Após seis anos da aprovação da lei que cria o Observatório, plataforma foi lançada nesta semana. O site irá disponibilizar um cruzamento dos dados de violência contra as mulheres obtidos pelas instituições públicas do estado. A plataforma é parte da implementação do Pacto Estadual Maria da Penha e encerrou o Agosto Lilás no estado.

Em média, a cada 10 minutos uma mulher sofre ameaça em território catarinense, segundo dados de 2020 do 15º Anuário Brasileiro de Segurança Pública. É o primeiro estado em registros desse tipo de crime, com 1541 casos a cada 100 mil mulheres, enquanto a média nacional é 538. Santa Catarina manteve-se nos três últimos anos do levantamento como o terceiro estado em violência doméstica, nos crimes de lesão corporal dolosa. Em 2020, ficou atrás apenas de Rondônia e Mato Grosso, com quase 380 casos por 100 mil habitantes mulheres, ao passo que a média nacional foi de 212,7. 2020 também foi o ano em que o estado registrou 57 feminicídios.

Já quando se trata de crimes de violência sexual, o estado registrou, aproximadamente, sete casos por dia de estupro e estupro de vulnerável, envolvendo somente vítimas mulheres. Em relação às tentativas de estupro e estupro de vulnerável, ocupa a primeira posição desde 2019. Somente em 2020, foram 9,1 tentativas de estupro a cada 100 mil mulheres – a média nacional é de 2,3. Todos esses dados retratam Santa Catarina, o estado mais conservador do país, como um dos mais violentos contra meninas e mulheres na atualidade.

Para monitorar esses números, de forma periódica e coordenada, foi criado o Observatório da Violência contra a Mulher de Santa Catarina (OVM/SC), um site que irá disponibilizar essas informações com o propósito de construir indicadores que permitirão a elaboração de políticas, ações de prevenção e de enfrentamento à violência contra as mulheres.

Lançada nesta semana, a plataforma online ainda está em desenvolvimento. Nela há informações sobre os números de feminicídios, de atendimentos pelo Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), e de medidas protetivas concedidas no segundo semestre de 2021. Os dados de feminicídio são os únicos em que há possibilidade de fazer um comparativo com o ano anterior.  No observatório é possível pesquisar ainda sobre a rede de enfrentamento à violência, legislação, publicações relacionadas à temática e como acessar os canais de atendimento às mulheres em situação de violência.

Os dados estão sendo coletados em diferentes esferas públicas, promovendo a convergência entre os Órgãos Públicos que atendem mulheres em situação de violência, nas áreas de Segurança Pública, Saúde, Educação, Assistência Social e Justiça, incluindo a Defensoria Pública e o Ministério Público.

A proposta é parte do compromisso dos gestores públicos em incluir a transversalidade de gênero nas políticas públicas, proposta do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, estruturada em diferentes eixos como acolhimento, segurança, educação, saúde, trabalho e desenvolvimento.

Com a criação do OVM/SC, será implementado o Registro Administrativo Unificado que, ancorado na Rede de Atendimento às Mulheres em Situação de Violência, propõe a construção de indicadores para o monitoramento, avaliação, elaboração das políticas e ações de enfrentamento à violência contra as mulheres. Por meio de ações de coleta, sistematização, unificação e padronização de dados, será possível análises referentes ao contexto dessas violências no estado, pois o acesso às informações públicas é um direito garantido no contexto jurídico nacional e internacional.

Dados esses que até o momento não estavam sendo disponibilizados pelo Estado. Atualmente, somente os números de feminicídios são informados, de forma mensal, no site da Secretaria de Segurança Pública do Estado. Somente até julho deste ano, 22 mulheres foram mortas pelo crime de feminicídio. 

Percurso Legal do Observatório

A Política Estadual para o Sistema Integrado de Informações de Violência Contra a Mulher no Estado de Santa Catarina, denominado Observatório da Violência Contra a Mulher-SC, foi instituída por meio da Lei n° 16.620, de 7 de maio de 2015, proposta na época pela Deputada Ana Paula Lima (PT).

Em 2020, após cinco anos de veto à Lei pela prerrogativa de falta de dotação orçamentária, a Deputada Luciane Carminatti (PT), coordenadora Bancada Feminina da Assembleia Legislativa de Santa Catarina (ALESC), propôs a retomada da ação, atuando na formação de uma coalizão entre diferentes instituições públicas na compilação de dados para possibilitar análises relacionadas às violências contra as mulheres no estado.

Em 31 de março de 2021, foi assinado um Termo de Cooperação Técnica entre o Poder Legislativo Estadual, Poder Executivo Estadual, Poder Judiciário Estadual, Ministério Público de Santa Catarina, Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina, a Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Santa Catarina e a Universidade Federal de Santa Catarina para a implementação do Observatório da Violência contra a Mulher em Santa Catarina.

Segundo a deputada Luciane Carminatti (PT) há limitações na lei que precisam ser revistas para dar conta de atender as demandas atuais. “Esta é a primeira etapa da construção dessa ferramenta importante de combate à violência contra as mulheres em uma ação triangular entre o OVM/SC, a Procuradoria e a Defensoria para criar uma rede que envolva cada município, o estado e a União. Agora, em uma próxima etapa, precisamos planejar e executar as ações por meio de um trabalho educativo em escolas, empresas e na sociedade”, declara a deputada.

Imagem: Observatório da Violência Contra a Mulher Santa Catarina

O projeto de implementação e o grupo de trabalho

Escrito por Luciana Patrícia Zucco e Teresa Kleba Lisboa (IEG/UFSC), o projeto de implementação do Observatório está sendo desenvolvido por instituições que trabalham há mais de um ano de forma conjunta em um Grupo de Trabalho, entre elas a Delegacia de Polícia Civil, o Conselho Estadual dos Direitos da Mulher (CEDIM), o Instituto de Estudos de Gênero (IEG/UFSC) e o Ministério Público de Contas.

“Durante o primeiro semestre de 2021, as integrantes do GT trabalharam arduamente na proposição e criação do Site do OVM/SC, produzindo conteúdos correspondente a cada aba do site e realizando o levantamento de instituições que integram a Rede de Atendimento a mulheres em situação de violência de cada Município do Estado de Santa Catarina. Nesta fase, a parceria com a Federação Catarinense de Municípios (FECAM), foi de fundamental importância”, afirma Teresa Kleba Lisboa.

Nesse período em que ocorreram reuniões e debates, a equipe conheceu a experiência de outros observatórios que monitoram as violências contra as mulheres no Brasil, como o Observe – Observatório pela Aplicação da Lei Maria da Penha (UFBA/NEIM), a experiência do Observatório da Violência contra a Mulher no Rio Grande do Sul e Distrito Federal, o Observatório do Senado e de Teresina (PI).

“O importante é a gente entender que nunca tivemos em Santa Catarina um lugar tranquilo para as mulheres. Temos números enormes de feminicídios, de estupros, de violências físicas, morais, patrimoniais, institucionais. Se não temos políticas públicas efetivas, isso também é uma violência a todas as mulheres. Esse observatório será um espaço para que todos os dados oficiais sobre as questões das violências sejam catalogados”, comenta Rosaura de Oliveira Rodrigues, da Rede Nacional Feminista de Saúde, presidenta do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher de Santa Catarina (CEDIM/SC). 

Imagem: Cartaz Observatório

A Sala do OVM/SC na ALESC

O OVM/SC está sendo implantado em uma sala na Assembleia Legislativa de Santa Catarina (ALESC), piso térreo, junto com a Procuradoria da Mulher. O projeto do OVM/SC prevê a contratação de uma equipe operacional, técnicos e bolsistas que serão capacitados para contribuir com a compilação de dados, etapa que está em processo de implementação. Uma profissional técnica em informática foi contratada para esta primeira etapa de lançamento do site.

“O Observatório da Violência contra a Mulher é um canal de integração e divulgação de dados que envolvam as mulheres, ainda em fase de estruturação, com atenção à Lei Geral de Proteção de Dados, mas não presta atendimento individualizado para situações de violência, tampouco faz encaminhamentos. O OVM/SC tem espaço físico na ALESC, mas para fins de operacionalização destes dados e para dúvidas sobre o Observatório em si, não sobre casos específicos”, explica a Delegada Cláudia Regina Bernardi da Silva, uma das profissionais que está atuando na sala do Observatório, junto à Procuradoria da Mulher na ALESC.

As diretrizes do Observatório estão sustentadas pelos pressupostos da Lei Maria da Penha e pelo Pacto Estadual Lei Maria da Penha firmado, em 2018, entre a SDS, Assembleia Legislativa, CEDIM, Casa Civil, Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Ministério Público do Estado de Santa Catarina, Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina e Federação Catarinense dos Municípios.

O compromisso foi assumido pelo Governo do Estado em relação à implementação da Lei Maria da Penha, ao assinar o “Pacto Nacional pelo Enfrentamento a Violência contra Mulheres” e assegurar a transparência das informações produzidas pela rede pública de serviços voltada ao enfrentamento da violência. Um dos objetivos do pacto é promover ações em rede para a garantir a autonomia das mulheres em situação de violência e ampliar seus direitos.

Segundo Patrícia Maria Zimmermann D’Ávila, coordenadora das Delegacias de Proteção à Criança, Adolescente, Mulher e Idoso (Dpcami), a SSP vai encaminhar as informações, exceto os “dados sensíveis”, relacionadas aos registros da Polícia Civil, Polícia Militar, Instituto Geral de Perícias e Bombeiro Militar.

“Quando falo em dados sensíveis me refiro aos dados como nome da mulher, filiação, informações que possam identificá-la. Às vezes a investigação traz particularidades que expõe a vítima e seus familiares, estas informações sensíveis não podem ser divulgadas. Todo o trabalho da Polícia Civil, nos casos de enfrentamento à violência contra a mulher, preza pela não identificação da vítima, para impedir a sua exposição e a de seus familiares. Os filhos destas mulheres já têm um sofrimento com todo o contexto da violência, a exposição de informações sigilosas só aumenta o sofrimento”.

Serviço

Observatório da Violência contra a Mulher de Santa Catarina (OVM/SC)

ALESC: piso térreo/ Sala 16

Site: https://ovm.alesc.sc.gov.br/ 

Email: [email protected] 

Telefone: (48) 3221.2777

*Atualizada às 13h24 de 3 de setembro.

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    Jornalista feminista, antirracista e descolonial atua com foco nos olhares das mulheres indígenas. A cada dia se descobr...

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