Minha identidade de gênero sempre foi esta. Não me monto. Vivo a experiência de ser travesti 24 horas. Acordo e durmo como travesti. Se isto é ser essencialista ou mesmo reforçar os padrões de gênero é nesse lugar que quero estar e viver. Sou tão natural quanto qualquer cisgeneridade. Minha transgeneridade não é teatro e nem espetáculo. Na realidade não sei muito bem qual a fronteira que fixa e que define o que é ser uma travesti.

Muitas trans, quando comecei a militar no movimento em 2004, e naquela época basicamente eu era a única travesti professora. Me perguntavam como eu ia dar aula? Este questionamento me fazia pensar que muitas delas por estar atravessadas pela prostituição, se alimentavam de uma estética visual performativa de vestimenta para este lugar de trabalho. Assim, acreditavam que há um estilo único de ser trans.

Há uma complexidade de transgeneridade. Porém travesti e transexuais reivindicavam uma identidade de gênero no qual socialmente é associada ao universo feminino. Entretanto, o próprio universo feminino é fluído e ao mesmo tempo capitalista. Somos sugadas por uma etiqueta de gênero. No qual nos dita o que é feminino ou masculino.

Ser travesti é mais do que uma identidade. É enfrentar toda uma sociedade normatizada.

Ser uma trans é estar confortável numa identidade de gênero. E acima de tudo utilizar deste gênero para ser reconhecida e afirmada. É por ele que transitamos nos espaços cis. Como em banheiros. Nas políticas de gênero, como no caso de empregabilidade. No acesso as medicações de hormonioterapia. No processo de inclusão ao registro do nome na certidão de nascimento e ao benefício para aposentadoria como no caso das mulheres cis.

Tivemos conquistas inegáveis nos últimos anos, porém continuamos sendo vítimas de uma sociedade patriarcal: machista, sexista, branca e cisheteronormativa. Nossa luta é diária, pois podemos acordar ou morrer. Num país campeão em assassinatos LGBTT.

Sou contra toda forma de violência e exploração. Ao mesmo tempo que não aceito subordinação ou opressão seja da cisgeneridade ou da transgeneridade.

Um beijo para as travestis e transexuais de todo mundo e de ninguém.

*Gabriela da Silva é professora da Rede Estadual de Educação de Santa Catarina. Primeira mulher travesti a exercer a profissão no magistério estadual. Graduada em Letras pela Unisul, especializada em Fundamentos da Educação pela UNESC. Mestra em educação e doutoranda em educação pela UFSC. Cofundadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas de Travestilidades, Transgeneridades e Transexualidades (Netrans) – UFSC/CNPQ. Integrante do Instituto Brasileiro Trans de Educação (IBTE).

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