Histórias fazem parte da 3ª temporada da websérie ‘Confessionário – Relatos da Casa’
veiculada no YouTube

Dor. Vergonha. Desespero. A agressão sexual vandaliza a intimidade da vítima. Transtorna a ponto de muitas optarem por não lidar mais com as lembranças e tentarem apagá-las. Já a atriz porto-alegrense Tânia Farias, 45 anos, decidiu desafiar o trauma de um estupro coletivo falando dele. A experiência será contada no episódio de estreia da 3ª temporada da websérie “Confessionário – Relatos de Casa”, veiculada no YouTube.

A atriz afirma que o que a leva a compartilhar essa experiência é o desejo de que isso não ocorra com nenhuma outra mulher.

“É realmente uma experiência que te atravessa, te marca, te invade de uma maneira complexa e difícil. Mas eu acredito que contar, trocar é parte da cura”, observa Tânia, que também relata o episódio no espetáculo teatral Desmontagem Evocando os Mortos – Poéticas da Experiência, da Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz.

O compartilhamento de dramas pessoais de violência sexual não foi uma opção exclusiva de Tânia. Nessa terceira temporada de Confessionário, dos nove episódios, cinco trarão relatos reais das atrizes. Nas duas primeiras temporadas, a maioria das atrizes convidadas interpretou histórias verídicas de violência doméstica e de gênero. Porém, os idealizadores e realizadores da websérie – a atriz e diretora Deborah Finocchiaro e o cineasta Luiz Alberto Cassol – deixaram sempre em aberto a possibilidade de elas relatarem suas próprias vivências. Só na segunda temporada, duas atrizes se sentiram confortáveis a relatá-las.

Incentivo a reação

A atriz Suzete Martinez, 61 anos, reconhece que revelar publicamente o relacionamento abusivo não foi uma decisão fácil.

“Até o último segundo eu não sabia se eu ia colocar um nome no personagem ou se eu ia admitir que estaria falando sobre mim. Aí, no fim, pensei: ‘É preciso falar’. Estamos vivendo um momento muito perigoso para a mulher. Como vivi em cárcere privado por sete meses, achei que era muito importante mostrar que a violência doméstica tem cara e nome, pode acontecer com qualquer pessoa. Porque em uma linguagem de vídeo ou de teatro, quando alguém está vivendo um personagem as pessoas tendem, mesmo inconscientemente, a achar que é ficção”, analisa.

Suzete casou-se, apaixonada, aos 16 anos, e deixou a Santana do Livramento natal para viver com seu amor em Porto Alegre. A cidade grande e o ciúme doentio do companheiro, porém, revelaram-se uma prisão triste, dolorosa e solitária. Atriz crê que as mulheres de hoje têm mais informação e condições de reagir, mas que é preciso incentivá-las.

“Eu apanhei na rua, no meu prédio, na minha porta. Nunca ninguém foi me resgatar. Hoje, se alguém ouve um ato de violência tem de ajudar. É obrigação de nós mulheres, de quem é resistência, falar, denunciar”, afirma a atriz.

Tânia Farias lamenta que diante dos números de feminicídio, estupro e violência contra a mulher, esses crimes ainda sejam invisibilizados e banalizados. Por isso, diariamente, e não só no Mês da Mulher, a proteção de sua integridade deve ser prioridade.

“Estupros, violência contra a mulher acontecem o tempo inteiro. É muito triste e trágico que existam tão poucos mecanismos de combate a isso. É preciso denunciar, não podemos mais nos calar. todas nós que conseguimos compreender isso, temos de usar a nossa voz. Ninguém melhor que nós mesmos para colocar essa narrativa. O preço que a gente paga para ter uma sociedade livre da cultura do estupro é essa exposição”, diz a atriz.

Violência na pandemia

A primeira temporada de Confessionário estreou em agosto de 2020, quando estatísticas já apontavam que o confinamento gerado pela pandemia elevara os índices de violência doméstica no país. Em 2020, o Ligue 180 e o Disque 100 – canais para denúncia de violações de direitos humanos do governo federal – receberam 105.821 queixas de violência doméstica. Em média, 290 casos por dia.

Durante o ano de 2020, o Portal Catarinas monitorou a violência doméstica na série “Um Vírus e Duas Guerras”. Leia mais:

A ideia do projeto, segundo Deborah, é estimular as mulheres a se livrarem da culpa e do medo e a denunciar os agressores. Ao fim da maioria dos episódios, a advogada Gabriela Ribeiro de Souza, especialista em direito da mulher, presta informações sobre tipos de violência, formas de denunciar entre outras informações úteis.

A pandemia também determinou a forma com que a websérie seria feita: tudo à distância. Diretores, atrizes e equipe técnica trabalham cada um de suas casas e as dificuldades inerentes ao uso de internet acabam sendo admitidas como linguagem audiovisual.

“Gravamos de forma remota, assumindo as oscilações da internet, pois buscamos gravar o real e a verdade de cada atriz em seus episódios”, diz o cineasta Luiz Alberto Cassol, codiretor da websérie.

A terceira temporada de Confessionário – Relatos de Casa é realizada com recursos da Lei nº 14.017/2020 – Aldir Blanc.

Confessionário – Relatos de Casa

Quando: Segundas e quintas-feiras, às 19h, no Canal do Confessionário no YouTube
Terças e sextas-feiras, 19h, no IGTV Instagram e Facebook

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