“Eu não sabia que tinha tanta preta linda assim em Floripa”, falou Cristiane Mare da Silva ao começar sua fala a um público predominantemente de mulheres negras que participaram do IVº AfroDivas, no último sábado (26). O evento é organizado pelo Coletivo Pretas em Desterro e neste ano teve um palco especial, o Museu da Escola Catarinense. O antigo prédio era a sede da Escola Normal Catarinense, local onde se formou a professora Antonieta de Barros, primeira negra a assumir um mandato de deputada estadual de Santa Catarina, em 1935.
Assista a transmissão ao vivo, feita pelo Portal Catarinas, da apresentação de Solange Adão e do desfile do estilista Modou Kara.
Além da importância do espaço em que circularam dezenas de mulheres negras, o Papo das Pretas foi o que deu o tom da atividade. A importância da união das mulheres para enfrentar o racismo diário foi materializado através de um bloco de anotações e uma caneta que circulou entre as participantes. A ideia, proposta por Cristiane, foi que cada uma colocasse o seu nome e número de telefone. “A gente não precisa mais viver como uma preta sozinha, temos um exército de pretas aqui, imagine se a gente cobrar pelos nosso direitos juntas?”, questionou.
O tema da saúde da mulher também entrou no papo, a enfermeira Cláudia Prado da Rosa, uma das organizadoras do encontro, falou do aumento do número de HIV entre as mulheres negras. Ela orientou sobre os cuidados que as mulheres precisam ter e da dificuldade de acesso às políticas públicas das populações negras. Ela que trabalha em hospital público que atende exclusivamente pacientes do SUS e se espanta com o número baixíssimo de pacientes negros que se internam lá. “Onde estão nossas pretas e pretos, se a maioria da população negra só acessa o SUS?”, ressalta Cláudia.
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A mesma observação foi feita pela cirurgiã dentista, Renata da Rosa. De acordo com ela, as mulheres negras não recebem as mesmas orientações que as mulheres brancas. “Nós não temos acesso à saúde bucal, temos uma calcificação maior, nossos dentes demoram mais a cair, mas a gente não recebe uma orientação sobre nossas especificidades”.
Com a valorização crescente da beleza afro-brasileira, o debate de empoderamento é forte entre as mulheres. Nesse contexto, a arte-educadora Gisele Marques ressalta o papel da mulher empreendedora, para ela empreender não é só uma visão de comercialização, mas de transformar o meio que se vive. “A miss Brasil também é uma empreendedora. Quando uma mulher negra vai representar uma nação, ela mexe no meio em que se vive. Quando uma mulher negra ascende, ela balança uma estrutura da pirâmide, da qual ela, nós somos alicerce”. Gisele destaca que as mulheres precisam movimentar essa pirâmide para que um dia ela desmorone e haja um novo recomeço
“Quando uma mulher negra atravessa a passarela no atual contexto, o salto alto é mais do que mero capricho, é um direito adquirido para que pudesse calçar sapatos”.
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O encontro acontece desde 2015 e surgiu como uma das atividades de mobilização para a Marcha de Mulheres Negras, que aconteceu em novembro do mesmo ano. Já o IIº AfroDiva aconteceu às vésperas da Marcha e foi também um orientador para as ações futuras. A terceira edição aconteceu em agosto de 2016, no Museu Histórico de Santa Catarina.
A atividade que está na quarta edição e ganhou mais adeptas. Além do papo entre as mulheres, o AfroDivas é marcado pela valorização da beleza negra. Enquanto o papo rola, mulheres fazem penteados de cabelos, outras se maquiam, algumas aprendem novas técnicas de enrolar o turbante em suas cabeças, roupas e acessórios são vendidos por empreendedoras que valorizam a cultura afro. Cristiane ressalta que a atividade é um momento de compartilhamentos, de luta antirracista e de afetividades. “Que a gente olhe para as pretas que estão aqui e veja como somos lindas. Que esse carinho e cuidado se prolongue e que possamos ter esse cuidado umas com as outras. Falamos tanto das violências que vivemos, que as vezes falta um pouco de carinho, de olhar nos olhos e dar apoio”.