A decisão de parir em casa, dentro da banheira, no hospital privado ou público precisa vir da gestante, levando em consideração o que lhe parece mais confortável. Em vez de esperar o parto deitada numa maca de hospital, ela também pode escolher ficar em pé, no chuveiro, ou de cócoras, como as índias. A tesoura que faz o corte no períneo sai de cena e entra em ação uma bola obstétrica, em que a mulher em trabalho de parto faz exercícios para ajudar na dilatação. Um parto em que a mulher seja protagonista e tenha a sua vontade respeitada é o enredo do Congresso do Parto Humanizado que aconteceu na Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc) desde quarta-feira (9) e encerrou nesta sexta (11). O evento, que está na terceira edição, reúne enfermeiras obstetras, médicas, parteiras, doulas, fotógrafas de parto e mães.

Tornar o parto um momento natural, e não uma intervenção médica, é uma luta que vem crescendo nos últimos anos e ganhando adeptas em todo o país. Mas, é em Santa Catarina que ela tem obtido conquistas significativas, como a Lei 16.869, conhecida como Lei das Doulas, aprovada em janeiro de 2016, que autoriza a presenças destas assistentes de parto em hospitais. Um ano depois, em janeiro de 2017, entrou em vigor a Lei 17.097, que trata da violência obstétrica e obriga a implantação de medidas de informação e proteção à gestante e parturiente.

Concomitante ao IIIº Congresso do Parto Humanizado, acontece o Iº Congresso Nacional de Fotografias e Vídeos de Parto | Foto: Catarinas/Sílvia Medeiros

A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que o índice de cesáreas deve ser de no máximo 25%. Dados do Ministério da Saúde de 2015  mostram que dos 3 milhões de parto feitos no Brasil naquele período, 55,5% foram cesáreas e 44,5% parto normal. Se considerar apenas os partos realizados no SUS, o percentual de parto normal é maior: 59,8% contra 40,2% de cesáreas. Ainda assim, o acesso ao parto humanizado para as usuárias do SUS é um desafio à parte. Muitas vezes romantizado e elitizado, o parto que respeita as decisões das mulheres e que as empodera está muito distante da realidade das maternidades públicas.

Com estruturas sucateadas e gestantes sem acesso à informação, os planos de parto são raros dentro do sistema público. Este documento, escrito pela própria gestante e reconhecido em cartório para ter efeito legal, serve como orientação para a equipe do hospital, já que no momento do pré-parto a mulher está em situação vulnerável e não tem como definir quais as melhores escolhas. É no plano que a grávida manifesta como deseja passar pelas fases do parto e procura garantir intervenções que respeitem o seu protagonismo.

Renata Portela Medeiros, enfermeira obstétrica que trabalhou durante seis meses numa das maiores maternidades públicas do estado — a Darcy Vargas, que fica em Joinville — diz que nunca recebeu nenhum plano de parto.

A enfermeira Arnildes Rodrigues de Oliveira ressalta que a falta de informação faz com que seja comum as parturientes chegarem na maternidade pedindo para fazer cesárea. “As mulheres não são preparadas ao longo da gravidez para o momento do parto. Elas chegam para parir e trazem as experiências negativas que outras contaram. Cabe a nós informar sobre cada procedimento e respeitar as suas escolhas”.

Deputada Ana Paula (E) e Daphne Rattner, uma das referências no país no debate de humanização do parto | Foto: Eduardo Guedes – Agência Alesc

Para a enfermeira Odálea Maria Brüggemann, que trabalha na Hospital Universitário em Florianópolis e é uma das estudiosas sobre a humanização do parto, as mulheres menos informadas são excluídas do poder de decisão. Ela afirma a necessidade de informá-las, explicar os benefícios e, acima de tudo, respeitar a sua decisão, sem imposições. “Não basta pensar que colocar numa bola obstétrica, ter um parto na vertical, vai ser humanização do parto. Essa humanização tem que vir da prática de atendimento, ela se dá nas relações da parturiente com a equipe”.

A deputada estadual Ana Paula Lima, uma das apoiadoras da pauta na Alesc, fala que o próximo passo é instalação de uma casa de parto no estado. Segundo a parlamentar, apesar de alguns gestores não toparem a ideia, a consolidação desse projeto vai contribuir com a abrangência do debate a todas as mulheres catarinenses. “Santa Catarina, apesar de construir leis importantes, ainda tem muito o que avançar. Temos que dar condições às maternidades públicas do estado, reafirmar a importância dessa pauta e vencer o medo. Não podemos deixar que roubem esse momento tão magico que é parir”, argumenta.

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