Em Pílulas de Discernimento, Joanna Burigo, mestra em Gênero Mídia e Cultura (LSE), conselheira editorial do Portal Catarinas e coordenadora Emancipa Mulher, traz pequenas notas informativas e analíticas sobre temas do cotidiano social e político que estão em debate nos fóruns das redes sociais.
Cringe é velho
A notificação do iFood no meu celular agorinha me perguntou “cupom é cringe?”. É impressionante assistir a velocidade do sentido na direção do capital. No fim os adolescentes sem futuro tinham razão, e cringe foi essa tour.
Loucura loucura loucura.
A velocidade da corrosão do sentido pela repetição exponencial de seus significantes faz até do proverbial muro um espaço líquido: recebi por WhatsApp um chamado pelo impeachment do Bolsonaro que urge lulistas a descerem dele.
Nubank e Anitta
Meus olhos acabaram de passar por uma postagem patrocinada, no Facebook, de um texto cuja manchete aponta para o suposto erro de Nubank e Anitta, e que já vinha com um comentário adjacente dizendo assim: “Anitta só sabe rebolar, eu sou machista e gostei”, seguido dos emojis cringe de chorar de rir. Fiquei emoji de exasperação porque já não sei mais exatamente o que as coisas significam mas, não pulam na cara de vocês CAPITAL e FEMINILIDADE?
Free Britney Spears
Status: aguardando o buzz sobre o possível American Crime and Horror Story que Ryan Murphy e Brad Falchuck farão com o impressionante depoimentos da princesa do pop pelo fim do conservatório de que é prisioneira sob controle de seu pai para a justiça estadunidense.
Gênero, educação e espetáculo
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A supervalorização do corpo do homem cis branco e das imagens da feminilidade enfatizada são tão poderosas quanto perigosas, e suas combinações tendem a engendrar muita picaretagem. Também parecem ser celeiro de picaretas as recentes confluências entre performance e educação, que confundem slogans e entretenimento com pensamento crítico e reflexão. Que fase.
28 de junho
28 de junho é dia de entender que a heterossexualidade não é inerentemente “normal”, muito menos “melhor”, mas sim tornada normativa, por ser repetida, à exaustão, a ideia errônea de que ela é “natural”. Não é.
A heterossexualidade compulsória existe para garantir a reprodução patrilinear. A heterossexualidade compulsória, assim, tem origem no exercício de controle de mulheres cis. Bora implodir o hetero-cis-tema juntes.
Tradição e preconceito
As famílias tradicionais têm mais medo de terem filhes LGBTI+ do que de terem filhos e filhas misóginos. Aliás, as famílias tradicionais se orgulham de seus filhos cis machistas e filhas cis submissas antes de sequer aceitarem seus filhes LGBTI+. O filho cis trai, abusa, bate? “Homem é assim mesmo”. A filha cis reage?: “que vergonha”. Onde os valores são patriarcais, que abunde feminismo e desbunde LGBTI+.
Paciência, sapiência e internet
Maus usos da combinação de redes sociais e discursos de identidade incluem achar que ter experiência num assunto justifica interpelar arrogantemente quem se especializa no assunto. Eu queria achar um sarro, mas acho um saco quando pessoas interpelam minhas elucubrações sobre feminilidade e gênero com platitudes, e sem parecer se dar conta de que a minha experiência É de feminilidade, ou saber/lembrar que estudo muito (e ensino!) gênero.
Paciência e sapiência.
Governador arco-íris
Olha. É bem ótimo que o governador gato do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), tenha assumido publicamente que é gay. Não vou nem fazer piada dizendo que demorou. (Ops.). Mas é ótimo, mesmo. Pra ele. Pra comunidade LGBTI+. Pra comunidade em geral. Pra todo mundo. Pelo bem da honestidade, da maturidade, da liberdade de sentir desejo sem ter que prestar satisfação. Ótimo. Mas o bofe segue sendo o patriarcado todinho. E lançou pré-candidatura. Ah, os usos neoliberais do marketing eleitoral arco-íris.
Desilusão
Da juventude só tenho saudades de duas coisas: colágeno e a ilusão da democracia.