O último estudo sobre a camisinha feminina, realizado pelo Ministério da Saúde em 2005, apontou que apenas 4,7% dos homens e 3,5% das mulheres haviam usado alguma vez na vida. É difícil delimitar causa e efeito dessa subutilização. Com mais da metade da população formada por mulheres, o Brasil é um dos países que mais compra camisinha feminina no mundo. Ainda assim, a quantidade de preservativos femininos distribuídas pelo governo é insignificante se comparada à versão para os homens. No ano passado foram distribuídas, em todo o país, 552 milhões de camisinhas masculinas e apenas 22 milhões de femininas – o que representa 4% do total. Em Santa Catarina, a representatividade cai para 3% e em Florianópolis para 1%.
“O menor número distribuído quando comparado com o preservativo masculino se deve a melhor aceitação deste último e também pela limitação no valor do feminino”, afirma Adele Benzaken, diretora do Departamento de DST, Aids e Hepatites Viriais (DDAHV).
A “melhor aceitação” da masculina, no entanto, é resultado de vários fatores, entre eles o incentivo prioritário a ela. Sem protagonismo em campanhas de conscientização, a camisinha sequer fica exposta nos postos de saúde, ao lado da tradicional. “O departamento entende que existe um trabalho árduo para que o PF possa ser melhor utilizado como uma alternativa de prevenção das ISTs/Aids e gravidez não planejada. Tem desenvolvido ações para estimular o uso em vários estados priorizando algumas populações mais vulneráveis”, declara a diretora.
Atualmente a distribuição dos preservativos é voltada para todas as mulheres, “considerando as necessidades declaradas pela usuária e a disponibilidade do insumo nos serviços de saúde”, como esclarece Adele.
Na capital
Em Florianópolis, apenas 900 camisinhas são distribuídas ao mês às unidades de saúde – o que não garante o acesso das mulheres – , enquanto a quantidade de masculinas chega a 100 mil. Ana Cristina Vidor, gerente de Vigilância Epidemiológica da Secretária Municipal de Saúde, explica que o incentivo ao uso ocorre por meio de reuniões de planejamento familiar e abordagem da saúde da mulher nas consultas.
“Há disponibilidade de camisinhas femininas nos postos de saúde. Mas, por não serem tão populares e necessitarem de orientação para utilização correta, não ficam expostas para que o usuário pegue livremente, como ocorre com as camisinhas masculinas. Em vez disso, são oferecidas em consulta pelos profissionais de saúde e entregues após orientação do uso”, justifica Ana Cristina.
No posto de saúde em Santo Antônio só havia duas unidades no “estoque”. Elas não ficam disponíveis como a masculina sob a justificativa da necessidade de orientação sobre o uso. Na unidade do Saco Grande também não é diferente: há poucas camisinhas femininas disponíveis. A farmacêutica Fernanda Manzini explica que quase não faz pedidos do insumo em função da pouca procura.
Impacto do gênero no mercado
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Em apenas uma das cinco farmácias consultadas por Catarinas, em Florianópolis, o preservativo foi encontrado. Ainda assim, não há opção de marcas. O preço assusta: a Prudence, única disponível, está à venda por de R$ 22. Adele atenta para o fato de que a cultura de gênero e da sexualidade impactam no desenvolvimento de produtos e dos mercados. “Como o preservativo feminino está envolto de pouca popularidade, o produto ainda tem um valor de custo muito maior que o masculino, prejudicando a sua venda nas farmácias”, analisa.
Simone Martins, coordenadora de projetos da Semina, distribuidora da marca Della no Brasil, explica que o produto é comercializado por duas grandes redes Onofre e São Paulo, pelo valor médio de R$ 8. Porém, a venda é majoritariamente on-line. “O investimento em marketing é um impeditivo para a entrada em outras redes que possibilitem a ampliação da venda no país todo”, aponta.
A marca é fornecida nas versões branca e rosa, ao setor público, e branca e roxa, ao privado. O Ministério da Saúde distribui também o insumo em embalagem específica nas cores amarelo e roxo. De acordo com a coordenadora, o Brasil segue a tendência mundial de acesso à camisinha feminina fomentado pelo setor público. “Na maioria dos países, a camisinha feminina é voltada ao setor público para atender pessoas com menos condições de acessá-las nas farmácias. As constantes compras do MS servem como sensor de aceitação”, destaca.
Para ela o maior desafio do setor público é tornar o preservativo íntimo conhecido.
“A capacitação do provedor de saúde é a maior necessidade. Ele precisa oferecer o método e fazer o aconselhamento. Se ele não sabe explicar o uso, fica difícil que a usuária decida por si só. A mulher encontra tantos obstáculos que desiste e o insumo continua lá parado, porque não tem ninguém para explicar”, opina.
Simone, que atuou na introdução da versão feminina no mercado brasileiro em 1997, explica que o método passou a ser distribuído pelo MS depois de um estudo nacional que indicou 71% de aceitabilidade. Inicialmente foi fornecida para as chamadas populações prioritárias. Desde então, já foram distribuídas cerca de R$ 50 milhões de unidades em todo o país. Só na última compra em 2014 foram R$ 40 milhões.
“O governo brasileiro sempre esteve na vanguarda da proteção à Aids. Na época, o MS entendeu que o método poderia se somar às ações de prevenção”, lembra a coordenadora.
Mais resistente e barata
Em 2009, a necessidade do fabricante de realizar melhorias e reduzir custos levou à substituição da versão em poliuretano pela borracha nitrílica. Os materiais são alternativas sintéticas à borracha natural, conhecida como látex. Além de mais resistente do que o látex – presente na maioria das camisinhas masculinas – o método é antialérgico, permite maior sensibilidade e uso diversificado de lubrificantes, tanto a base de água quanto de óleo. Além de reduzir o custo do insumo, a versão em borracha nitrílica eliminou o ruído durante o uso, uma das principais reclamações ligadas à camisinha em poliuretano. Não há fábricas de camisinhas no Brasil; elas se concentram na Ásia, cujos países são os maiores desenvolvedores de borracha do mundo.
Compras pelo Ministério da Saúde
- 2000 – 2 milhões
- 2001 e 2002 – 2 milhões
- 2003 e 2004 – 4 milhões
- 2005 e 2006 – 4 milhões
- 2007 e 2008 – 4 milhões
- 9 e 10 – pausa em função do registro da camisinha em borracha nitrílica
- 2011- 20 milhões
- 2014 – 40 milhões
- 2014-2015 – 40 milhões