Medalhista paralímpica, Josiane Lima, conhecida como Josi do Remo, de 49 anos, é candidata a vereadora em Florianópolis (SC) pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB). Mulher branca, cisgênero, lésbica e com deficiência física, Josi se destaca por sua trajetória no esporte e agora busca uma atuação política voltada para a inclusão e a diversidade.
Josiane é a terceira candidata a responder ao questionário proposto pelo Catarinas para divulgar as candidaturas comprometidas com a agenda política feminista, antirracista, LGBT inclusiva e anticapacitista em Santa Catarina. As entrevistas são publicadas diariamente, seguindo a ordem de envio. Devido ao grande número de respostas recebidas, o portal publicará mais de uma entrevista em alguns dias.
O questionário foi dividido em cinco eixos temáticos, abordando questões centrais para a análise das candidaturas:
- Perfil
- Apoio e financiamento
- Propostas
- Políticas públicas inclusivas e enfrentamento de discursos reacionários
- Violência política e desinformação
Acompanhe a entrevista com Josi do Remo
Perfil
Resuma sua trajetória de vida/militância e o que a motivou a disputar estas eleições.
Formada no Magistério, professora de Educação Física, tecnóloga da Informação e pós-graduada em Administração e Marketing Esportivo. Sempre estudei em escola pública, trabalhando e treinando diversos esportes. Nasci no Sambaqui em 25/02/1975, no bairro de pescadores de Floripa, comecei a vida no mar ainda bebê. Aos 4 anos de idade, minha mãe era funcionária pública e sem creche na época, já ia para pesca com o pai e cresci com minha irmã e irmão na pescaria do camarão, até os 14 anos quando comecei a trabalhar na pró-menor.
Participei do movimento estudantil na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) com eleições no Centro Acadêmico e Diretório Central dos Estudantes. Aos 28 anos, após um grave acidente de moto onde quase perdi a vida, sobrevivi graças ao resgate dos bombeiros e ao SUS e me tornei pessoa com deficiência por conta das lesões e da paralisia na perna esquerda. O remo foi me apresentado em 2006 como terapia e qualidade de vida. Me destaquei já no primeiro ano de competições e, no ano de 2008, me tornei a única medalhista em Jogos Olímpicos e Paralímpicos da história do remo do Brasil, com o bronze de Pequim, a “joia do remo do Brasil”.
Sou atleta com 4 ciclos olímpicos pelo Brasil, nas edições da China 2008, Londres 2012, Rio 2016, e Tóquio 2020. Fui campeã mundial 2007 na Alemanha, prata e bronze em mundiais, na Polônia em 2009 e na Holanda em 2014. Medalha de ouro e 3 pratas em copas do Mundo, nas edições de Itália 2023, Belgrado 2012, Itália 2015 e Áustria 2018. Por cinco vezes fui campeã mundial de Remo no campeonato Indoor em Boston EUA, em 2011, 2013, 2014, 2015 e 2017.
Casada há 15 anos com Mariana que é Assistente Social, servidora municipal. Em 2020, fui eleita membro da Comissão Nacional de Atletas da Confederação Brasileira de Remo – CBR. Eleita presidente do Conselho de Ética, fiz importante campanha nacional de enfrentamento do assédio e violência no esporte, esporte antirracista e de antidoping, iniciativa inédita nas confederações esportivas brasileiras.
Meu campo agora é político! Diante de tanta corrupção na prefeitura, com secretário de esporte, com outros, preso pela polícia civil por desvio de recursos públicos do esporte, da cultura, do samba, da Fenaostra, da Floram, da coleta de lixo, roubo até de entidade de apoio às pessoas autistas! O dinheiro público desviado não chega na ponta, nas pessoas que mais precisam. Do jeito que está não pode continuar, é insustentável.
Eu sei das dificuldades do caminho das conquistas, das vitórias, e quero conquistar o direito de votar nas decisões sobre o futuro da nossa cidade, porque quero justiça e ser apoio para o futuro da nossa juventude para uma Floripa Sustentável e mais feliz.
Política pública tem que ser para melhorar a vida do povo, para promover justiça social, com diversidade e respeito às diferenças, para a inclusão, dos manezinhos e moradores, das mulheres, para promover igualdade de gênero e justiça para o povo negro, para a comunidade LGBTQIAPN+, pessoas PcD, povos indígenas, e principalmente para quem mais precisa de apoio. Minha causa é coletiva!
Por tudo isso sou candidata a vereadora para ter voz e voto na Câmara Municipal.
Quais personalidades políticas são suas referências?
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), presidenta Dilma Rousseff, Erika Hilton, Fabiano Contarato, Ideli Salvatti, Samia Bonfim, Tábata Amaral, Gleisi Hoffmann, Simone Tebet, Barack e Michelle Obama, Kamala Harris, Luiza Erundina, Padre Lancelotti, Pastor Henrique, Mariele Franco, Maria da Penha, Joana D’arc, Cecília Meirelles, Simone de Beauvoir, Coco Chanel, Katherine Johnson, Angela Davis, Djamila Ribeiro, Pedro Serrano, Marcia Tiburi, Maria da Conceição Tavares, Antonieta de Barros, Anita Garibaldi, Cleópatra, Renato Freitas, Rosa Weber, Flávio Dino, Alexandre de Moraes e Carmem Lucia.
Apoio e financiamento
Você tem conseguido verba para a campanha? Quais?
Sim: recurso escasso do fundo partidário.
Você enfrenta desafios para arrecadar os recursos necessários para sua campanha? Se sim, quais são os principais?
Sim. Não me sinto bem para promover vaquinha online.
Qual é a importância do financiamento coletivo para a viabilidade de sua candidatura?
Importantíssimo, pois os recursos do fundo eleitoral são insuficientes para levar a campanha para a rua, para poder dar ajuda de custo para quem for dedicar seu tempo nas caminhadas e panfletagem, para as bandeiradas, divulgação e impulsionamento digital, marketing etc
Propostas
Quais são os principais temas a serem debatidos no município e suas propostas para cada um?
Quero ter direito de voz e voto como vereadora na câmara municipal, para cobrar, com energia, os outros vereadores para gente fiscalizar, investigar, fazer CPI e instaurar uma Comissão Permanente de Combate a Corrupção, para coibir esse tipo de prática que está impregnada na prefeitura, e os atuais vereadores fazem de conta que não aconteceu nada! Há uma completa omissão na câmara municipal, e a maioria dos candidatos nem toca nesse assunto.
Tô aqui para lutar com a mesma garra e determinação, que me levou a ser campeã Mundial, medalhista paralímpica e ter quatro ciclos olímpicos pela seleção brasileira de remo. Vou dar meu sangue e meu suor por nossa Floripa, para combater a corrupção.
Minhas propostas são: dar força para o esporte, saúde e educação; escolas abertas fim de semana para atividades de esporte, cultura e lazer; apoiar os conselhos comunitários dos bairros; cobrar concurso público para valorizar nossos servidores e melhorar o atendimento dos serviços públicos para a população; atuar pelo passe livre; fiscalizar para ter professores auxiliares em sala e para ter assistentes sociais e psicológicos/as nas escolas e creches; creches e escolas em tempo integral; ampliar o atendimento nos postos de saúde; fazer um centro de referência para pessoas autistas.
Também, contratar através do programa Mais Médicos as equipes de Saúde da Família; contratação de mais agentes de saúde, profissionais de enfermagem, de farmácia etc; preservar o meio ambiente e pôr na pauta o debate sobre políticas climáticas, gestão de resíduos e economia verde; trazer segurança e bem-estar social, para mulheres, para o povo negro, para a Diversidade da comunidade LGBTQIAPN+, pessoas com Deficiência, povos originários e pessoas em vulnerabilidade social.
Minhas pautas são progressistas, antirracista, anti-homofobia, feminista antifascista.
Quem forma sua base eleitoral? Quais são suas mensagens centrais? E seu slogan de campanha?
Minha base eleitoral é no Sambaqui e em Santo Antônio de Lisboa. Josi do Remo, atleta medalhista paralímpica, para dar força para o esporte, saúde e educação e fortalecer os conselhos comunitários nos bairros.
Tem propostas para promover a igualdade de gênero, LGBTQIA+ e racial no âmbito municipal? Se sim, quais?
Sim. Vou trabalhar para garantir os direitos através das jurisprudências do Supremo Tribunal Federal, garantindo a educação de gênero e orientação sexual na rede de ensino, para proteção de meninas, mulheres e pessoas LGBTQIAPN+, educação de combate ao racismo, à homofobia, bullying, machismo e masculinismo.
Vou atuar para proteção integral da comunidade LGBTQIAPN+; fortalecer as ações em saúde e segurança especializada para o atendimento de pessoas transgênero que tem maior risco de violência e morte; fortalecer e qualificar profissionais para o acolhimento no ambulatório Trans, nas Delegacia de Proteção à Criança, Adolescente, Mulher e Idoso (DPCAMI), nos Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) e Centro de Atenção Psicossocial (CAPS).
Criar políticas habitacionais e de acolhimento em casas de passagem específicas para pessoas LGBT+; realizar campanhas educativas sobre o direito de acesso de pessoas transgênero aos banheiros públicos com placas e cartazes em todos os banheiros públicos; realizar educação de gênero, ensino sobre gênero e orientação sexual nas escolas, que é direito constitucional com jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF).
E, principalmente, colocar a parada da diversidade no orçamento anual da prefeitura, incluir na Lei Orçamentária Anual (LOA) do município, que é aprovada na Câmara Municipal de vereadores todo ano, e garantir de forma permanente a realização da Parada da Diversidade em todos os anos. Com todo apoio e estrutura fornecida pela prefeitura. Incluir a pauta LGBT+ na LOA é fundamental!
Você tem propostas relacionadas à política do cuidado? Se sim, quais?
Sim. Políticas para a garantia dos direitos fundamentais da pessoa humana, direito à vida, a proteção integral de saúde física e mental, direito à moradia, acesso à educação, cultura, lazer, esporte e meio ambiente saudável, livre, universal, gratuito e de qualidade. Minha pauta é progressista!
Políticas públicas inclusivas e enfrentamento de discursos reacionários
Como pretende enfrentar discursos reacionários que comprometem a equidade de gênero e racial, especialmente na educação?
Com enfrentamento no debate político racial e de gênero, com ciência, conscientização, educação e, principalmente, com a participação popular.
Como avalia a participação da sociedade civil na construção de políticas públicas municipais?
O pensamento neoliberal individualista desmobilizou o senso das lutas de classes socioeconômicas e de convívio social nos bairros e comunidades. As Crianças e a juventude são as maiores vítimas dessa mentalidade política neoliberal, consumista e capitalista, que destrói o meio ambiente e a saúde física e mental das pessoas humanas, principalmente das gerações mais jovens que não puderam brincar na rua com os amigos e amigas, subir em árvore, brincar na praia, tomar banho de mar com água limpa, andar livremente pelas ruas da cidade sem sentir medo. O neoliberalismo, através do consumismo voraz, é nefasto e insustentável para o meio ambiente e para a vida humana plena.
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Sua plataforma propõe formas de ampliar a participação da sociedade civil na construção de políticas públicas? Se sim, como?
Sim. Quero fortalecer os conselhos comunitários, e as organizações do terceiro setor, recuperando o caráter de instituição “privada” sem fins lucrativos de interesse público, recuperar a pessoa jurídica, certidões negativas etc, para terem seus CNPJs em conformidade; realizar a qualificação das lideranças para promoverem projetos de interesses sociais para buscar leis de incentivo e financiamentos, públicos e privados, de organizações nacionais e internacionais para desenvolver atividades sociais, ambientais, de educação, saúde, arte e cultura, esporte e lazer, para acesso livre gratuito e de qualidade de convivência nas comunidades, aumentando o índice de desenvolvimento humano na cidade.
Muitos conselhos comunitários estão com dívidas de IPTU, e vou fazer um projeto de Lei para isentar o IPTU e a taxa de coleta de resíduos sólidos de todos os conselhos comunitários da cidade; organizar administrativamente os conselhos comunitários para poderem atuar com força deliberativa para suas demandas entrarem no orçamento do município através da Lei Orçamentária Anual.
Qual o papel das minorias políticas na transformação dos serviços de saúde e educação municipais?
Mulheres, pessoas pretas e pardas são maioria da população. O termo ”minorias”, é utilizado da perspectiva dos políticos homens brancos ricos heteronormativos dentro dos espaços de poder de decisão dos poderes legislativo, judiciário e executivo. Eles podem ser maioria nesses espaços, mas não são na população.
A sociedade civil organizada das mulheres e povo negro, junto as demandas da comunidade que estando organizadas unidas formam absoluta maioria, que vem empurrando o progresso no mundo com muito mais rapidez.
Os Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Paris 2024 são exemplos desse progresso, com pela primeira vez na história com a igualdade de gênero, com o mesmo número de provas femininas e masculinas. Há poucas décadas, as mulheres nem podiam participar de corridas de rua. Em Paris também foi a maior participação de negros e pardos, maior participação de pessoas LGBTQIAPN+, de povos originários, de países africanos e do oriente médio, apesar das crises humanitárias causada pelas guerras na Ucrânia, da Palestina, Faixa de Gaza, Afeganistão e Síria.
As minorias políticas são essenciais para a transformação dos serviços públicos, atuando para pressionar o progresso com a inclusão e equiparação de direitos para a garantia dos direitos universais da dignidade da pessoa humana para toda diversidade de pessoas.
Para isso, é necessário eleger pessoas representantes legítimos para os poderes do estado comprometidas em defender esses direitos com a especificidade de demandas de cada grupo específico: mulheres, povo preto, LGBTQIAPN+, povos originários, idosos, pessoas com deficiência, pessoas em situação de rua e de violência, pessoas em vulnerabilidade social em situação de pobreza, fome e miséria…
Estas pessoas precisam estar no centro do debate político para a realização de políticas públicas principalmente de combate à fome, por moradia digna e saúde plena para a proteção integral da preservação da vida.
Violência política e desinformação
Já sofreu ataques, incluindo intimidação, durante a sua trajetória devido à sua agenda política? Em caso positivo, pode compartilhar algum caso?
Sim. Agressões físicas e psicológicas ao longo da vida inteira, desde a infância, por ser uma criança queer. Minha vida escolar sempre foi de briga na escola para me defender dos ataques homofóbicos, nunca foi bullying, sempre foi homofobia e eu nem sabia o motivo pelo qual. Sempre, alguém implicava comigo, alguém me ofendia e eu ia lá e enfrentava, brigava, batia mesmo, de rolar no chão, coisa de criança da época…
Minha mãe diz que me mandava toda bonitinha de saia de prega do uniforme, cabelinho arrumadinho, e eu voltava toda desbragada, sem botão, roupa rasgada com sangue etc. Só lembro a cara do meu pai e da minha mãe sempre que eu chegava em casa depois de uma briga. Algumas mães reclamavam que eu batia no filho delas, mas eu me defendia das ofensas desse jeito. Chamava de “machorra”, eu ia lá e batia.
Lógico que isso me atrapalhou na escola, e quando fui para a quinta e sexta série, reprovei por meu desenvolvimento de ensino e aprendizagem ser prejudicado. Eu não queria mais estar na escola, passei a gazear as aulas e ficar em cima de árvores principalmente, comendo jabuticaba e outras frutas. Depois, com a ajuda da minha mãe que foi estudar comigo no antigo supletivo, eu recuperei a 5ª e a 6ª série no mesmo ano, estudando na mesma sala com a minha mãe. Após, eu voltei para a minha escola em Santo Antônio e segui o ensino normal e a minha mãe concluiu o primeiro grau até a 8ª série.
Quando eu tinha cerca de 16 anos, fui atacada na rua pois eu tinha cortado o cabelo mais curto, e tive que literalmente lutar na rua por machismo e homofobia. Minha sorte era que eu sempre pratiquei esporte, fiz capoeira e judô, tinha muita força física também porque sempre estava no mar, pescava com meu pai às vezes, sempre nadando e tendo muito contato com a natureza, entrando na mata atlântica preservada para subir os morros para ver o visual lá de cima…. Nesse dia da agressão na rua, consegui me defender, e logo vieram outras pessoas para socorrer. Foi no centro da cidade na esquina da João Pinto, próximo ao Instituto Estadual de Educação.
Na equipe esportiva de remo também, quatro ciclos olímpicos, 18 anos defendendo o Brasil, e como a prova dos jogos paralímpicos na minha categoria era um double skiff PR2 misto, tripulado por um homem e uma mulher, pronto, tava ali estabelecida uma relação de conflito político de gênero. Ao longo da minha carreira, foram mais de dez duplas masculinas que formei no barco, nos jogos paralímpicos foram três duplas, três homens diferentes e com dois deles foi bastante conflituoso, principalmente nos Jogos de Tóquio, onde meu parceiro de barco era bolsonarista, evangélico e, em crise de ansiedade em meio a pandemia, ele com muita dor por lesão neuropática, por sequela de poliomielite, um caos na tragédia da Covid-19 no Brasil, um governo bolsonarista nefasto, negacionista, consciente coletivo violento, esse parceiro de barco foi o mais agressivo de todas as pessoas com quem já trabalhei.
Uma situação que não desejo para ninguém vivenciar… Mas, juntos tivemos duas pratas em copas do mundo, uma medalha de bronze em mundial e competimos juntos dois ciclos olímpicos, do Rio 2016 e Tóquio 2020, toda essa situação ainda estimulada por técnicos que ou não agiram para coibir, ou foram complacentes com o amigão, ouro de um outro atleta da nossa equipe, que quem votava em Bolsonaro, era homem, e os outros votavam no PT… Isso em meio às eleições de 2018. No ano de 2019, eles não gostavam das minhas críticas contra Bolsonaro, pois eu criticava com todos os atletas do Comitê Paralímpico, em grupos de WhatsApp, em razão da extinção do Ministério do Esporte, e principalmente, pelo corte de mais de 3 mil bolsas atletas no valor de cerca de 300 reais por mês, para atletas de base da iniciação esportivas em idade escolar, ao mesmo tempo que fazia a flexibilização das leis de armas de fogo.
Período terrível, tudo isso ocorreu entre 2018 e 2019. Logo depois veio a pandemia, passamos a treinar em confinamento em aparelhos de remo ergômetro profissional, e depois a situação só se agravou. Os jogos de Tóquio 2020 foram transferidos para 2021, e o meu dupla de barco, em completo desequilíbrio emocional, crise de ansiedade, foi um verdadeiro inquisidor, cheio de vaidade e ódio, agindo como a maioria dos homens que eu conheço, aqueles machistas que falam grosso com mulher e fininho com outros homens. Enfim, pena que eu já não era mais uma criança pra brigar na escola.
Minha vivência na vida como esportista de alto desempenho sempre foi desconfortável para mim e para a maioria dos homens que convivi, por ficarem incomodados de dividir os mesmos espaços e ambientes com mulheres, sempre com confronto por conta do machismo e homofobia.
A única forma de conseguir conviver com o mínimo de harmonia é quando a mulher assume postura subalterna, validando e massageando egos masculinos, postura que nunca tive na vida. Sempre fui liderança nas equipes esportivas por conta da minha desenvoltura, aptidão física, coordenação motora e força física, sempre fui reconhecida como liderança nas equipes, e no meu barco também.
Quanto mais o tempo passava, e com a troca frequente de duplas, sempre estava ensinando os fundamentos básicos da remada para meus parceiros de barco, essa questão trazia uma posição invertida nos papéis sociais binários de gênero no barco, eu, a mulher, era a liderança que vinha de forma natural por ter muita experiência com embarcações e ser uma atleta muito bem preparada fisicamente, isso sempre incomodou atletas e técnicos. Toda a mulher que ocupa funções de liderança com machistas predominando na equipe enfrenta, todo dia, provações sem fim.
Nesta campanha, sofreu ataques nas redes sociais ou nas ruas? Se sim, quais?
Sim. Ofensas infantis nas redes sociais com frequência, assédio moral e violência política de gênero frequente, basta que você desqualifique o prefeito, o ex-presidente Bolsonaro e o pensamento bolsonarista, que os haters saem esbravejando como se tivesse ofendido a honra pessoal dessas pessoas que eu nem faço ideia de quem sejam… Fenômeno curioso.
Às vezes hostilidade nas ruas também, sempre de eleitores bolsonaristas. Um dia passei no mercado público panfletando na pré-campanha, e falei, que eu estava em oposição ao prefeito Topázio, principalmente por causa dos escândalos de corrupção, da prisão do Secretário de Esporte, Turismo e Cultura. O pessoal da peixaria duvidou que havia corrupção na prefeitura, perguntei se eles não sabiam, (na verdade fizeram de conta que não sabiam), falei para pesquisar na internet, uma senhora que estava comprando peixe, disse brava: “eu não acredito em você, e eu disse “sou atleta paralímpica, esse aqui é o meu cartão com meu telefone, se a senhora quiser pode me ligar ou me adicionar nas redes sociais que eu explico pra senhora”. Ela olhou meu cartão que tem uma bandeira do Brasil em verde e amarelo, deu pra perceber que aquele símbolo da bandeira brasileira deu um nó no pensamento bolsonarista daquela querida senhora.
Sua candidatura tem sido alvo de desinformação? Se sim, como?
Sim. Nas redes sociais os ataques de bolsonaristas são para desinformar, promover mentiras com fake news para confundir os fatos. É ação deliberada e estratégica dessa gente ruim.
Tem ações específicas para combater a desinformação? Se sim, quais?
Sim. Eu uso filtros do Instagram para impedir comentários rudes, de baixo calão, para evitar baixaria. Respondo um a um os comentários, sempre que possível. Se tem alguma fake, eu mostro fontes confiáveis. Procuro sempre desmentir, questionar se a intenção da pessoa é desviar o foco do assunto. Muitas vezes é perceptível a intenção de desinformar para mudar o assunto, principalmente quando o assunto é o negacionismo e a corrupção nas prefeituras do estado de Santa Catarina.
Eu procuro responder ou acusar com rapidez a pessoa que está promovendo assédio moral, crime de violência política de gênero etc.. Daí denuncio e bloqueio. Quando a pessoa é muito chula, com linguagem vulgar, eu denuncio de prontidão e bloqueio, pois não há condição de diálogo. Isso me toma muito tempo, pois como não tenho equipe, e não tenho fundo partidário que me dê condições de transitar pela cidade, muito menos para contratar uma profissional para gerenciar as redes sociais, nem para contratar pessoas para panfletar, quase tudo gerenciado por mim, acabo não conseguindo postar conteúdo da forma como gostaria, e nem fazer campanha na rua da forma com gostaria. Procuro ir a eventos de agenda, pois custa caro andar pela cidade, gasolina, alimentação básica etc.
É completamente desigual a força do capital econômico nas eleições, que segrega predominantemente pessoas do campo político progressista, onde justamente estão as candidaturas que defendem os direitos universais da dignidade da pessoa humana, onde estão os defensores dos direitos das populações em riscos e vulnerabilidades sociais, onde estão as pautas das demandas de quem mais precisa de políticas públicas para a promoção do bem estar social pleno.