitos trabalhos. É necessário criarmos estratégias de inclusão e permanência da comunidade LGBT nas escolas e universidades, precisamos pensar nas suas especificidades e trabalharmos com equidades.

A saúde deve ser desburocratizada, e precisamos que as pessoas sejam atendidas nos seus municípios. Existem diversos casos de pessoas da nossa comunidade que só conseguem atendimento na capital, e precisam fazer longas viagens para que isso aconteça. Isso tem que acabar!

E sobre as desigualdades raciais, quais suas propostas para superá-las?

É dever estarmos alinhadas com os discursos dos movimentos sociais, já há várias reivindicações feitas pelos nossos grupos e precisamos pôr em prática. Com a participação direta vinda dos movimentos organizados, é possível fazer diversas ações que promovam o combate às desigualdades.

É importante estarmos mais visíveis, tendo espaços de promoções e fortalecimentos da cultura negra. Ainda acredito que o principal é trabalharmos de dentro das comunidades para fora, com projetos e programas que visem a ampliação de novos horizontes.

Também é pensado que atividades contínuas de formação nos espaços públicos, devem ser feitas a todas as pessoas, para que também possamos combater isso dentro dos órgãos públicos.

Enquanto uma candidata feminista, como pretende atuar de forma a enfrentar os discursos reacionários que não admitem que as mulheres tenham autonomia plena sobre seus corpos, que acreditam na existência de uma “ideologia de gênero” e comprometem a implementação de políticas públicas, principalmente na área da educação, voltadas à equidade de gênero?

A primeira coisa a ser feita é ter um posicionamento firme, não em cima do muro, no que acredito. Vejo que muitas pessoas depois de eleitas acabam voltando para os seus armários de origem, temos exemplos aqui em Florianópolis, de candidatos LGBTs que no final, parece que a rede social se tornou mais do mesmo, o posicionamento e enfrentamento deve ser feito desde o início, as pessoas devem saber para que estamos chegando e que temos certezas do que queremos aqui, se a sua verdade for a da maioria, ela prevalecerá. O que vejo muito, são esses disfarces, medos de perderem votos e essa construção de que melhor chegar calado que na hora se faz, e no final sabemos que não. Precisamos de mais enfretamentos e posicionamentos, não acredito em uma política blasé. 

A sua plataforma política prevê o incentivo à participação da sociedade na discussão e elaboração de políticas públicas. De que forma?

Queremos não só termos uma linha de diálogo direta como também a proposta dos gabinetes abertos, para que a população tenha acesso de forma descomplicada. Muitas pessoas não têm acesso às redes sociais, e isso dificulta encontrar as demandas mais urgentes. Com isso temos como proposta também, de termos uma equipe de rua, que faça esse resgate da confiança da população com o candidato, só assim conseguiríamos trabalhar para além das políticas públicas, mas também a politização nas comunidades mais carentes. 

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