Coberta por fumaça das queimadas de diversas partes do país, Florianópolis está com a qualidade do ar insalubre, segundo a agência de monitoramento suíça IQAir. Na noite desta quinta, a concentração de poluentes estava 11,7 vezes maior do que a recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). E o Índice de Qualidade do Ar estava em 153 – pior do que o de São Paulo, estimado em 115.
Essa “neblina” que encobre a cidade vem das queimadas do Sul, Sudeste, Centro-Oeste, da Amazônia e de países vizinhos, como Uruguai, Argentina e Paraguai, segundo o meteorologista Marcelo Martins, da Epagri. “Todos eles estão queimando e queimando bastante”, resume.
Essas queimadas são intensificadas pela seca – a mais extensiva, intensiva e duradoura, segundo informou, ao site DW, a pesquisadora e especialista em secas do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), Ana Paula Cunha.
Além disso, Florianópolis registrou seu próprio foco de incêndio. Na noite de quarta, uma área de mata pegou fogo no bairro Saco dos Limões. Foram 12 horas de trabalho dos bombeiros para conseguir controlar as chamas, que destruíram o equivalente a cinco campos de futebol.
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Queimadas alertam para necessidade de mudança de política ambiental
As queimadas em grande parte do país trazem alerta para Florianópolis, principalmente em relação à política ambiental adotada na cidade. “É uma mensagem muito clara de que a gente, daqui para frente, vai ter que se adaptar. A gente vive numa ilha, numa região costeira que já é altamente vulnerável por si só”, avalia a cientista e professora da UFSC, Marina Magalhães.
Ela diz que é necessário “reavaliar esse plano urbanístico da cidade, que favorece mais construções, mais asfalto e menos ambientes naturais”. Ponto que também é destacado pela professora doutora de Oceanografia e Clima da UFSC, Regina Rodrigues. Ela cita, por exemplo, que plano diretor de Florianópolis, aprovado em 2023, alterou áreas de preservação para áreas de interesse:
“Agora as áreas que são preservadas de natureza podem construir. Então é um alerta, porque veja o que está acontecendo na Amazônia, com a falta de água. Você tira a vegetação nativa, que protege contra os desastres, e é o que aconteceu no Rio Grande do Sul”, diz, referindo-se às enchentes que atingiram o estado vizinho em maio.
O problema maior, alerta, “é que isso reduza a disponibilidade de água. Então a gente vai ter mais extremos de calor com menos vegetação, mais seca”.
Outro ponto destacado pela doutora é que Florianópolis tem alta emissão de gases por queima de combustível fóssil. Isso porque a cidade tem grande frota de carros, consequência de um transporte coletivo não pensado, segundo a professora.
“Não colocaram as faixas exclusivas de ônibus em Florianópolis. Todo mundo é contra, acha-se que você vai pôr mais uma faixa na Via Expressa, mais uma faixa na SC-401 e você vai resolver o problema de trânsito, mas só adiciona mais carro”.
Quais devem ser as prioridades da política ambiental de Florianópolis, segundo as especialistas?
- Investir no transporte público, para diminuir a emissão de queima de combustível.
- Preservar o que se tem, com forte restrição a novos empreendimentos na cidade em áreas de preservação.
- Manter especialmente a vegetação de mangue, “que é muito importante para mitigar mudanças do clima, porque absorve muito carbono”, explica a cientista Marina Magalhães, além manter toda a cobertura de floresta e também a vegetação de restinga, “que é rasteira, não tem tronco, mas que mantém as dunas, que é uma proteção natural do avanço do mar”.
- Planos de adaptação da cidade para as mudanças climáticas.
“Então acho que o próximo prefeito precisa pensar com muito carinho na questão da adaptação do clima, inclusive enquanto política do meio ambiente. E pensar que para reverter, para ajudar a reversão, mitigação, além da adaptação, a gente precisa de fato rever toda a estrutura urbanística da cidade”, finaliza a professora Marina.
O que os candidatos prometem
A Expresso analisou os planos de governo dos candidatos à prefeitura de Floripa, cadastrados no site do Tribunal Superior Eleitoral, em busca de propostas para preservação do meio ambiente. Veja alguns trechos:
Carlos Mueller (PSTU): “Devemos sim lutar com todas as forças contra a destruição da natureza, mas sempre alertando de que o pouco que conseguimos arrancar hoje de conquistas através das lutas será tirado pelos capitalistas amanhã, de que não há nenhuma possibilidade de resolver o drama ambiental da humanidade que não seja destruindo o sistema capitalista, tarefa que só pode ser realizada pela classe trabalhadora e oprimidos através de uma revolução socialista”, afirma.
Dário Berger (PSDB): o candidato divide suas ações para o meio ambiente em três áreas:
- Educação ambiental em todas as unidades escolares municipais. “Além disso, criar práticas de ensino coordenadas pela prefeitura, ou entidades conveniadas que tratem do meio ambiente e sua preservação, promovendo um melhor aproveitamento dos parques e bosques municipais”
- Organização e proteção de reservas ambientais em que propõe trabalho em conjunto com os órgãos federais e estaduais
- Força-tarefa especial, ligada ao gabinete do governo, para cuidar dos morros e das encostas da cidade. “Seja para manutenção e preservação ambiental, seja para resguardar a segurança das famílias residentes nestas regiões”, diz.
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Lela (PT): diz que “é impossível falar no desenvolvimento de Florianópolis, sem citar todo o processo de proteção ambiental e melhoria dos processos de resíduos, água e esgoto”. E que a transição ecológica “só será possível se, de fato, a gestão municipal se interessar em proteger a natureza aqui presente. Por isso, temos como fundamental basal o desenvolvimento da cidade a partir da preservação e proteção e restauração da natureza”. Para isso, apresenta as seguintes propostas:
- Recuperação de investimento da Floram e Defesa Civil, garantindo a estruturação e ampliação das entidades;
- Estruturação de todas as ucs municipais, garantindo visitação ordenada e melhoria da infraestrutura;
- Contratação de novos fiscais ambientais, visando coibir crimes contra a natureza e a fauna no município;
- Criar o projeto Restaura Floripa, visando trazer de volta vegetação em áreas degradadas, inclusive em manguezais;
- Criação da lei de proteção de mangues e restinga, garantindo a proteção e ordenamento nas áreas mais sensíveis do município;
- Criação do IPTU verde e do pagamento de serviços ambientais, favorecendo os protetores e promovedores do desenvolvimento ambiental na ilha;
- Construção dos ranchos públicos para práticas artesanais de maricultura e pesca;
- Fomento da produção de alimentos locais através de contratos de compras públicas de longo prazo;
- Disponibilização de crédito para desenvolvimento sustentável dentro do município;
- Criação do projeto Floripa Solar, com fomento a energia solar domiciliar;
Marquito (PSOL): no eixo 2 do seu plano de governo, intitulado “Cuidar da natureza”, Marquito apresenta seis áreas, a primeira é “Emergências climáticas e cidades resilientes”, em que contextualiza a questão ambiental de Florianópolis. Em seguida, diz que suas propostas “garantem a busca por uma justiça climática e para isso é necessário falar sobre o racismo ambiental, a pobreza energética, a pobreza menstrual, os refugiados climáticos, a insegurança alimentar, a falta de estruturas públicas que garantam a permanência das mulheres mães nos seus postos de trabalho”. E então apresenta 19 propostas para a cidade:
- Elaboração do Plano de Adaptação Climática para o município de Florianópolis, priorizando as áreas protegidas como instrumentos de Solução Baseada na Natureza;
- Mitigação e enfrentamento das mudanças climáticas, baseando-se nas orientações e metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS);
- Revisão e adequação às mudanças climáticas do Plano de Contingência (Plancon) do município de Florianópolis;
- Criação da Secretaria de Defesa Civil e Mudanças Climáticas, com a estruturação e profissionalização das Defesas Civis, com quadro de servidores concursados, com qualificação técnica e com capacitações periódicas;
- Fortalecimento de Sistemas de Alerta Precoce, com a implantação e melhoria de sistemas de alerta para prevenir e mitigar impactos de desastres climáticos;
- Previsão, gestão e aplicação orçamentária para a implementação das políticas públicas para a gestão dos recursos hídricos, planejamento urbano e meio ambiente, com a criação de Fundos específicos, como do Meio Ambiente e da Defesa Civil;
- Desenvolvimento de um Plano Municipal de uso e ocupação do solo baseado em avaliações de risco;
- Infraestrutura resiliente, principalmente com a implantação de jardins e corredores verdes, a fim de desenvolver e manter infraestruturas que resistam a eventos climáticos extremos;
- Educação e conscientização, com a promoção de campanhas educativas para aumentar a resiliência comunitária;
- Políticas integradas: coordenar políticas públicas de gestão de risco com estratégias de desenvolvimento sustentável;
- Realização de diagnóstico que avalie as áreas de risco e a compatibilidade da utilização das soluções baseadas na natureza;
- Análise e implantação de escadas drenantes, como soluções para sistemas de drenagem de águas pluviais em áreas íngremes e de ocupação espontânea;
- Ampliação dos investimentos em pesquisa e no desenvolvimento de tecnologias, inclusive com financiamentos internacionais voltadas à preservação ambiental;
- Plano de medidas integradas de adaptação e mitigação às mudanças climáticas, com prioridade para contextos de vulnerabilidade com recortes de gênero, raça e renda;
- Proteção dos vulneráveis,mulheres, principalmente negras inseridas nas periferias, que desempenham o papel de cuidados daqueles que também são os mais vulneráveis – crianças e idosos. Por serem vulneráveis nessa profunda mudança que está ocorrendo no Planeta, as crianças devem ser olhadas como seres em formação para serem capazes de lidar com as adaptações necessárias à mudança climática;
- Criação de um plano de monitoramento e avaliação dos impactos do racismo ambiental, a fim de subsidiar a criação de políticas públicas específicas para as populações impactadas;
- Desenvolvimento de políticas afirmativas e antirracistas que promovam o acesso pelo povo negro, povos indígenas, povos e comunidades tradicionais, agricultoras/es familiares às políticas públicas já existentes e as que forem criadas;
- Criação da Unidade de Conservação da Planície Alagável do Pântano do Sul, como medida de preservação do manancial de água, de contribuição para a redução de Carbono na atmosfera e de proteção do abastecimento das comunidades do entorno, como a fim de evitar a ocorrência de enchentes;
- Desenvolver planos para a restauração de ecossistemas costeiros-marinhos, tais como, manguezais, recifes de corais e restingas e propor soluções baseadas na natureza costeira que favorecem a proteção das comunidades e da infraestrutura contra eventos climáticos extremos e aumento do nível do mar;
O eixo do plano de governo destinado à cuidar da natureza traz propostas, ainda, para agroecologia e agricultura Urbana; saneamento ecológico e drenagem urbana; gestão de resíduos sólidos urbanos; gestão costeira; áreas especialmente protegidas.
Mateus Souza (PMB): “Para ser uma cidade sustentável, Florianópolis precisa ser ambientalmente correta”, diz o candidato na parte do plano de governo dedicada ao desenvolvimento sustentável. “Minha proposta é a criação de ecopontos de fácil acesso em todas as regiões que, com parceria com associações de catadores de lixo e incentivos à participação da população, irão ser polos de reciclagem da cidade. No projeto estão incluídos benefícios que a Prefeitura pode oferecer ao cidadão (exemplo: redução de IPTU, créditos em empresas de ônibus, cursos) que o incentive a participar dessa iniciativa”.
Cita, ainda, a necessidade de educação ambiental e de instituir novas e consequentes regras de proteção ambiental e fiscalização. “A pauta da política ambiental será tratada por meio de uma constante visão intersetorial, envolvendo a maior quantidade possível de órgãos municipais, a destacar o planejamento, o urbanismo, o transporte e mobilidade, a saúde, os serviços públicos, a educação, a habitação e a assistência social”. Diz, também, que uma das suas estratégias “é oferecer incentivos para engajar empresas e cidadãos a fazerem micro-intervenções que ajudem a ampliar a infiltração de água no solo em imóveis e terrenos públicos e particulares por toda a cidade. Com isso, menos água corre para as ruas, reduzindo o risco de enchentes”. Finaliza afirmando que irá priorizar a criação de novos espaços verdes nas áreas mais críticas.
Pedrão (PP): o plano de governo é dividido em eixos e um é dedicado ao “Desenvolvimento Urbano Sustentável”, em que ele diz que pretende “avançar as políticas públicas relacionadas ao desenvolvimento de nosso território, olhando por um lado para uma Florianópolis enquanto metrópole regional – cosmopolita, dinâmica, agregadora e em rápidas transformações – e, por outro lado, uma Florianópolis da biodiversidade, da riqueza de vida marinha única. Diz, ainda, que vai respeitar a realidade ambiental do território.
Portanova (Avante): dedica a primeira parte do plano de governo para “Saneamento, Meio Ambiente e Sustentabilidade”. Diz que “a gestão moderna de uma cidade deve estar ancorada em uma visão sistêmica e sustentável, onde as políticas de saneamento e meio ambiente se integram para melhorar a qualidade de vida de todos os cidadãos”. Entre suas propostas estão:
- Lembrar que a boa utilização dos resíduos pode também gerar lucros para a cidade e inclusive gerar energia limpa, trazendo benefícios sociais e ambientais a todos que moram na cidade.
- Focar em soluções ecológicas e sustentáveis, como a adoção de tecnologias de saneamento verde e a revitalização de áreas degradadas, garantindo a preservação dos recursos hídricos e promovendo um crescimento urbano mais equilibrado.
Topázio (PSD): uma parte do seu plano de governo é dedicada à sustentabilidade. “Nosso compromisso é implementar políticas e ações que promovam a preservação dos recursos naturais, incentivem a reciclagem e a utilização de energias renováveis, e melhorem a qualidade de vida da população de forma sustentável”. Logo, em seguida, apresenta as seguintes propostas:
- Lei de Incentivo à Reciclagem;
- Modernização das Cooperativas de Reciclagem;
- Ampliação dos Pontos de Entrega Voluntária (PEVs);
- Programa “As Cores do Lixo”: Conscientização nas escolas municipais sobre a importância da separação do lixo;
- Fortalecer recolhimento de Óleo de Cozinha;
- Campanhas de Conscientização sobre Água da Chuva;
- Produção de Energia Fotovoltaica em Prédios Públicos;
O candidato Brunno Dias (PCO) não apresentou, no plano de governo, propostas para o meio ambiente.