Marielle Franco foi executada há quase um ano, mas a força política de suas pautas continua viva, ressoando nas vozes que denunciam as violências contra as mulheres, principalmente negras, comunidade LGBTI+ e populações periféricas, ribeirinhas, quilombolas e indígenas. A vereadora negra, lésbica e feminista, nascida e criada na Favela da Maré no Rio de Janeiro, será lembrada neste 14 de março, quinta-feira, quando completa onze meses do assassinato que a vitimou junto com o motorista Anderson Gomes. O ato no centro de Florianópolis, com início às 16h, é também uma das ações de mobilização para o Dia Internacional de Luta das Mulheres, em 8 de março, que nesta edição tem a ativista como símbolo.

Evento no último sábado mobilizou mulheres para se integrarem ao 8M/Foto: 8M SC

Santa Catarina adere à terceira Greve Internacional de Mulheres deste século trazendo o tema 8M Marielle: vivas, livres e resistentes. Entre as frentes que convocam a greve no mundo está o movimento NiUnaMenos da Argentina. Motivos não faltam para parar e ocupar às ruas, especialmente em tempos em que o Governo Federal de Jair Bolsonaro, atualmente um dos maiores expoentes do fascismo no mundo, representa a institucionalização dos discursos e práticas de violência contra as mulheres, que recaem com mais força sobre negras, indígenas, periféricas e comunidade LGBTI+.

“Faltando pouco menos de um mês para o dia 8 de março, vamos para as ruas denunciar as violências e exigir justiça! Denunciamos os assassinatos de lutadoras do povo e os feminicídios cotidianos que matam centenas de nós. Denunciamos o capitalismo e o patriarcado, a retirada de direitos e as violências deste governo conservador, racista, misógino e machista que ocupa hoje o poder no Brasil. Defendemos a democracia, a soberania popular, os territórios, as populações negra, indígena e LGBTI+. Nos queremos vivas!”, afirmam as organizadoras do 8M.

A concentração ocorre no Terminal de Integração do Centro (Ticen), a partir das 16 horas, com panfletagem e produção de camisetas. Depois, haverá cortejo com o coletivo artístico “Madalenas na Luta” pelas ruas do centro até a Escadaria do Rosário.

A partir das 18h30, a marcha segue para o Sinte (Sindicato dos Trabalhadores em Educação na Rede Pública de Ensino do Estado de SC), onde acontecerá um evento sobre “Lesbofobia, feminicídios e violências contra as mulheres”, organizado pela Marcha Mundial das Mulheres. Participam das discussões Suane Felipe Soares, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que vai apresentar o Dossiê do Lesbocídio, Janyne Sattler, professora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) que irá falar sobre Feminicídio e violência contra as mulheres em SC, como mediadora uma representante da Comissão Mulheres e Psicologia do Conselho Regional de Psicologia (CRP-SC).

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Entre as pautas do 8M deste ano estão o direito de viver livre de violências; defesa da vida das mulheres lésbicas, bissexuais, trans e travestis, e das mulheres, negras, indígenas e quilombolas; direito ao aborto seguro, legal e gratuito; garantia da inclusão e dos direitos das mulheres com deficiência; defesa da democracia e soberania nacional e garantia dos direitos trabalhistas e previdenciários.

“É pelas mulheres quilombolas que estou aqui, é pelas mulheres pretas da periferia onde moro, pelas mulheres negras da universidade que estou aqui, é por todas elas que talvez não tenham direito de fala, que estou aqui”, afirmou Luciana Freitas ativista do movimento das mulheres negras em vídeo produzido pelo 8M.

O Brasil ocupa o quinto lugar no ranking mundial de feminicídios, com cinco assassinatos a cada 100 mil mulheres. O recorte racial é preponderante. As mulheres negras são as mais atingidas, segundo o Atlas da Violência no Brasil, que verificou em 2017 o aumento em 22% de morte de mulheres negras, enquanto entre as mulheres brancas houve uma redução de 10%.

Santa Catarina tem o índice de violência doméstica mais alto do país, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2018, com 225 casos para cada 100 mil habitantes, e é o segundo em violência doméstica quando as vítimas são somente mulheres. É o primeiro em tentativa de estupro com 10,8 casos para cada 100 mil habitantes, e o segundo em estupro com uma taxa de 57%, perdendo apenas para Mato Grosso do Sul que registrou em 2017 o número de 66 casos – duas vezes mais que a média nacional que é de 29,4.

O nosso estado é campeão em violência contra as mulheres. Temos direitos ainda a conquistar, somos subjugadas a tantas coisas, convidamos todas as mulheres para construir esse ato, essa marcha com a gente e continuar nessa luta tão necessária, sobretudo neste momento em que estamos vivendo”, aponta Tathiana Zimermann Farias, da Marcha Mundial de Mulheres.

O vídeo produzido pelo 8M foi projetado, no último sábado, em um prédio no centro de Florianópolis durante evento lançamento do bloco de carnaval feminista/Foto: 8M SC

Vanda Pinedo do Movimento Negro Unificado (MNU) explica que o 8M não é um grupo específico de mulheres, é um movimento que busca incluir todas as mulheres, de todos os setores, vítimas de violência, mulheres da população de rua, domésticas e indígenas, “todas que percebem hoje a necessidade de unidade para manter seus direitos”.

“O MNU está no 8M porque acreditamos em construir e ampliar a unidade das mulheres pelo fim da violência, pela titulação dos territórios quilombolas que vai dar às mulheres quilombolas dignidade, autonomia e geração de renda. Pelo fim da intolerância religiosa, respeitem o nosso sagrado, as religiões de matriz africana”, coloca Pinedo.

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As mobilizações para o 8M começaram no início de janeiro e, desde então, já foram realizadas cinco reuniões integrando mulheres autônomas e representantes dos mais variados movimentos sociais. O próximo encontro ocorre segunda-feira (18), no Sintespe, centro de Florianópolis.

O 8M
A expressão 8M teve origem em 2016 na Espanha a partir de um grupo de feministas que organizava o Dia Internacional das Mulheres de 2017 e construía a proposta de uma greve internacional. Depois do continente europeu, a ideia se espalhou e ganhou força na América Latina nos atos argentinos denominados #NiUnaMenos. Acesse a cobertura nacional de 2018.

O chamado à paralisação ou greve feminista busca dar novo significado a esse tipo de mobilização, pautando a reflexão sobre como a desigualdade de gênero opera na luta de classes, visibilizando o trabalho não remunerado das mulheres nos afazeres domésticos e cuidados com os filhos e idosos.

“Nós paramos em todos os lugares, ampliando mais uma vez nossa greve: derrubamos fronteiras, inventamos novas geografias. Assim redefinimos os lugares de trabalho e produção do valor. Reconhecemos e queremos fazer emergir a dignidade dos trabalhos historicamente invisibilizados, explorados e negligenciados: o trabalho reprodutivo, o trabalho comunitário, o trabalho migrante”, dizem as integrantes do Ni Una Menos na convocatória deste ano.

A convocatória alerta para a onda de fascismo que assola o mundo, citando Jair Bolsonaro como um dos seus maiores símbolos. Afirmam que, ancorado em um projeto de poder que se constitui no fanatismo religioso e moralização dos desejos, o governo do Brasil avança sobre os direitos e existência das pessoas mais vulneráveis, especialmente povos indígenas.

 

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