Natalie Southwick, coordenadora do programa América Latina e Caribe do Committee to Protect Journalists (CPJ), em Nova York, se manifestou contra a instalação da CPI do aborto, que irá investigar jornalistas em Santa Catarina pela reportagem que denunciou a violação de direitos de uma menina de 11 anos. Em matéria publicada nesta semana no site da organização internacional, Southwick afirmou que a “Assembleia do Estado de Santa Catarina deve abandonar imediatamente essa investigação absurda e respeitar a liberdade de imprensa e a confidencialidade das fontes – direitos garantidos na Constituição brasileira.”

Em 11 de outubro, a Assembleia Legislativa de Santa Catarina realizou a primeira sessão de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), que investiga o Intercept Brasil e o Portal Catarinas pela reportagem colaborativa, publicada em 20 de junho, sobre tentativas de integrantes do ordenamento jurídico estadual para impedir o acesso de uma sobrevivente de estupro de 11 anos a um aborto legal. 

“A investigação da assembleia legislativa catarinense sobre o The Intercept Brasil e o Portal Catarinas flagrantemente tem como alvo os veículos de comunicação e jornalistas que corajosamente expuseram os maus-tratos do Estado contra uma criança sobrevivente de estupro que procurava ter acesso ao aborto legal. Esta é uma tentativa de intimidar a imprensa e ameaçar suas fontes”, disse Natalie Southwick, coordenadora do programa América Latina e Caribe do CPJ, em Nova York.

Em 28 de junho, a deputada catarinense Ana Caroline Campagnolo (PL) apresentou petição, co-assinada por 21 parlamentares, pedindo à CPI que determinasse como os dois veículos tiveram acesso às informações vazadas citadas na reportagem, incluindo um vídeo da audiência em que uma promotora e uma juíza questionam a então menina de 10 anos e tentam repetidamente convencê-la a não interromper a gravidez.

A petição de Campagnolo dizia que a investigação investigaria o vazamento do vídeo para a imprensa e visava “esclarecer” como os jornalistas conseguiram acesso a “informações relevantes, confidenciais e extremamente sérias”.

De acordo com o artigo 41 do regimento interno da Assembleia do Estado de Santa Catarina (Alesc), a CPI tem “poderes investigativos semelhantes às autoridades judiciárias”, incluindo a possibilidade de intimação, e terá 120 dias para concluir o inquérito, que pode ser prorrogado por mais 60 dias a pedido.

A CPJ lembra que o artigo 5º da Constituição Federal do Brasil protege a “confidencialidade da fonte quando necessária ao exercício profissional”.

“Esta investigação é claramente uma tentativa dos políticos de criminalizar, intimidar e silenciar o jornalismo que revelou os abusos chocantes do sistema de justiça do estado de Santa Catarina contra uma menina inocente de 11 anos”, disse Andrew Fishman, presidente do The Intercept Brasil, ao CPJ.

“O Intercept e o Portal Catarinas prestaram um serviço público com suas denúncias e não cometeram nenhum crime.”

A reportagem de 20 de junho do Portal Catarinas e do The Intercept Brasil revelou que a criança teve o acesso negado ao aborto legal quando sua mãe a levou para um hospital em Santa Catarina. Então, um tribunal estadual ordenou que ela fosse tirada de sua família e mantida em um abrigo por mais de um mês.

O artigo 124 do código penal brasileiro pune o aborto, exceto nos casos de estupro ou quando não houver outra forma de salvar a vida da gestante. 

Em resposta à reportagem, o presidente Jair Bolsonaro e o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos pediram abertamente uma investigação sobre os veículos, segundo reportagens. Em 19 de julho, a Alesc autorizou a abertura do inquérito, segundo noticiou o site do parlamento estadual.

Em 5 de outubro, o CPJ e 15 outros grupos de liberdade de imprensa e direitos das mulheres enviaram uma carta ao Relator Especial sobre Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos expressando preocupação com os riscos que a investigação parlamentar representa para a liberdade de imprensa e a confidencialidade das fontes. 

O CPJ enviou um e-mail a Ana Caroline Campagnolo e telefonou para seu gabinete na assembleia estadual, mas não recebeu uma resposta imediata. O CPJ também enviou um e-mail ao Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, mas não recebeu resposta.

Como o CPJ documentou anteriormente, os meios de comunicação sobre os direitos das mulheres e o aborto no Brasil enfrentaram queixas criminais, ataques DDoS e assédio judicial

Leia a matéria no site do CCJ.

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