Essa é a terceira edição do Conversa Avessa, uma publicação que une poema, artes visuais e ativismo para abordar práticas cotidianas que retroalimentam a violência contra as mulheres. Foi construído a partir de um chamado feito pela Abrasabarca a poetas e artistas visuais.
Alice Souto, Camila Soato, Amanda Vital e Ti Ochôa são as artistas convidadas desta segunda edição do Conversa Avessa, suplemento mensal sobre violência de gênero organizado pela coletiva Abrasabarca, e publicado pelo Portal Catarinas.
Nesta publicação, o Conversa Avessa traz o poema de Alice Souto “Não chegou a machucar” que revela como a naturalização da violência acontece nos detalhes cotidianos.
“Não chegou a machucar a frase estala dentro da cabeça na hora do sexo. É só o meu fetiche – ele disse. Toda mulher gosta. Está tudo bem. Se não chegar a machucar [mas machucava]”, escreve Alice Souto em seu poema.
Já em “tio”, a artista Amanda Vital descreve o desespero infantil para fugir dos abusos durante as férias de verão. “Esquivar-se das mãos: esquivar o corpo para os lados, correr em torno da mesa da sala, imaginar que aquela volta volta era a última, segurar o choro no abraço obrigado”, escreve Vital.
A publicação conta ainda com a obra visual de Camila Soato.
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O assassinato de mulheres trans e travestis no Brasil embasa o poema de Ti Ochôa. A escritora dá nome às vítimas e contabiliza as mortes de mulheres trans e travestis em 2019 divulgadas no Mapa de Assassinatos produzido pela ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais). “São 110 travestis e mulheres trans. 110 corpas brutalmente assassinadas. 110 corpas ceifadas pela lâmina do ódio só em 2019”, escreve.
POÉTICAS DA CONVIVÊNCIA
A parceria entre Abrasabarca e Portal Catarinas começou há quatro meses com a série “Poéticas da convivência” que integra poemas sobre a rotina e reflexões suscitadas pelo isolamento social. A ideia de elaborar um suplemento inicialmente sobre a violência doméstica por meio da linguagem poética foi motivada pelo aumento da vulnerabilidade das mulheres durante a quarentena.
“A nossa dinâmica de criação passa pela escuta, pergunta lançada, saraus públicos em comunidades. A coletiva tem essa caraterística de agregar, compartilhar, e o exercício da poesia, escrita, passa por isso, então tem muito a ver com o que acreditamos, esse é mais um espaço para escuta, assim como a série Poéticas da Convivência”, afirma Lu Tiscoski, também da coletiva.
O monitoramento nacional da violência doméstica feito colaborativamente entre o Portal Catarinas em parceria com quatro mídias independentes também contribuiu para expandir o tema à narrativa poética.
A Abarsabarca surgiu de reuniões informais para ler poesias entre colegas da pós-graduação em Literatura da UFSC. Desde 2015, essas mulheres se integram na coletiva, articulando saraus, produção de publicações, como o “Abrasabarca”, em 2018, e o “Revoluta”, em 2019, além da participação no programa Quinta Maldita que promove saraus e outras ações culturais. Leia as colunas dessas poetas no Catarinas.