Em uma iniciativa pioneira, Florianópolis se prepara para receber a 1ª Mostra de Artes Inclusiva, um evento que promete não apenas expor talentos, mas também quebrar barreiras e desafiar preconceitos. O Centro Integrado de Cultura (CIC) será palco, nesta sexta-feira, 23 de agosto, de um encontro entre arte, ativismo e inclusão, onde o anticapacitismo estará no centro das discussões. 

1-Mostra-de-Artes-Inclusivas-discute-anticapacitismo-em-Florianópolis
Crédito: reprodução.

Entre os destaques, Ivan Baron, influenciador digital e símbolo de resistência, que conquistou corações ao subir a rampa do Palácio do Planalto durante a posse presidencial em janeiro. A programação também inclui a exibição do premiado filme “Meu nome é Daniel” e o lançamento de uma obra que reimagina a moda sob uma perspectiva inclusiva, com direito a transcrição em Braile e a presença dos coautores. 

A mostra, segundo o produtor Cláudio Rio, é um convite à reflexão e à ação, questionando a hierarquização de corpos e celebrando a diversidade como potência criativa e social.

“O capacitismo leva ao fortalecimento de uma crença falsa de que algumas pessoas são mais capazes do que outras para trabalhar, aprender, amar, cuidar, entre outras coisas”, afirma. 

O termo capacitismo foi adotado no Brasil conforme proposto pela antropóloga Anahí Guedes de Mello, como já era usado em Portugal e na Espanha, a partir da tradução da palavra inglesa ableism. Define a discriminação direcionada a pessoas com deficiência.

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), há 18,6 milhões de pessoas com deficiência no Brasil, o que corresponde a aproximadamente 9% da população.

Programação   

A exibição de “Meu nome é Daniel” abre a Mostra, às 17h. A sessão será acessível (o filme tem legendas descritivas; audiodescrição e Libras poderão ser acessados pelo aplicativo Moviereading (moviereadingbrasil.com.br). O diretor Daniel Gonçalves explica que “Meu nome é Daniel” é o primeiro longa-metragem dirigido por uma pessoa com deficiência a ter lançamento comercial no Brasil. A primeira exibição foi em 2018.

“Eu acho muito legal, porque foi o meu filme, mas acho uma pena que isso tenha acontecido só em 2018. Curtas dirigidos por pessoas com deficiência há mais; mas longa, que é o auge da carreira de um realizador, ainda são poucos”, disse o diretor, que estudou Jornalismo na PUC-Rio e trabalhou por três anos na Rede Globo.

Pós-graduado em Cinema pela Fundação Getulio Vargas, é sócio da produtora SeuFilme, no Rio de Janeiro. Por meio de imagens de arquivo da família e de cenas gravadas para o filme, Daniel compartilha histórias pessoais e reflexões sobre a deficiência. 

Daniel Gonçalves contou que tomou duas decisões técnicas durante a produção para evitar que o filme levasse as pessoas a pensar que a deficiência precisa ser superada, em vez de contribuir para a compreensão de que as barreiras impostas pela sociedade é que precisam ser suplantadas. Para isso, Daniel cortou trechos de entrevistas que associavam a pessoa com deficiência ao binarismo coitadinho/super herói; e escolheu cuidadosamente a trilha sonora para fugir de um “sentimentalismo raso”. 

“Foi preciso ter atenção em cada etapa para fugir disso: a escolha dos profissionais, a maneira de filmar, de pensar o roteiro, de editar. Porque essa história de superar a deficiência é besteira. Eu não vou superar a deficiência; ela vai estar sempre aqui comigo”, disse.

“Vou dar um exemplo prático: tem um trecho em que eu mostro imagens minhas de quando dou meus primeiros passos, entre 5 e 6 anos de idade, que foi quando eu comecei a andar sozinho. Era fácil fazer as pessoas se emocionarem, se debulharem em lágrimas se tivesse um piano emotivo por baixo. Mas escolhi usar uma música que é quase uma não música. São sons que estão ali para dar profundidade à cena, mas não reforçam nenhuma emoção. Eu sei que mesmo assim há pessoas que vão levar para esse lado, o da superação, mas o meu papel é não reforçar isso”, acrescentou. 

Após a exibição do filme e a conversa com o diretor, haverá palestra sobre anticapacitismo com o influenciador digital potiguar Ivan Baron, às 19h.

Por fim, encerrando a programação, será lançada a terceira edição do livro em braile “Um Olhar Diferente Sobre Moda”, com depoimentos sobre Moda Inclusiva de 13 profissionais, dez deles pessoas com deficiência, dos estados de Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais; além de registros de projetos premiados de moda inclusiva. 

A modelo paranaense Hilanna Santiago, de 24 anos, é uma das coautoras e disse estar entusiasmada com o evento em Florianópolis.

“Nesses encontros, fortalecemos a luta anticapacitista, mostrando que temos vez e voz, e compartilhando experiências de quem também vivencia a deficiência”, afirmou ela, que tem paralisia cerebral. Participante da companhia de dança Guerreiros há 14 anos, voltada para pessoas com e sem deficiência, ela também é estudante de secretariado e atua como social media.

A publicação será distribuída gratuitamente para o público presente. Durante todo o evento também haverá exposição das obras da artista plástica gaúcha Rita Boz, que utiliza os pés para produzir pinturas em acrílico sobre tela.

Como participar

De acordo com os organizadores, toda a programação é gratuita e será realizada na sala Gilberto Gerlach, no CIC, Florianópolis, com 137 lugares e sujeita à lotação. A entrada será por ordem de chegada. Senhas serão distribuídas uma hora antes de cada atividade. 

Se a escolha for pela sessão de cinema e debate, é preciso ter atenção à classificação indicativa do filme – 12 anos – e à possibilidade de já estar com aplicativo Moviereading instalado para acessar os recursos audiodescrição e Libras. 

A 1ª Mostra de Artes Inclusiva é um projeto da Rio Produções, selecionado pelo Edital Lei Paulo Gustavo LPG SC 2023 – executado com recursos do Governo Federal e Lei Paulo Gustavo de Emergência Cultural, por meio da Fundação Catarinense da Cultura. Tem apoio cultural do MIS-SC, do Instituto Nação Brasil, Instituto Social e Cultural Hadassa e Instituto Luciano Martins. 

O jornalismo independente e de causa precisa do seu apoio!


Fazer uma matéria como essa exige muito tempo e dinheiro, por isso precisamos da sua contribuição para continuar oferecendo serviço de informação de acesso aberto e gratuito. Apoie o Catarinas hoje a realizar o que fazemos todos os dias!

Contribua com qualquer valor no pix [email protected]

ou

FAÇA UMA CONTRIBUIÇÃO MENSAL!

  • Thais Araujo

    Jornalista, mestra e doutoranda em Jornalismo (UFSC), pesquisadora nos grupos Transverso e DhJor (Jornalismo e Direitos...

Últimas