Por Linete Martins.

Mulheres que vivem em épocas e universos diferentes, mas empoderadas. São as personagens que a atriz Andrea Buzato interpreta em dois longas lançados esta semana no Brasil – “Os Senhores da Guerra” (direção de Tabajara Ruas) e “Lua em Sagitário” (direção de Márcia Paraíso). Apaixonada pela atuação em cinema, Andrea fala nesta entrevista exclusiva ao Portal Catarinas sobre sua arte, no momento que, como ela mesma diz: “Não aceitamos mais mentiras e nem mediadores vendidos, porque a democracia veio com a internet e não vai mais embora”.

-PORTAL CATARINAS – Andrea, você participou de duas produções com lançamento nacional agora em setembro. Num dos filmes chegou a ganhar o Kikito de Melhor Atriz Coadjuvante em Gramado. O que representa pra você este momento da sua carreira como atriz?
-ANDREA BUZATO – É um momento de ouro pra mim. Sou formada em Cênicas, comecei minha carreira no teatro, fiz muita televisão também, mas escolhi ser atriz pelo cinema. É uma paixão desde pequenininha. Conseguir fazer cinema no Brasil e ainda estrear duas lindas produções, em um mesmo ano, é um privilégio!

Atriz foi premiada recentemente como
Melhor Atriz Coadjuvante em Gramado/Foto: divulgação

-PORTAL CATARINAS – Nos dois filmes você representa mulheres fortes do sul, que trazem para a cena questões e momentos diferentes da vida no país. Como foi a construção dessas duas personagens? Elas têm algo em comum?
– ANDREA BUZATO – As duas são mulheres fortes do interior do Sul do Brasil, uma letrada e a outra gente bem simples. Em comum, histórias sofridas e o empoderamento no desenrolar das tramas. Um grande desafio na construção das personagens, em ambos os casos, foi o sotaque. Dona Minina é uma mulher do início do século XX, perdeu o marido e os filhos na guerra, uma realidade muito distante da minha. A sorte é que, na época, eu estava em cartaz com a peça Uma Sociedade, inspirada em um conto da Virginia Woolf, o que me ajudou na composição da Dona Minina. Já a Rovena, do Lua em Sagitário, é uma mãe como outra qualquer e eu me inspirei em muitas que conheço pra enriquecer a personagem. O sotaque do Oeste Catarinense misturado com o gaúcho foi bem complicadinho de pegar o tom, não cair no ridículo. Também tive que engordar e envelhecer, com a ajuda, claro, da maquiagem e do figurino. A Márcia Paraíso (diretora) queria que eu engordasse bastante pra parecer uma mama comedora de polenta (risos). A construção também aconteceu no improviso, nas jogadas com meu parceiro de cena, o Chico Caprário e com o olhar sensível da Paraíso que já sabia bem como queria contar essa história.

-PORTAL CATARINAS – Depois de trabalhar no RJ, você escolheu voltar a morar em Florianópolis e, daqui, dar continuidade à carreira. Como é investir na carreira de atriz fora do eixo Rio-São Paulo, onde acontece grande parte da produção na área artística que tem visibilidade nacional?
– ANDREA BUZATO – Pra mim sempre foi impossível viver como atriz aqui em Florianópolis. Eu nunca consegui. Mas já entendi que posso morar aqui, batalhar pelas produções daqui, e quando pintar trabalho lá no eixo Rio-SP eu vou, trabalho e volto pra Ilha. Na real, nunca investi pra valer na carreira de atriz, porque o mercado tá saturado, tem muita oferta e pouca procura e gosto de fazer outras coisas também. Curto dirigir, escrever, enfim, posso sobreviver de outras formas (risos).

– PORTAL CATARINAS – Em entrevista recente, Márcia Paraíso, que a dirigiu em “Lua em Sagitário” falou que, longe do glamour, as mulheres enfrentam no cinema as mesmas dificuldades e preconceitos que em outras profissões. Você, que também é jornalista, como vê essa questão de gênero? Houve avanços?
– ANDREA BUZATO – Houve avanços sim, graças às Deusas! Pra se ter uma ideia da mulher no jornalismo, eu vou voltar no tempo: quando fui chamada pra apresentar o RBS Notícias, em meados dos anos 90. Fui a primeira mulher a ser âncora do jornal das sete da noite e tive que ouvir, antes de ser ‘promovida’ ao posto, que “era melhor colocar no ar outro homem porque as mulheres não tinham tanta credibilidade pra passar a notícia”. Triste, né? E minha imagem era masculinizada no vídeo: cabelos bem curtinhos, estilo Joãozinho, terno de cores sóbrias. Então, acho que melhorou bastante até nesse sentido. Ser mulher não é mole não, em qualquer área, em qualquer parte do mundo.

– PORTAL CATARINAS – Do ano passado para cá, as mulheres fortaleceram e deram visibilidade aos movimentos por direitos e contra a violência. Como você avalia essa luta por empoderamento?
– ANDREA BUZATO – Acredito que conquistamos uma liberdade e temos mais espaço pra falar o que sentimos e como enxergamos o mundo. Esses movimentos de expor intimidades e violências sofridas são de extrema relevância pro nosso fortalecimento como unidade e como grupo. Saber que outras também passaram por isso, que eu também posso me abrir e me curar, criar essa identificação, esse laço só vai trazer mais disciplina e liberdade na nossa luta.  E esse empoderamento passa muito por um olhar de compaixão das mulheres pelas outras mulheres, longe da inveja e da disputa e mais perto do coração e do real sentido do feminino. Temos que nos unir, ajudar umas as outras e seremos mais fortes. Sou positiva quanto ao momento e sinto que essa juventude chega com outra cabeça, outro olhar, outro entendimento disso tudo.

senhores
Dona Minina perdeu o marido e os filhos na guerra/Foto: divulgação

– PORTAL CATARINAS – E com a mudança no cenário político do país, a classe artística mostra bastante engajamento. Em algumas situações, está na vanguarda, a exemplo de outros momentos históricos. Como artista, como você avalia este momento do país?
– ANDREA BUZATO – Os artistas são extremamente necessários em uma sociedade, pra instigar, provocar o debate, estimular os sentidos, descondicionar. Os grandes movimentos sociais acabaram por gerar rico material artístico, justamente pela sensibilidade e comprometimento. Gosto de uma frase de August Rodin, quando ele diz que “o mundo seria um lugar melhor se todos tivessem alma de artista, ou seja, tivessem prazer no que fazem”. Porque nós, definitivamente, não criamos por dinheiro, o que nos move passa longe desse capitalismo selvagem.  Infelizmente, hoje, vivemos um momento triste, uma época de muito ódio e pouca esperança. Por outro lado, é um momento muito importante em que estamos nas ruas, unidos e ativos. Tudo está às claras, explícito, as máscaras caíram e fica mais fácil conhecer o real inimigo e reconhecer quem sonha como a gente. Não aceitamos mais mentiras e nem mediadores vendidos, porque a democracia veio com a internet e não vai mais embora. Cabe a nos saber utilizar com inteligência toda essa tecnologia e usufruir da liberdade conquistada com sabedoria. Bora?

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