Em 16 anos a população prisional feminina atingiu a marca de 42.355 mulheres privadas de liberdade. Um aumento de 656% em relação ao registrado no início de 2000, quando havia 5.600 mulheres presas no país. No mesmo período, a população prisional masculina cresceu 293%.

A taxa de aprisionamento feminino, que é a proporção entre a população e a quantidade de presas, eleva o Brasil à posição de terceiro país que mais encarcera mulheres no mundo. São 40,6 presas para cada 100 mil mulheres no país. Nesse quesito, o Brasil perde apenas para Estados Unidos (65,7 para cada 100 mil) e Tailândia (60,7 para cada 100 mil). Cerca de 45% das mulheres encarceradas ainda aguardam julgamento pela justiça. Os estados com a maior proporção de presas provisórias são o Amazonas (81%), Sergipe (79%) e Bahia (71%). A menor proporção de presas sem condenação está no Paraná (27%), Rio Grande no Norte (28%) e Distrito Federal (30%).

Os dados com recorte de gênero foram publicados neste mês pelo Ministério da Justiça no Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias – Infopen Mulheres (colocar o link http://depen.gov.br/DEPEN/depen/sisdepen/infopen-mulheres/infopen-mulheres) e têm como base informações coletadas em junho de 2016, repassadas pelos órgãos de execução penal dos estados e Distrito Federal. Os números não alcançam as mulheres com monitoração eletrônica (tornozeleiras), cujos dados serão objeto de pesquisa específica que está sendo realizada pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen).

Quem são essas mulheres
As encarceradas no Brasil são na maioria das vezes jovens negras, solteiras, que não completaram nem mesmo o Ensino Fundamental. Metade das mulheres presas não chegou aos 30 anos. 27% delas têm até 24 anos; 23% têm de 25 a 29 anos; 18% de 30 a 34 anos; 21% de 35 a 45 anos; e 9% de 46 a 60 anos. Somente 1% está acima dos 60 anos. Nas informações sobre raça, o Infopen revela que 62% das encarceradas no Brasil são negras, 37% brancas e 1% amarelas. Quando analisada a escolaridade, vê-se que 82% delas não concluiu o Ensino Médio. São 2% de analfabetas; 3% alfabetizadas sem escolaridade; 45% com Ensino Fundamental incompleto; 15% com Fundamental completo; 17% com Ensino Médio incompleto; 15% com Ensino Médio completo; e apenas 1% com nível superior e 2% com pós-graduação. Quanto ao estado civil, 62% são solteiras; 23% têm união estável; 9% são casadas; 2% são separadas; 2% divorciadas; e 2% viúvas.

O que elas fizeram
A acusação de tráfico de drogas é o que pesa sobre 62% das mulheres presas no Brasil, seguida da de roubo (11%), furto (9%) e homicídio (6%). Esses números são indicadores de outro problema. A Lei de Drogas, de 2006, não estipula a quantidade mínima de substância ilícita para diferir o usuário do traficante. Cabe a cada juiz a decisão, o que faz com que a mesma quantidade de drogas que levou uma pessoa para a cadeia, não seja considerada como tráfico por outro magistrado. A discussão sobre a descriminalização da posse de drogas para consumo próprio está parada há dois anos no Supremo Tribunal Federal (STF). Ainda não há previsão de quando será retomado o julgamento, que começou em agosto de 2015 e analisa o caso de um detento flagrado em 2009 com 3 gramas de maconha na Grande São Paulo.

Onde estão presas
O Levantamento aponta que de 1.449 estabelecimentos penais no país, apenas 7% deles são femininos (107) e 17% são mistos, ou seja, para homens e mulher (244). O sistema prisional do país é quase todo pensado para homens. São 1.067 unidades masculinas (74%). Outras 31 unidades não têm identificação de gênero (2%). A taxa de ocupação das vagas destinadas a mulheres chega a 156% dotal das 27.029 vagas. Todas estão sob a custódia dos governos estaduais e Distrito Federal. As unidades penais federais não têm vagas para mulheres.

Direitos não são garantidos na maioria dos casos
Os números vão na contramão da separação dos estabelecimentos penais por gênero determinada pela Lei de Execução Penal (LEP) e incorporada pela Política Nacional de Atenção às Mulheres em Situação de Privação de Liberdade e Egressas do Sistema Prisional.

A falta de estrutura física das unidades penais prejudica diretamente a garantia de direitos às mulheres presas. Um dos mais graves é a falta de espaço adequado para abrigar gestantes. Somente 55 unidades do país declararam apresentar cela ou dormitório para grávidas. No Distrito Federal e no Amapá, todas as unidades possuem essa estrutura, enquanto no Tocantins e Piauí não há qualquer previsão de vaga para essas mulheres.

Outro dado alarmante é sobre a oferta de espaço adequado para que elas permaneçam em contato com seus filhos e possam oferecer cuidados ao longo da amamentação. Apenas 14% das unidades femininas ou mistas contam com berçário ou centro de referência materno infantil destinados a crianças com até 2 anos.

Para crianças acima de 2 anos, somente 3% das unidades femininas ou mistas possuem creches. Elas estão em apenas 4 estados, Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul e São Paulo. Nem mesmo a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), em fevereiro deste ano, de que mulheres grávidas e mães de crianças de até 12 anos que ainda não foram condenadas tenham o direito de ficar em prisão domiciliar até seu caso ser julgado, atenua a calamidade de haver tão poucos estabelecimentos penais no país com estrutura para grávidas, lactantes e mães.

As mulheres privadas de liberdade também têm restrição quanto ao direito à visita do (a) cônjuge, parentes e amigos, previsto no artigo 41 da LEP. Em metade das unidades onde estão mulheres (femininos e mistos) não existe estrutura para as visitas sociais. Quando analisada a estruturas para visita íntima (prevista na Resolução n° 1 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária), a precariedade é ainda mais latente. Apenas 41% dos estabelecimentos femininos e 34% dos mistos contam com esse espaço.

*Waleiska Fernandes é jornalista, militante feminista e atua na cobertura do sistema penitenciário.

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