Ano passado, a escritora Giovana Madalosso me chamou para tomar um café e me contou que estava à procura de uma jornalista feminista para uma missão ambiciosa: usar seus dotes investigativos para descobrir quem são as escritoras brasileiras que aparecem em dezenas de fotos históricas feitas no país e no exterior.
O movimento, que recebeu a alcunha de “Um grande dia para as escritoras”, nasceu às vésperas da Feira do Livro do ano passado, a partir de um convite publicado nas redes sociais das organizadoras: a própria Giovana junto com Paula Carvalho e Natalia Timerman. “Escritoras de São Paulo, venham para uma foto histórica”, dizia o chamado que correu o Instagram – e o modelo começou a ser replicado em outras cidades, dando vida a uma enorme corrente de trabalhadoras da palavra.
A primeira foto foi levada a cabo no dia 11 de junho de 2022, no Pelourinho, em Salvador. As próximas vieram no dia seguinte, inclusive a emblemática imagem de mais de 400 escritoras ocupando os degraus do Estádio do Pacaembu, um local historicamente ocupado por homens. Tenho um carinho especial por essa fotografia porque ela ilustra com perfeição a essência do movimento: mostrar que nós, mulheres escritoras, somos muitas e podemos estar onde bem entendermos.
Com o passar dos dias e dos meses, surgiram muitas outras fotos históricas: em Manaus, na Rocinha, em Varginha, em Porto Alegre, em Curitiba, em Florianópolis, entre outras. Com rostos de escritoras que amamos, como Manuela D’Ávila e Maria Valéria Rezende, que até topou colar uns lambes em João Pessoa depois de fazer a foto.
A primeira onda teve 48 cidades participantes. Digo “primeira onda” porque as fotografias nunca mais deixaram de ser feitas e muitas cidades já têm até data marcada para o repeteco, celebrando o aniversário do movimento. O número de mulheres também é grandioso: foram 2.302 escritoras identificadas a partir do trabalho que prontamente aceitei fazer depois daquele café com Giovana.
Quebra-cabeça
O movimento foi organizado de maneira orgânica e artesanal, sem muitos padrões a serem seguidos. O resultado é que temos registros de câmeras profissionais e de celulares, de mulheres em fila e em roda, eternizando pequenos e grandes grupos.
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Para distinguir uma escritora da outra foi preciso criar intimidade com aquilo que nos torna únicas: as marcas de expressão que o patriarcado nos ensina a odiar, o movimento dos cabelos que paramos de alisar, as cicatrizes de nossas reveses. Se você é uma das escritoras que compõem o movimento, saiba: quem você escolheu manter ao seu lado na hora da foto também me disse muito sobre sua identidade.
Foram cinco meses de um trabalho solitário e ao mesmo tempo coletivo, como também é escrever. Como se tivesse à minha frente um enorme quebra-cabeças humano, tive milhares de ideias no meio do banho, do sono, do rolê, e quase sempre estava com as fotos abertas no computador, encaixando mais uma pecinha.
Peço desculpas à minha namorada e às minhas amigas pelas tantas vezes que me vi instigada demais a encaixar peças para manter a atenção em uma conversa, ou saquei o celular no meio de uma avenida perigosa para anotar mais um nome. Também agradeço às muitas mulheres que toparam me ajudar dizendo quem são, quem conhecem e por qual nome preferem ser lembradas nos anais da história.
Lançamento do livro
A reunião de tantas mentes criativas fez crescer dezenas de projetos: coletivos de escritoras, saraus, um podcast prestes a estrear… Entre as muitas criações do movimento está também o livro com as fotos históricas e textos de escritoras de todas as cidades participantes. A obra é organizada por Giovana Madalosso, Esmeralda Ribeiro, Deborah Goldemberg, Paula Carvalho e Sony Ferseck.
“Um grande dia para as escritoras – autoras do Brasil mostram a cara” está em pré-venda no site da Bazar do Tempo, a R$ 98. As escritoras fotografadas podem comprar com 40% de desconto, basta falar com a organização de cada cidade.
Em 11 de junho, haverá três lançamentos em cidades diferentes: São Paulo (SP), Macapá (AM) e Niterói (RJ). Em São Paulo, nessa data, haverá um autografaço das escritoras que participaram da foto na praça do Pacaembu. A partir das 19h, um debate reunirá, no palco principal da Feira do Livro, as escritoras Giovana Madalosso, Esmeralda Ribeiro, Natalia Timerman e Paula Carvalho.
No dia 17, Arcoverde (PE) e Curitiba (PR) lançarão o livro. Porto Alegre (RS) terá lançamento em 24 de junho, e Santos (SP), no dia 29. No dia 8 de julho, as escritoras lançam em Belo Horizonte (MG) e, em Nova Friburgo (RJ), no dia 11.
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