Fábio Bispo, especial para o Catarinas.
Anglada, que é da extrema-direita, disse para Kátia Juncks voltar para o Brasil e ajudar seus “companheiros” após resultado das urnas; no twitter o político a acusou de espalhar ódio aos valores tradicionais espanhóis.
Uma das principais vozes da extrema-direita na Catalunha, o regidor Josep Anglada (SOMI) — equivalente ao cargo de vereador no Brasil — incluiu a brasileira Kátia Juncks na sua lista de alvos públicos. Os dois são parlamentares em Vic, município da província de Barcelona. Em 5 de novembro, na primeira sessão após o resultado das eleições no Brasil, Anglada criticou o posicionamento de Kátia sobre o resultado das urnas e disse a parlamentar que voltasse ao Brasil para “ajudar seus companheiros, porque Bolsonaro foi eleito com 55% dos votos de forma democrática”, como declarou, dizendo não precisaria explicar o que é democracia. Uma manifestação de apoio a brasileira está marcada para esta segunda-feira (3).
Essa não é a primeira vez que o parlamentar ataca estrangeiros em atos oficiais. Em plena campanha pela reeleição, não poupa ataques à esquerda, ao islamismo e aos estrangeiros. Promete endurecer as políticas de imigração e é favorável ao fechamento das fronteiras. Também é um crítico do feminismo progressista, o qual diz ser contraditório.
Na sessão de 5 de novembro, os vereadores discutiam uma moção de repúdio contra a deputada Inés Arrimada, onde questionavam justamente uma afirmação da parlamentar de que Lluís Companys — herói para os independentistas catalãos — não foi vítima do estado espanhol. Arrimada disse quem matou Companys “foi o regime franquista, um regime fascista, e não o governo espanhol”.
Companys foi governador da Catalunha e em 1934 e chegou a declarar independência da região autônoma, que durou por 10 horas, somando dezenas de mortos. O líder acabou preso e exilado durante a Guerra Civil (1936-1939). Voltou à Catalunha depois de preso por policiais da Guestapo e fuzilado pela ditadura franquista em 15 de outubro de 1940.
Durante a sessão que discutia o tema, a vereadora brasileira disse que a deputada Arrimadas recorria ao mesmo negacionismo que diz que a Alemanha não foi nazista ou que a Itália não foi fascista. Algo semelhante aos que dizem que o Brasil não viveu uma ditadura militar entre 1964-1985.
Na sequência, Kátia comenta o contexto eleitoral brasileiro citando encontro de pensadores na USP, já após o resultado do segundo turno, que buscou discutir o resultado das eleições brasileiras e a “crise que o país está passando”.
A brasileira leu trecho do discurso da filósofa Marilena Chauí: “Nós não seremos da servidão voluntária porque nós temos a amizade, a liberdade a esperança, a criação e o pensamento”. Na sequência foi retrucada por Anglada, que também criticou a votação deste tipo de matéria pelos 21 vereadores.
A moção contra a deputada Arrimadas acabou aprovada por maioria, o partido de Anglada foi o único contrário.
Natural de Florianópolis, Kátia foi a primeira brasileira eleita para um cargo político na Catalunha. A regidora apoiou o movimento separatista, que em outubro de 2017 declarou independência com base em um referendo. O governo de Madri não reconheceu a decisão e os líderes do movimento acabaram presos. Alguns deles ainda continuam detidos.
Colecionador de polêmicas
No dia 12 de novembro o parlamentar voltou a atacar a brasileira, desta vez em sua conta no Twitter, dizendo que Kátia exalta ódio à Espanha e aos “valores tradicionais”: “Esta ‘hippie’ sul-americana que mora em Vic (Catalunha) tem encontrado nas posições mais extremas do separatismo onde exaltar seu ódio à Espanha e seus valores tradicionais”.
À reportagem, Kátia disse que se sentiu humilhada e que cobraria uma retratação através dos meios legais. Seu partido, o Capgirem, de esquerda, cobrou da municipalidade uma manifestação oficial, que acabou não vindo.
“Recebi insultos vindos do representante declarado do fascismo. Ele me provoca por ser mulher, estrangeira, democrata e de esquerda. A min e uma colega ítalo-argentina. Mandaria todos os estrangeiros embora, é isso que prega em seu programa”, disse.
Josep Anglada é um colecionador de polêmicas. Em 2002 participou da fundação do partido PxCx (Plataforma pela Catalunha), do qual acabou expulso em 2014 por desentendimentos internos. Em 2016 fundou o SOMI (Somos Identitários), partido de extrema-direita que tem crescido, sobretudo, na Catalunha.
Em 2017 foi condenado por ameaçar um jovem menor de idade através do microblog, em 2013. Este ano, uma nova condenação, por ter divulgado informações pessoais de um dirigente do partido PxCx.
Como vereador já tentou proibir o véu islâmico em Vic sob o argumento de que se trataria de questão de segurança pública.
Principal frente da extrema-direita Catalã
No dia das eleições brasileiras, logo após a divulgação do resultado, Anglada twittou: “A vitória de Jair Bolsonaro, um triunfo de todos os Identitários”, escreveu.
Enquanto, no Brasil, o termo “identitários” refere-se aos movimentos de mulheres, negros, LGBT e outros, na Catalunha identitários são um movimento nacionalista e de extrema-direita. Surgiu na França, em 2012, e desde 2014 está também na Alemanha. Em março deste, líderes do movimento que queriam fundar um braço do grupo no Reino Unido foram impedidos de entrar em Londres.
A estratégia política de Anglada se concentra em boa parte nas redes sociais onde se presenta como “alternativa realista e de ruptura ao mesmo tempo” e como “única resposta efetiva para a crise social, econômica e moral”. É um crítico da imprensa tradicional e tem como opção conceder entrevistas e divulgar publicações de veículos menos conhecidos e alinhados com suas ideologias.