Esta mensagem cabe perfeitamente aos tempos difíceis que enfrentamos, hoje, com pandemia, ciclone, desemprego, ameaças à democracia, total desgoverno, sem ministros em duas das principais pastas que são a Saúde e a Educação, fake news se sobrepondo à ciência, casos graves de violência policial principalmente contra negras e negros, e por aí vai. Diz assim: “Não será a tristeza do deserto presente que nos roube as perspectivas dum futuro melhor (..), onde as conquistas da inteligência não se degenerem em armas de destruição, de aniquilamento; onde os homens, enfim, se reconheçam fraternalmente. Será, contudo, quando houver bastante cultura e sólida independência entre as mulheres para que se considerem indivíduos. Só então, cremos existir uma civilização melhor.” Muitos não sabem quem o disse, mas a autora deste pensamento deveria ser tão reconhecida quanto os grandes heróis do nosso País.

Estou falando de Antonieta de Barros, cujo nascimento completa 119 anos neste dia 11. Catarinense, mulher, negra, professora, jornalista, política, primeira mulher eleita deputada em SC e primeira negra eleita deputada no Brasil. Órfã de pai e filha de uma mulher escravizada e liberta, Antonieta aprendeu a ler e escrever na pensão para estudantes que a mãe improvisou em casa para sobreviver. Conseguiu se formar professora, fundou um curso de alfabetização na própria casa, uma revista semanal e escreveu um livro, o Farrapos de Ideias, que assinou com o pseudônimo de Maria da Ilha.

Deputada Antonieta de Barros em posse do parlamento catarinense em 1935/Foto: acervo da família da deputada

O Brasil em que Antonieta fez tudo isso era um país em que mulheres não podiam sequer votar, o que revela ainda mais a coragem e a luta desta mulher negra que fez história na política nacional. Mas chega a ser espantoso constatar que na Santa Catarina de 2020 as três causas da vida e luta de Antonieta permanecem ainda a serem alcançadas: educação para todos, valorização das vidas pretas e emancipação da mulher.

Precisamos promover sua trajetória, todos nós que ansiamos por equidade racial e de gênero, por liberdade de expressão e por educação de qualidade como meio de mudar e melhorar as nossas realidades.

Ao longo da minha trajetória como deputada estadual, tenho buscado honrar Antonieta de Barros. Sobre a minha existência social como mulher e deputada, não é demais dizer que “eu sou”, porque “ela foi” antes de mim. Por isso, sou autora do projeto de lei que pretende incluir no currículo escolar a história de mulheres como Antonieta de Barros. E, mais recentemente, fui a autora da emenda que garantiu ao antigo prédio da escola que leva seu nome, no centro da Capital, vir a se tornar o Centro de Memória e Cultura Negra de Santa Catarina, quando for, enfim, reformado.

Conto ainda uma experiência pessoal marcante que vivenciei no carnaval deste ano: atravessei a passarela Nego Quirido cantando o samba-enredo da Consulado no qual a grande homenageada foi Antonieta. A pele arrepiou ao entoar “Anda, vai juntar os farrapos, Ensinar aos sem-trapos Conquistar os direitos!” Não foi apenas um samba-enredo cantado na avenida. Foi um compromisso reafirmado com aquela que muito me inspira e muito nos orgulha. Hoje, trazendo presente nossa grande Antonieta de Barros, acredito que este gesto, que também é político, dá conta de renovar em nós uma esperança. “Asfaltos e morros verão renascer milhares de Antonietas, provando que o povo também tem poder.” O Povo também tem poder. VIVA ANTONIETA!

Luciane Carminatti é deputada estadual de Santa Catarina pelo Partidos dos Trabalhadores (PT).

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    Luciane Carminatti é professora e deputada estadual de Santa Catarina. Atualmente é líder da bancada feminina e presiden...

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