Umbral tematiza a solitude e é o quinto videoclipe lançado pela cantora e compositora desde o início da pandemia.
Tatiana Cobbett faz a travessia entre a solidão e a solitude em Umbral, seu mais novo videoclipe do álbum Lá e Cá, que traz as obras criadas a partir dos encontros e descobertas entre Brasil (Florianópolis) e Portugal (Lisboa). O videoclipe pode ser acessado no canal no youtube e o single nas principais plataformas de música.
“Nesta hora de confinamento onde a solidão é quase impositiva, a arte em suas diferentes manifestações têm contribuído para mediar este sentimento e é quando nos percebemos em solitude. No isolamento tenho me encorajado a costurar meus retalhos de vida. Recentemente fiz 60 anos, são 45 anos de estrada, muitos feitos e estou de bem comigo, querendo ainda aprender e sonhar”, revela a cantora e compositora em entrevista ao Catarinas.
Desde que o isolamento social começou em Portugal, a compositora lançou cinco videoclipes, enquanto em toda a sua trajetória foram sete audiovisuais. Umbral é a primeira composição criada logo que ela chegou para fazer de Lisboa sua residência neste Lá e Cá. “É sobre travessia, imigração, resistência, identidade, sobre ser globalizado e nos conectar enquanto ser político”, define.
O videoclipe surge do performático ensaio fotográfico Cara de Meia, em que Tatiana suspende a autoimagem para dar vida ao seu alter ego. A artista plástica Bruna Buniotto foi quem propôs ampliar a proposta do ensaio e transformá-lo em vídeo.
“Essa personalidade em solitude não tem gênero, idade, etnia. Só se realiza em contato com o mundo externo, no limiar da resistência à violência, ao fascismo, à essa opressão da morte sufocante da pandemia. Nela cabem todos os arquétipos, mas também a fuga deles pelo olhar de quem segue os seus passos”, explica.
Os quatro primeiros videoclipes do projeto Lá e Cá são Ultimar, parceria com o músico português Luís Lapa, Inominável com o gaúcho Guinha Ramires, Bem me quer Mal me quer, uma composição da catarinense Ana Paula Da Silva, e Voo com Pedro Loch, parceiro que fixou residência em Lisboa.
Conversamos com Tatiana Cobbett sobre o mais novo lançamento e sua produção artística neste momento de isolamento social. Portugal, onde reside atualmente, determinou recentemente um isolamento social mais rígido.
Catarinas: O que tem feito você apostar na linguagem audiovisual e como tem sido esse processo de produção?
Tatiana Cobbett: Num primeiro momento, como foi o caso de Ultimar gravado em janeiro de 2020, a questão do projeto ser pensado para acontecer in progress e sem determinar onde eu estaria em cada momento do processo, me fez buscar no audiovisual uma maneira de documentar estes enlaces. Logo veio a pandemia e muito rapidamente me ficou claro que a tecnologia disponível como live, entre outras possibilidades, se apresentava como um escape, construindo pontes, conexões sinceras e profundas, então foi natural e imperativo o audiovisual fazer parte desta amálgama Lá e Cá.
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Em Umbral e Voo, os mais recentes lançamentos, você apresenta obras autobiográficas, com certo tom de introspecção e contemplação de si. Os outros trabalhos do álbum seguem essa linha? De que forma essas obras dialogam com o contexto atual da pandemia?
É um pouco cedo para afirmar o tom integral do álbum. É algo que realmente só estará claro, inclusive para mim, quando completar o processo. Mas me voltando para o que já está colocado vejo que SIM todas são referentes ao que estou vivenciando, mas não necessariamente autobiográficas. Posso dar o exemplo de “Bem me quer Mal me quer”( música que ganhei de presente da cantautora Ana Paula da Silva) onde experimentei diversos formatos de interpretação até gravar. Por outro lado, foi esta música que me encorajou a buscar uma forma de usar a tecnologia que me era acessível e produzir o clipe quase que de forma autossuficiente. Já Inominável é pura indignação, eu precisava expurgar o sentimento de impotência ante o caminho que o meu país escolheu pelas urnas, apesar de não estar somente neste sentimento.
O ensaio Cara de Meia tem inspirado os vídeos, especialmente no caso de Umbral que registra as imagens da performance. O que te levou ao alter ego e como você tem vivido ele? Quem é essa personagem colorida, cigana que sai pelas ruas a “performar”?
Quando iniciei meu Projeto Residência — Lá e Cá em 2018, senti a necessidade de encontrar uma persona para experimentar as múltiplas possibilidades que o próprio projeto apresentaria e criar uma identidade com o processo que ainda estou vivenciando. Cara de Meia nasce deste lugar sem representatividade específica, mas que possa significar e/ou ressignificar questões colocadas … o conflito está em todas/os nós.
Como você tem visto a produção artística brasileira e portuguesa neste momento em que as casas, espaços culturais estão fechados?
A hora não é de avaliação. Vivemos tempos sombrios e neste lugar onde a morte é presença ameaçadora e sem culpa, estamos sem face própria. Percebo que cada realidade está buscando ar, a travessia não está sendo fácil. Penso muito na palavra Resistência, entendo que é nela que nos entrincheiramos e sou positiva neste sentido.
Há um contexto de invisibilidade de produções artístico-culturais, intensificado pela urgência da pandemia. Em Santa Catarina, por exemplo, já não havia espaço para cadernos, quadros de cultura antes mesmo da pandemia. Como você tem feito para abrir espaços de divulgação do seu trabalho?
Esta invisibilidade aqui apontada não é pandêmica. Há muito que no nosso estado (pra não querer ir mais longe) o desmanche se constitui e ganha terreno, mas não é sem luta. Acho que o que tenho feito, para além de me unir a voz do geral, é seguir fazendo, estando atenta e atuante.
Como tem sido a recepção do seu trabalho em Portugal?
Portugal não é um país muito grande, mesmo assim falar de receptividade ao meu trabalho nesta totalidade não é o caso. Contudo, na perspectiva de uma artista imigrante, já me sinto abraçada pela cena Lisboeta, feito parcerias potentes e venho encontrando o meu espaço por aqui.
Em Umbral você aborda como tema central a solitude. De que forma tem lidado com a solitude neste período de isolamento social e o que ela tem ensejado?
O lugar comum é a “arte salva”! E nesta hora de confinamento onde a solidão é quase impositiva, a arte em suas diferentes manifestações têm contribuído para mediar este sentimento e é quando nos percebemos em solitude. No isolamento tenho me encorajado a costurar meus retalhos de vida. Recentemente fiz 60 anos, são 45 anos de estrada, muitos feitos e estou de bem comigo, querendo ainda aprender e sonhar.
Que desejos te movem neste 2021?
Tenho sido reticente com o futuro, estou pelo todo dia, um de cada vez e pra todos quero saúde e resiliência.
Ficha Técnica de Umbral:
Música e Voz: Tatiana Cobbett
Violão: Pedro Loch
Guitarra Portuguesa: Bernardo Couto
Baixo: Francisco Gaspar
Arranjo: coletivo
Edição, captação, masterização: Edu Miranta – Sintra/PT
Produção executiva: Tatiana Cobbett e Michel França
Design capa: Kelen Oliveira
Fotos e imagens: Bruna Buniotto