No próximo sábado (7), Catarina Lins lança o livro de poesia “Parvo Orifício”, às 17h, no Tralharia, em Florianópolis. Na junção das expressões parvo e orifício, a jovem poeta de 26 anos deu sonoridade à única palavra da língua portuguesa para a qual, segundo seu professor, não havia rima perfeita. “Na FLIP do ano passado, eu estava com um amigo que também escreve poesia e queríamos muito encontrar uma possível rima perfeita pra ‘árvore’. Se você ler “parvo orifício” juntando as vogais, fica parvorifício, então foi uma escolha pela sonoridade dessas palavras”, explica.

Essa busca por sonoridade marca o trabalho da escritora que encontrou na poesia o formato ideal pra expressar seu olhar sobre o mundo. Florianopolitana, radicada no Rio de Janeiro, Catarina é formada em letras pela Pontifícia Universidade Católica (PUC/RJ) e mestranda em Literatura, Cultura e Contemporaneidade pela mesma instituição. “A aprendizagem do som e do ritmo e a prática de ler o poema em voz alta me marcaram e acompanham minha produção até hoje, tanto que minha pesquisa no mestrado é sobre isso”, conta ela.

Sua poesia, neste livro lançado pelo Coletivo Editorial Garupa, extrapola o conteúdo. São 300 exemplares confeccionados manualmente. Além das folhas em papel pólen, a edição possui ilustrações da artista Maria Faoro impressas em páginas de papel vegetal.

O evento de apresentação do livro ao público da capital catarinense contará com leituras de poemas pela autora e pelas editoras das revistas vera k., Julia Klien, e da Garupa, Juliana Travassos. Essa é a segunda obra poética de Catarina, depois de “Músculo”, publicado em 2015. Em entrevista ao Portal,  a escritora fala sobre suas referências para a construção poética no livro que chega a Florianópolis depois de ser lançado no Rio de Janeiro.

“Parvo orifício” é a segunda obra poética de Catarina depois de “Músculo”, publicado em 2015/Foto: Eduardo Marques

Catarinas: Que caminhos te conduziram à poesia, além da formação em Letras?
Catarina:
Eu comecei estudando cinema aqui em Florianópolis, e com 19 anos me mudei pro Rio porque queria continuar a estudar cinema lá. Na época em que fui, a PUC não aceitava transferência externa e não tinha vestibular no meio do ano pro curso de cinema, mas tinha pra esse curso de Formação do Escritor (Produção Textual), uma das habilitações de Letras, que tinha aulas de roteiro, latim, e várias outras coisas que me chamaram atenção – resolvi tentar, achando que ia ficar só até abrir o vestibular de novo ou até pedir transferência. No entanto, acabei gostando muito do curso e das aulas de literatura e etc. No último ano peguei uma matéria com o professor, poeta e tradutor Paulo Henriques Britto, que era uma aula que basicamente ensinava a gente a ler poesia (porque a verdade é que a maioria das pessoas já sabe muito bem como ler prosa e se dá bem com isso, mas pra ler poesia é como se precisasse de um outro mecanismo, e o Paulo nos fazia ler em voz alta, prestar atenção no som e em outros aspectos que normalmente não perceberíamos). Tinha um concurso de poesia na PUC-Rio (justamente o prêmio Paulo Henriques Britto) e eu ganhei no último ano em que era aluna da graduação. Achei que era um bom sinal e continuei escrevendo, porque embora antes, durante a graduação, eu tivesse escrito prosa, acho que não tinha conseguido alcançar o que alcancei com a poesia que foi como ter encontrado o formato perfeito pra expressar o que eu queria, mas não tinha conseguido até então.

Catarinas: Sua mãe Luiza Lins atua no cinema, isso de alguma forma também te influenciou para as artes?
Catarina:
Acho que em certa medida sim, por ter tido acesso à arte desde pequena.

Catarinas: Você pode falar sobre essa oscilação “entre utopia e desencanto”, conforme recente definição de seu trabalho feita pelo poeta Carlito Azevedo?
Catarina:
Isso que o Carlito falou eu nunca tinha percebido, mas acho que faz sentido, e que talvez seja uma “herança” ou influência do Roberto Bolaño, não sei.

Catarinas: Quais são suas inspirações na literatura?
Catarina:
Adília Lopes, Roberto Bolaño, Frank O’Hara, Angélica Freitas & Ana Martins Marques

Catarinas: Seu trabalho pauta-se pela quebra de padrões?
Catarina: 
Talvez, primeiro porque existe a ideia de que um poema só é um poema depois que está escrito num papel, publicado num livro. Depois, tem-se uma ideia do que pode ou não entrar num poema. Questões de amor, morte, sei lá, coisas profundas. Você não pensa normalmente que um poema possa falar sobre o Beto Carreiro. O teatro do Mundo, por exemplo, é um poema longo que escrevi durante seis meses. É cheio de capítulos subdivididos em partes menores e ainda não foi publicado em texto, mas já foi lido por aí, por mim e outras pessoas em lugares como o CEP 20.000 e na ABRALIC.

Catarinas: Você não busca necessariamente seguir padrões na poesia, mas ao mesmo tempo considera essenciais a sonoridade (rima), o ritmo…
Catarina: 
Não considero rima algo essencial, mas acho que o modo como um poema soa – pelo menos no meu trabalho – é um aspecto importante. Além disso, o ritmo pode ser trabalhado de outras formas que não com um contrato métrico rígido ou coisa parecida (há muito tempo que não conto sílabas!). Mas ao mesmo tempo, ter tido uma base com isso, nas aulas do Paulo, me ajudou a pensar e a identificar certos ritmos que me interessam mais do que outros.

Catarinas: Em quais circunstâncias ocorreu a escolha do nome do livro?
Catarina: 
O Paulo Britto um dia disse que a única palavra da língua portuguesa para a qual não existia uma rima perfeita era árvore. Na FLIP do ano passado, eu estava com um amigo que também escreve poesia e queríamos muito encontrar uma possível rima perfeita pra árvore. Se você ler “parvo orifício” juntando as vogais, fica parvorifício, então foi uma escolha pela sonoridade dessas palavras, num primeiro momento. Eu lembro que na época as pessoas acharam um título bizarro, até cogitei outros, mas depois acabou fazendo algum sentido.

Catarinas: Como você chegou até o Coletivo Editorial Garupa?
Catarina: 
Foi uma questão de afetividade e estética mesmo – eles tinham editado o livro do Italo Diblasi, poeta carioca, que um dia disse pra Juliana Travassos, da Garupa, que eu tinha esse livro pronto e ia fazer por outra editora, o que era verdade. A Juliana me chamou pra tomar um café e contou como queria fazer meu livro, com as folhas de papel vegetal, e disse que eu teria total liberdade na edição. Aí o livro que apareceu na minha cabeça, nessa conversa com ela, era tão perfeito pros poemas que ele contém que acabei escolhendo fazer com eles. Depois que o livro chegou da gráfica, o pessoal do coletivo costurou um a um com as paginas das ilustrações.

Catarinas: Como você avalia hoje a cena da poesia hoje com o uso das redes sociais?
Catarina: 
Vejo um fortalecimento. As redes sociais colocam as pessoas em contato, e também obras de diferentes épocas e lugares com os leitores de hoje. Eu não conheceria metade dos poetas de que gosto se não fosse pela internet, por revistas como a Modo de Usar, por exemplo. A Cais, onde publiquei meus primeiros poemas, também faz um trabalho legal, editada pela Luana Carvalho. E tem a verak.co, uma revista online que eu comecei com a Julia Klien, que hoje é a editora, com uma proposta de só publicar poetas mulheres. E a maior parte desse diálogo se dá nas redes sociais.

Catarinas: As mulheres estão tendo visibilidade na literatura, em especial na poesia? 

Acho que de fato houve um aumento considerável na visibilidade para as autoras de poesia, e que grande parte da boa poesia contemporânea, a meu ver, é produzida por mulheres. Mas ao mesmo tempo, por mais que mais mulheres estejam escrevendo e publicando, o que é maravilhoso, essa visibilidade parece ter limites, por se restringir ainda a mulheres brancas e de classe média, em sua maioria ligadas a grandes universidades, ao menos do que chega a um público maior.

Catarinas: Você pensa em ver um poema seu musicado?
Catarina:
Essa é uma ideia que tem me ocorrido nesses últimos dias! Acho que gostaria, sim. Sobretudo se fosse um funk.

Serviço:
O que: Lançamento do livro “Parvo Orifício”
Quando: próximo sábado, 7 de janeiro, às 17h
Onde: Tralharia, centro de Florianópolis
Quanto: gratuito

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