Poéticas da convivência: amavisse apesar de qualquer agora
espiral da palavra
desejo
vem
do olho pra voz
amanhã já é outra coisa
porque se alastra o medo
anoushka shankar ou django reinhardt
dentro da cabeça aquária
criam bolhas de ar
que explodem para expulsar o perigo
fogo dentro de embarcação
sempre obriga ao mergulho
antes de se extinguirem
os fogos quase mortos
nos cabelos brancos
a mula sem cabeça nos oceanos
cansa
e se apresenta
canta
mais uma vez
deseja ondas no lugar de ninhos
o ventre segredando outras revelias
me falas de leite nas tetas
te falo que arvores secas
sobrenadam e geram
fluxos de um sangue extinto
e filhas grandes
de olhos vidrados
visando apocalipses
hoje a pausa me deseja
onde a onda
aonde vão as ondas
e as ninharias de desejos
desejo que minha voz
saia do aquário
e que a moeda falsa atirada no poço
seja acessível a todas as mãos
que escavarem os metais redondos de sonhos falidos
a exigirem o fracasso de fúrias ocas
desejo tanto te falar com a boca
espiral de palavras
da jaula desejo te falar de desejos
de miudezas e de crítica e de cisma punitivista
da terra no assoalho de uma biblioteca
da minha mania de ser falcatrua
(no meio de tudo, inter(rompendo) a espiral atravessou gorda, lenta e insegura uma nota de rodapé com viveiros de castro gritando de dentro de índios brasis que há andando por aí com rumo e destino um projétil proposta de uma antropologia enquanto exercício de descolonização permanente do pensamento, que aspira despertar alguns possíveis, entrever algumas saídas que permitam…um desenlace outro que – pausa dramática
porque sim, é o que está nos acontecendo – a morte por asfixia)
desejo tingir as palavras
de livros com asas
em seguida esquecer de tudo
memória voa um pedaço
volta ao aquário
pesada de esquecimentos
e de infâncias
desvios desacatos derrelição
desabandono o desejo
espiral de palavras
desejo
não comunicar se não houver
no teu ouvido uma concha
cálida funda cheia
mônada de afeto
desejo te perguntar
aonde anda a onda
ondas presas se agitam?
revolvem os fundos?
o nome da reta torta
que desvia da espiral
é farpa?
a moeda objeto por si só
é desejo numismático
perco desejos que troco
por moedas falsas
em poços e aquários
desejo que os desejos se encontrem
rolem por oceanos
e quebrem em ondas na praia
desejo que da próxima vez
a espiral de palavras seja apenas
uma língua desejante
uma terra ainda prenhe
apesar dos corpos que engole
quase sem memórias
sem aspirar
mais nada
*Lu Tiscoski