Os espetáculos promovidos pelo presidente Jair Bolsonaro soam como um desrespeito às vítimas da Covid-19 e a seus familiares

A política do pão e circo foi muito difundida na Roma Antiga para manter o povo afastado das questões políticas e reflexões mais profundas sobre os excessos cometidos pelos dirigentes do império. Aliás, pouco importava a política se as pessoas tivessem alimento e diversão.

O que vemos no Brasil atualmente é um rascunho, uma versão malfeita dessa política, mas com uma diferença gritante: temos quase nenhum pão e muito espetáculo. Exemplos não faltam para ilustrar este momento pelo qual o país passa. O mais recente foi o passeio de motocicleta do presidente Jair Bolsonaro no último domingo, no Rio de Janeiro.

Promovido pela federação de motos daquele estado, o encontro foi uma espécie de homenagem e agradecimento pela isenção de pedágio que os motociclistas terão nas estradas sob nova concessão. A manifestação reuniu centenas de pessoas sem máscaras, causando aglomeração em plena pandemia – o que contraria o decreto daquele estado que proíbe esse tipo de ato durante a grave crise imposta pela Covid-19.

Somente com seguranças estima-se que o governo gastou R$ 485 mil reais – o suficiente para pagar o equivalente a 2 mil pessoas que recebem auxílio emergencial de R$ 250,00.

Não são poucas as oportunidades em que o presidente parece ter um prazer sádico de mostrar que a Covid não o assusta. Afinal, é apenas uma “gripezinha” para ele. Mas essa mesma gripe, segundo a visão dele, ceifou mais de 450 mil vidas e continua traçando uma trajetória de mortes que não terá fim tão cedo.

Enquanto isso, a imunização segue em ritmo lento, esbarrando na falta de insumos – resultado das declarações infelizes contra parceiros comerciais aos quais estamos totalmente ligados, dependentes até, para manter a produção das duas principais vacinas aplicadas no país.

Os atos insensatos evidenciam a indiferença do governo frente ao aumento da fome e do desespero da população em busca de renda. Levantamento feito pela organização Outdoor Social, em 14 das mais populosas favelas do país, revelou que a taxa de isolamento social, despencou de 68%, em 2020, para 56% neste ano. As pessoas não estão se expondo ao vírus à toa. Estão saindo porque precisam buscar fontes de renda para manter a família.

Outra evidência é o aumento de atendimentos, especialmente no Distrito Federal, de quem procura as unidades de saúde relatando problemas que parecem ser sintomas de doenças, mas são na verdade sinais de fome.

Diante desses dados – e não estamos aqui mostrando as pesquisas que atestam o aumento da fome e da miséria no país – fica evidente que passou da hora de deixar de lado o humor ácido e o exibicionismo. Reserve-os para os momentos com a sua família e com os que dividem com você suas ideias negacionistas e sectárias.

O Brasil não precisa de mais espetáculos como o exibido por jornais e TVs no último domingo. O país precisa de pão, com mais vacina no braço e comida na mesa!

* Paola Carvalho é diretora de Relações Institucionais da Rede Brasileira de Renda Básica, uma das 300 organizações responsáveis pela campanha #auxílioatéofimdapandemia

O jornalismo independente e de causa precisa do seu apoio!


Fazer uma matéria como essa exige muito tempo e dinheiro, por isso precisamos da sua contribuição para continuar oferecendo serviço de informação de acesso aberto e gratuito. Apoie o Catarinas hoje a realizar o que fazemos todos os dias!

Contribua com qualquer valor no pix [email protected]

ou

FAÇA UMA CONTRIBUIÇÃO MENSAL!

  • Paola Carvalho

    Assistente social, especialista em Gestão de Políticas Públicas na perspectiva de gênero e promoção da igualdade racial,...

Últimas