“Já estava cansada de viver às margens da vida.”
Carolina Maria de Jesus (1914-1977)

A proposta desta coluna no Portal Catarinas é criar um espaço de crítica feminista de arte. Serão textos assinados individualmente ou em coautoria por mulheres pesquisadoras e acadêmicas de uma gama de linguagens artísticas. O objetivo é tanto dar visibilidade ao intenso trabalho de mulheres artistas de Santa Catarina, como também instituir uma prática: a análise a partir de abordagens feministas e interseccionais de obras artísticas contemporâneas produzidas e/ou apresentadas no estado.

Muitas podem nos perguntar então: o que é crítica feminista de arte? Bem, essa ideia não é nova, ela surgiu e se consolidou há muitos anos atrás na área de literatura e inspirou teóricas de outras áreas artísticas – do cinema e televisão, do teatro, das artes visuais, quadrinhos, animes, games, moda – ao longo do século XX. No caso do teatro, na década de 1980 a professora, teórica de teatro e feminista estadunidense Jill Dolan lançou o livro The Feminist Spectator as Critic (1989), que poderia ser traduzido como A Espectadora Feminista como Crítica. Dolan analisa o contexto de produção teatral de Nova Iorque para argumentar que a grande maioria das obras teatrais produzidas no circuito comercial eram criadas a partir de uma perspectiva masculina, com o objetivo de contemplar um espectador ideal: o homem, heterossexual, branco e de classe média norte-americano. Dolan aponta que, tanto nas peças clássicas quanto nas montagens comerciais daquele período e contexto, os elementos de narrativa, personagens e estrutura de ações objetificavam as personagens femininas e as colocavam como periféricas à trama. Neste livro, pioneiro dos estudos teatrais feministas, Dolan seleciona e tece uma análise crítica de espetáculos então em cartaz que, segundo a autora, não apenas colocavam as personagens femininas no centro da trama mas que também criavam universos mais complexos para representar as sutilezas e multiplicidades das experiências femininas.

O interessante é que Dolan foi além dos espaços acadêmicos e das publicações especializadas. Em 2005 ela criou o blog The Feminist Spectator[1] (A Espectadora Feminista), o que tornou seus textos, ou como ela nomeia, suas “resenhas e ruminações sobre como o teatro, os filmes e a televisão que formatam e refletem nossas vidas”[2] acessíveis a um grande número de pessoas, acadêmicas ou não. Estas e outras empreitadas de mulheres acadêmicas e artistas feministas são fontes de inspiração para nós do Coletivo Mulheres em Cena.

Temos nossos lugares de fala e de produção acadêmica, onde produzimos textos com abordagens feministas e que consideram gênero, raça e classe social como categorias de análise crítica. No entanto, não queremos falar apenas para nossos pares. Queremos falar para outras pessoas que estão fora do circuito acadêmico e que sabem que é na esfera das emoções que se constroem preconceitos e fobias. Mulheres e homens que queiram pensar em como espetáculos de teatro, de dança, performances, músicas, filmes, exposições, objetos, imagens e vestuário “formatam e refletem nossas vidas”.

Sim, nossos textos querem também ruminar sobre nossos contextos de produção e difusão de arte, sobre a arte feita por mulheres e a representação das mulheres na arte. Queremos ainda refletir sobre a representatividade da mulher nas políticas públicas para a cultura, curadorias e gestão de espaços culturais.

Agradecemos ao Portal Catarinas pelo interesse em nossa proposta e abertura deste importante espaço de crítica feminista de arte em nosso estado.

[1]Acesse o premiado Blog de Jill Dolan <http://feministspectator.princeton.edu/about/>

[2]Frase sub-título do Blog <http://feministspectator.princeton.edu/about/>

 

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