O Portal Catarinas fez uma chamada às candidaturas feministas de Santa Catarina, voltadas especificamente às candidatas mulheres cis e trans. A ideia é mapear as postulantes feministas do estado e gerar maior visibilidade para suas propostas. O mapeamento acontece a partir do preenchimento do formulário pelas candidatas. As respostas serão publicadas na íntegra por ordem de envio.
A quarta candidata a responder o formulário é Carla Ayres, 30 anos, postulante a uma vaga na Assembleia Legislativa pelo Partido dos Trabalhadores (PT). Mulher cis*, lésbica e branca, Carla vive em Florianópolis. É Cientista Social e doutora em Sociologia Política pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Catarinas: Conte um pouco sobre sua trajetória de vida/militância e quais motivações a levaram a disputar essas eleições.
Carla: Sou Carla Ayres, candidata a Deputada Estadual pelo PT-SC e tenho 30 anos. Sou Cientista Social e doutora em Sociologia Política pela UFSC, Universidade Federal de Santa Catarina, feminista e ativista dos movimentos LGBT e de Mulheres. Como suplente vereadora, assumi a Câmara Municipal de Florianópolis por um mês, período em que apresentei diferentes propostas na defesa dos direitos humanos. Considero o feminismo como um movimento, uma teoria, uma filosofia, seja o que for, que tem no centro a primazia do combate a todas as formas de opressão, considerando em primeiro lugar que vivemos em uma sociedade que perpetua relações de poder entre homens e mulheres. Sendo assim, pra mim, a defesa dos Direitos Humanos como um todo é um princípio feminista. A luta contra o machismo, contra o racismo, contra a LGBTfobia, contra o capacitismo, etc. Este é o foco: a defesa dos direitos humanos na construção de um estado mais Plural e Democrático. Para tanto é preciso levar em consideração demandas e pautas já formuladas pelos Movimentos Sociais, como as propostas que constam dos Planos Municipais de Políticas Públicas de cada área, numa relação interseccional e intersetorial.
Catarinas: Qual a importância de se eleger mulheres feministas em 2018?
Carla: Precisamos de mais mulheres LBT e feministas nos parlamentos para diminuir nossa sub-representatividade e dar voz às minorias oprimidas que não são contempladas na formulação de políticas públicas adequadas às suas especificidades. Só com mais mulheres no poder conseguiremos frear o fascismo em ascensão no país e retomar, em SC e em todos os parlamentos, um verdadeiro projeto popular que diminua as desigualdades geradas pelo Golpe contra a presidenta Dilma, e que trouxe tantos retrocessos em tão pouco tempo. Santa Catarina tem as mais baixas representações de mulheres nos parlamentos municipais e estaduais do país, isso explica a dificuldade que temos em fazer avançar muitos debates. Apenas 10% das cadeiras da Assembleia Legislativa são ocupadas por mulheres e nem todas consideram as pautas que nos dizem respeito, nós, feministas, para suas ações parlamentares. Estas eleições precisam marcar um avanço substancial na representatividade pra corrigir esse déficit, mas é fundamental que as mulheres e lgbts eleitas/os/es estejam lá para lutar por nós de verdade, levando pautas como o fim da violência, mais segurança, equidade salarial e condições de trabalho e estruturação do Estado, para considerar estas populações em todos os seus serviços.
Catarinas: Quais as principais questões a superar hoje em relação à desigualdade entre homens e mulheres? E quais suas propostas para isso?
Carla: Atuaremos com firmeza contra qualquer medida ou política que precarize os direitos trabalhistas, e em particular os direitos das mulheres. Quando se retiram direitos da classe trabalhadora, nós, as mulheres, somos sempre as mais atingidas, especialmente mulheres negras, jovens e das classes populares, como já vimos com o atual GOVERNO GOLPISTA! Vou ampliar o debate e propor campanhas que discutam a divisão igualitária do trabalho doméstico; iremos incentivar políticas públicas que promovam a qualificação profissional e a redução do analfabetismo, principalmente entre mulheres em situação de rua, mulheres LBT, camponesas, egressas de sistemas prisionais ou em situação e privação de liberdade, quilombolas, indígenas e demais populações em maior vulnerabilidade social. Vamos propor leis e apoiar medidas de valorização da agricultura familiar rural e urbana, da pesca e maricultura artesanal, além de outros setores, valorizando as diversidades regional, cultural e econômica, com foco em iniciativas lideradas por coletivos, associações e cooperativas de mulheres. Estimularemos políticas públicas que visem a incorporação de mulheres negras, com deficiência, transexuais e jovens ao mercado de trabalho qualificado. Lutaremos pela implementação de micro créditos facilitados para mulheres e população LGBT.
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Catarinas: Como pretende atender às diferentes especificidades das mulheres, contemplando em seus projetos as mulheres negras, indígenas, lésbicas e mulheres trans?
Carla: Estimularemos políticas públicas que visem a incorporação de mulheres negras, com deficiência, transexuais e jovens ao mercado de trabalho qualificado. Lutar pela implementação de micro créditos facilitados para mulheres e população LGBT. No Parlamento, vamos atuar na ampliação de políticas de humanização do acolhimento das mulheres nas redes pública e conveniada de saúde, com base nas especificidades de raça/etnia; deficiências; identidades de gênero e outras situações de vulnerabilidade. Trabalharemos pela garantia de formação continuada para profissionais de saúde acerca do cuidado, acolhimento e saúde da mulher no que diz respeito, especialmente à: ginecologia; obstetrícia; parto; amamentação etc. Iremos atuar politicamente pela legalização do aborto, com garantia do aborto legal e seguro para todas as mulheres que o desejarem: condição isenta de julgamento moral em casos de acolhimento de abortamento legal com base nas diretrizes da OMS e Lei 12.845/2013. Vamos lutar para ampliar as políticas públicas de combate à feminização do HIV-AIDS. Iremos trabalhar por políticas públicas que Incentivem a qualificação do atendimento adequado às Mulheres Transexuais, com formação continuada dos profissionais de saúde sobre especificidades da saúde desta população.
Catarinas: Santa Catarina é o segundo estado do País com maior número de estupro, segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública. De acordo com o mesmo relatório, em 2017, foram registrados 48 feminicídios. Como pretende atuar para a redução da violência contra as mulheres em SC?
Carla: Trabalharemos incessantemente pela IMEDIATA ASSINATURA E IMPLEMENTAÇÃO, por parte do Governo do Estado de SC, do Pacto Estadual Maria da Penha. O pacto já foi assinado, em março de 2018, pelo Ministério Público, Defensoria Pública, Conselho Estadual dos Direitos da Mulher, Tribunal de Justiça, Bancada Feminina da ALESC e Federação Catarinense dos Municípios. Iremos cobrar, desde o primeiro dia do governo estadual que assumir em 2019, que Pactue pela vida e proteção das mulheres! Vamos atuar constantemente no incentivo à ações e campanhas sobre o tema, salientando as ações de prevenção das violências e emancipação e libertação das mulheres do campo e da cidade. Vamos atuar e apoiar ações e políticas públicas de ampliação do atendimento em rede às mulheres que vivem em Santa Catarina, propondo e fortalecendo os CRAS e CREAS. Exigir a imediata construção da Casa da Mulher Brasileira em SC, uma iniciativa da Secretaria de Políticas para Mulheres que apresenta uma inovação no atendimento humanizado às mulheres. Integra no mesmo espaço serviços especializados para os mais diversos tipos de violência contra as mulheres: acolhimento e triagem; apoio psicossocial; delegacia; Juizado; Ministério Público, Defensoria Pública; promoção de autonomia econômica; cuidado das crianças – brinquedoteca; alojamento de passagem e central de transportes. O governo Dilma liberou recursos para a construção da Casa em Santa Catarina, mas a demanda foi abandonada pelo governo golpista, e ignorada pelo Governo Estadual desde então! Vou incentivar a criação e estruturação de delegacias especializadas e exclusivas de proteção às mulheres, como prevê a Lei Maria da Penha, e na criação de Centros de Referência Regionalizados, com atendimento adequado e quadro de profissionais formados exclusivamente por mulheres e com capacitação permanente.
Catarinas: Quais resistências vêm enfrentando em sua campanha e quais imagina enfrentar se for eleita para um cargo de poder tradicionalmente ocupado por homens, brancos heterossexuais?
Carla: Sabemos que homens, brancos e heterossexuais jamais irão nos ceder espaço, espontânea e voluntariamente. Para isso precisamos conquistar nossa legitimidade no voto, e de forma expressiva, e assim, nosso lugar no parlamento estadual de SC. Estamos em um gigantesca Primavera de Mulheres e sentimos que as demais candidaturas estão muito mais abertas às pautas que defendemos. Se eleita, seguirei sendo autenticamente o que sou: uma defensora intransigente do direito das pessoas terem direitos. As resistência serão enormes, visto que não bastará apenas derrotar o fascismo nas ruas. Será preciso derrotar o fascismo nos corações.
Catarinas: Enquanto uma candidata feminista como pretende atuar de forma a enfrentar os discursos reacionários que acreditam na existência de uma “ideologia de gênero” e que não admitem que as mulheres tenham autonomia plena sobre seus corpos, incluindo aí a pauta pela descriminalização do aborto?
Carla: Resistiremos através da ação política e da EDUCAÇÃO PÚBLICA DE QUALIDADE E EMANCIPATÓRIA. Vamos atuar na defesa irrestrita da ampliação de investimentos da educação pública, gratuita e de qualidade em todos os níveis, bem como:
– Na garantia de uma Educação Sem Mordaça: que seja não-sexista, não-racista e não-LGBTfóbica;
– Na garantia das 20 metas do Plano Nacional de Educação – universalização do Ensino, no campo e na cidade, respeitando as especificidades de cada público;
– Na promoção da igualdade de gênero nos ambientes escolares, entre toda comunidade escolar;
– No desenvolvimento de Políticas Curriculares que promovam amplo debate do conteúdo de diversidade sexual e de gênero nas escolas, bem como que debatem as violências de gênero que incluem ainda discriminação contra mulheres negras, lésbicas, transexuais, com deficiência, indígenas e outras em situação de vulnerabilidade social!
– Na ampliação do acesso às creches com aumento das vagas e centros de educação infantil.
Catarinas: Quais pautas são prioritárias na sua plataforma de campanha?
Carla: Defendemos uma sociedade com respeito à igualdade entre mulheres e homens, que valorize os Direitos Humanos, a cidadania integral da população LGBT e das trabalhadoras e trabalhadores. Uma sociedade com respeito ao Estado Laico, à liberdade religiosa e também que não seja capitalista, racista, capacitista, nem proibicionista. Luto para que tenhamos ampla participação popular e pela universalização dos serviços públicos, gratuitos e de qualidade.
*Cis caracteriza a pessoa cuja identidade de gênero é a mesma designada no nascimento.