A escritora Paola Giometti é a nossa entrevistada do projeto Chicas que Escrevem.

Texto de abertura: Gabriele Oliveira

A Chica que Escreve da semana é Paola Giometti, autora brasileira com diversas obras publicadas voltadas ao público infanto-juvenil. Aos 11 anos, foi considerada a escritora mais jovem do Brasil com a publicação do livro Noite ao Amanhecer (1995), publicado pela Cassandra Rios. 

Bióloga e PhD em Ciências, hoje Paola mora em Tromsø, no norte da Noruega, onde trabalha em seus novos livros inspirados no folclore e na mitologia nórdica. A escritora foi finalista do prêmio Reconhecimento Internacional da Literatura Brasileira, promovido pela International Academy of Brazilian Literature e Focus Brazil New York (2020). 

Como de costume, para começar, você poderia contar um pouco de sua trajetória como escritora? Por que começar a escrever? E mais, por que continuar escrevendo?  

Quando eu tinha seis anos, perguntava para minha mãe quando eu iria aprender a escrever, pois queria contar histórias. Eu percebi essas vontades quando ia às papelarias e recebia um caderno novo ou um pacote de sulfite. Para mim, esses eram os melhores presentes que eu poderia ganhar. Eu sentia quanta coisa poderia criar com um pacote de sulfite. 

Escrevo histórias desde os sete anos, mas meu primeiro livro escrevi com nove. Ele se chama A Guerra no Deserto e tem até mesmo uma participação de Arnold Schwarzenegger como um dos heróis. Com dez anos, cheguei a ter um livro ata enumerando vários livros que eu estava planejando escrever. Aos doze anos eu já tinha 30 livros escritos, todos eram histórias onde os animais eram os personagens. 

Hoje, com 37 anos, eu posso dizer que consegui realizar o meu sonho de ser escritora. O que passei a levar de modo profissional em 2014, quando publiquei O Destino do Lobo. Depois dele me aprofundei na escrita, estudando livros mais técnicos, que também ajudaram a impulsionar as ideias. Assim acabei escrevendo vários outros livros como o Symbiosa e a Ameaça no Ártico, Drako e a Elite dos Dragões Dourados, entre outros. 

Depois que me mudei para a Noruega passei a investir em minha carreira internacional, e publiquei The Destiny of the Wolves, que em breve receberá a sua versão em espanhol. Ano passado eu fui finalista do prêmio de Reconhecimento Internacional da Literatura Brasileira, promovido pelo Focus Brazil New York, e isso me deu grande incentivo para continuar nesse caminho.

Provavelmente não vou ficar rica escrevendo livros. Mas eu os escrevo porque eles salvam minha vida todos os dias. São a minha forma de ficar imersa em um cenário e me aventurar por ele com meus personagens. Minhas histórias podem falar muito da minha vida e também falam por mim. Por isso eu tenho que escrever! E fico feliz que as pessoas gostem dos assuntos que eu escrevo.

Agora, enquanto leitora. Quais foram suas influências? Poderia nos contar um livro que te marcou? Qual foi sua última leitura?

A minha vida sempre foi uma caixa de inspiração, pois em meus livros coloco muito sobre as fases que vivi na minha infância e adolescência, principalmente as mais difíceis. 

Eu adoro me inspirar na natureza para escrever meus livros. Quase sempre ela é o foco central dos livros, a busca por ela, pela ideia mística que ela nos oferece. O videogame também é uma fonte de pesquisa e inspiração para criar personagens e cenários. 

Gosto de pegar as características psicológicas e comportamentais de pessoas que conheci. Mas, O Destino do Lobo, por exemplo, todos os lobos do livro foram inspirados em comportamentos e manias dos cães que tive. Personagens com comportamentos realistas dão mais veracidade à história e acredito que o leitor se entrega muito mais à ela.

Mas se for levar em conta as minhas influências na literatura, posso dizer que foi uma enciclopédia de animais que eu tive em casa – além de acreditar que eu tenha sido influenciada por Rick Riordan, J.K.Rowling, Paulo Coelho, Bernard Cornwell, Michael Ende, J.R.R. Tolkien, Philip Pullman e Dan Brown. 

Um livro que me marcou foi o do Michael Ende, História Sem Fim; comprei um reconstruído por durex, por 7 reais em um sebo. Ele foi um dos poucos livros de ficção que eu li, e que ao mesmo tempo tinha tantos elementos importantes para serem refletidos como a importância das memórias de infância, a forma com que o personagem principal é levado a reconhecer sua mãe na forma de uma árvore. Acredito que eu gosto muito de ir por esse caminho que o Ende foi no História sem Fim.

Você publicou vários livros já, gostaria de te ouvir um pouquinho a respeito. Poderia nos contar sobre “Drako e a elite dos dragões dourados”?

O Drako foi um livro que eu escrevi na minha adolescência, quando eu passava por uma fase de “ter que ser como os outros queriam” para ser aceita. Como cresci longe de pessoas que gostavam de ler e de quem tinha os mesmos hobbies que eu, acabei criando o Drako, um dragão vermelho tímido e cheio de limitações que foram impostas a ele. Mas, em contrapartida, também há outro personagem importante nessa história, uma mosca chamada Zezé, que não leva desaforo para casa e fala o que bem entende.

A Mosca passa a viver no ouvido do dragão, contando a ele que a vida não era só aquilo que ele acreditava ser. Drako aprendeu a voar com Zezé, e assim, o dragão vermelho voa de um modo único e que nenhum outro dragão já experimentou. Desse modo, Drako descobre o mundo, seu sonho de se tornar um ‘magiquímico’ (termo criado pela autora, que significa mistura de magia com alquimia) e ao mesmo tempo tenta lutar contra uma máfia de feiticeiros que quer o ouro da pele dos dragões dourados.

Recentemente seu livro “Destino dos lobos” saiu em inglês, correto? Como tem sido a experiência de ver sua obra traduzida? Poderia nos contar um pouco a respeito?

The Destiny of the Wolves foi publicado pela Underline Publisher nos EUA. A experiência de ter seu livro publicado em outra língua dá a sensação de que sua história vai navegar por novas terras. Talvez fosse assim que os exploradores em navios se sentissem, com o mesmo frio na barriga. Meus primeiros leitores estrangeiros foram noruegueses, o feedback foi muito positivo e isso me deixou muito feliz.

Além desses livros você é bióloga, PhD em ciências, certo? Como foi a relação entre essa sua vida mais científica e sua literatura?

A literatura é o meu modo de relaxar e viver em meus mundos. Trabalhar em um laboratório com pesquisa em câncer faz muitas vezes as pessoas se manterem focadas em responsabilidades e metodologias fechadas. Já notei que quando estou trabalhando muito no laboratório, escrevo mais sobre a natureza, e quando estou muito na natureza, eu gosto de criar livros ou contos com características mais científicas. 

De qualquer maneira, a ciência me deixou mais chata para escrever, pois leio tudo tentando analisar se o universo que criei poderiam ser plausíveis e ser explicados dentro de meus livros. Dessa forma eu evito que minhas histórias fiquem mal fundamentadas, trazendo mais veracidade, mesmo que seja uma história onde um dragão vermelho pode fazer magiquímica com o pensamento.

Falando de futuro, você está trabalhando em algum projeto atualmente? Se sim, poderia nos contar um pouco sobre esse livro?

Estou trabalhando no segundo livro da saga Drako, intitulado Drako e o Enigma da Árvore, que conta a história de quando Drako se torna um magiquímico numa importante sociedade de dragões, e passa por uma grande perda, entrando em depressão. 

Motivado a mudar seu destino, dedica-se ao estudo de uma árvore que possa ajudar a melhorar o dia de todos. Mas nem sempre todos querem ver o nosso progresso, e Drako terá que enfrentar até mesmo uma maldição nele colocada, para que isso atrapalhasse a sua motivação na magiquímica (essa maldição foi inspirada na doença fibromialgia).

Estou trabalhando nos meus livros medievais de folclore nórdico dark. Desses vão nascer pelo menos dois livros: um com animais escandinavos e outro com conteúdo mais sombrio e adulto. 

Também estou escrevendo O Hibernar do Urso, que é o quarto livro da série Fábulas da Terra. O protagonista é o urso-pardo Kodiak, que faz crossover em O Destino do Lobo e O Código das Águias. Enfim, tem outros mais, mas gostaria de falar deles em outra oportunidade.

Como foram suas experiências de publicação? O que mais te marcou no processo?

Antes eu pensava que a parte mais difícil era publicar. Mas, hoje, eu percebo que a parte mais difícil é escrever algo que realmente valha a pena ser publicado. Eu sou muito crítica comigo mesma, exigente e me cobro demais. 

Tem noites que acordo com essa cobrança e ela vai embora só quando escrevo ou resolvo o que está pendente. Isso já me fez reescrever o Drako, por exemplo, três vezes. O livro que eu levei oito anos para fazer foi reescrito quatro vezes. Hoje, com mais experiência na escrita, fazendo meus diagramas e tudo mais, eu consigo sanar isso para ser reescrito apenas uma vez mais.

As críticas me ajudaram a me tornar mais profissional, mais seletiva com o que eu escrevo, e aprendi a “errar” menos com elas, facilitando muito o processo de criação. Não existe uma fórmula certa e outra errada. Só existem modos que facilitam e que complicam o processo de criação, correção e a história como um todo. 

Antes eu deixava a história fluir como um rio, e mais para o fim eu via se ele estava ou não prestes a acabar. Isso me tomou muito tempo de correção, centenas de horas para deixar tudo redondo depois. Só no Drako, que escrevi com 16 anos, eu cheguei a jogar fora mais de 50 páginas escritas.

Acredito que o que mais me marcou positivamente no processo de publicação foi o feedback das pessoas, foi ouvir que eu inspirei ou influenciei outras pessoas, ajudei que fossem publicadas, ensinei alguma coisa.

É muito gratificante ver as pessoas dizendo que leu meus livros como se assistisse a filmes, e que compreendeu um personagem ao vê-lo aparecer em outra história. Amo isso.

O que me marcou negativamente nas experiências de publicação é o quão grande é a fogueira de vaidades no meio editorial. Já ouvi de tudo como: você não é nada sem minha editora; se eu não sou um best-seller, você nunca será; quem é você para falar de lobos… Já ouvi inclusive um editor tentando convencer um escritor a publicar com ele, usando o argumento de que o final do meu livro foi ele quem escreveu.

Por fim, há algo que você gostaria de dizer para outras mulheres que escrevem? Ou, alguma mensagem final?

Se fosse fácil, todo mundo faria. Acredite no seu caminho, invista em personagens femininas, vá até o fim com seu projeto e não o deixem na gaveta. Estudem muito o tema que escrevem para que tenham um bom embasamento, e assim estarão com a língua afiada caso precisem responder a editores difíceis e ao machismo que existe contra a inteligência em mulheres. Bem, com a internet, hoje é mais fácil encontrar meios de se publicar.

Por favor, indique um livro para os leitores e também um filme ou série.

Livros: Se quer estudar como escrever boas histórias, eu indico o livro A Jornada do Escritor, do Christopher Vogler.

Séries: Trapped, que está no Netflix. A história se passa na Islândia, envolvendo crimes de assassinatos numa cidadezinha bloqueada por uma tempestade de neve.

Indique outra escritora que gostaria de ver por aqui. 

Regina Drummond

 

O jornalismo independente e de causa precisa do seu apoio!


Fazer uma matéria como essa exige muito tempo e dinheiro, por isso precisamos da sua contribuição para continuar oferecendo serviço de informação de acesso aberto e gratuito. Apoie o Catarinas hoje a realizar o que fazemos todos os dias!

Contribua com qualquer valor no pix [email protected]

ou

FAÇA UMA CONTRIBUIÇÃO MENSAL!

  • Laura Elizia Haubert

    Laura Elizia Haubert é doutoranda em Filosofia pela Universidad Nacional de Córdoba, Argentina. Graduada e Mestre em Fil...

Últimas