Contratada pelo Avaí, Natália Pereira, de 9 anos, é a primeira menina a passar em uma peneira de categoria de base masculina de um clube profissional do Brasil. Agora, a menina do laço, como é conhecida por jogar com um laço no cabelo, representará o Leão, seu time do coração, em competições de futsal e futebol de campo no sub-10 masculino.
Nati, como gosta de ser chamada, é habilidosa desde pequena. Começou a jogar bola com seu irmão mais velho, Vinícius, e o que era brincadeira se transformou em paixão. Aos sete anos ela decidiu que queria competir e os pais foram em busca de um time que aceitasse meninas. O desafio maior começava aí, já que são raras as escolinhas e torneios que aceitam meninas. As poucas categorias de base feminina e competições que existem são a partir dos 13 anos.
Segundo a mãe, Karyna Pereira, a família encontrou portas fechadas e times que não quiseram passá-la em peneirão, até o contato com o professor Márcio Porto, da Associação Desportiva do Instituto Estadual de Educação (ADIEE), que a aceitou mesmo sem conhecer seu talento, e Nati foi a grata surpresa do professor. Nesse mesmo ano, em 2018, Natália tornou-se destaque do time Sub-9 e foi a primeira menina a competir na Liga Metropolitana, junto com 900 meninos, tornando-se a artilheira do campeonato.
Quando o assunto é preconceito, a mãe lembra que “os meninos a abraçaram desde o primeiro dia” e que o tratamento entre as crianças é igualitário. Já com relação ao comportamento dos pais a situação é outra: “Quando ela dava uma ‘lambreta’ em algum menino, ou então um chapéu ou uma caneta, os pais berravam do alambrado: Caça essa menina!”.
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Tanto talento chamou a atenção do Centro Olímpico, projeto voltado para o esporte de alto rendimento desenvolvido pela prefeitura de São Paulo, e Natália foi chamada para integrar o quadro de atletas. Durante três dias por mês ela viaja com a mãe para a capital paulista para participar dos treinos de futebol de campo com meninas. Em Florianópolis, passou a treinar também na Fair Play, escolinha do Avaí, dividindo o gramado sintético com meninos de idades entre 10 a 12 anos.
A contratação no Avaí e a força do futebol feminino
A contratação da talentosa jogadora no Avaí é uma vitória para o futebol feminino e representa um marco para as meninas. É quebrar paradigmas, desafiar pensamentos retrógrados e provar que sim, lugar de garota é onde ela quiser. O reconhecimento do talento de Nati num “campo” eminentemente masculino pode ser o início para os clubes pensarem a importância da formação e desenvolvimento de categorias de base femininas, algo ainda distante – já que é um esporte que investe muito pouco ainda nas mulheres – mas possível.
Uma garota jogar bola é desafiar toda uma construção social e Nati, com seu talento e persistência, junto ao apoio irrestrito dos pais, mostra que é possível romper barreiras e ocupar espaços.
“Se a gente fosse falar um tempo atrás de uma menina jogando na base de um time profissional masculino, isso era algo completamente impossível de acontecer. Hoje pode, porque a Nati chegou lá”, afirma a mãe.
O coordenador geral das categorias de base do Avaí, Diogo Fernandes, enalteceu as qualidades que fizeram o clube contratar a jogadora: “Ela tem grande potencial e foi aprovada por isso. Não por ser mulher, mas pela qualidade, pelo destaque, o que é muito bom para ela e também para o Avaí”, afirmou em entrevista ao site oficial do Avaí. Segundo ele, Nati tem um bom espaço de aprendizado até os 13 anos, quando terá que atuar em equipes femininas, conforme indica a legislação.
A menina do laço sonha em seguir os passos da jogadora Marta, eleita seis vezes a melhor do mundo pela Fifa e para as garotas apaixonadas por futebol, Nati ressalta que é necessário treinar bastante. Ela acredita que com muito treino, todas as meninas podem encontrar um time para jogar e que em breve haverá muitos times femininos e campeonatos de meninas.