A grande mídia do Brasil é hostil à saúde pública. A afirmação da jornalista Cynara Menezes foi reforçada em diversas intervenções durante a 1ª Conferência Nacional de Comunicação em Saúde, que reúne comunicadores e representantes do controle social até 20 de abril no Centro Internacional de Convenções do Brasil, em Brasília.
A criadora do blog Socialista Morena participou da mesa “Papel da Comunicação na defesa da informação em saúde”. Na opinião da jornalista, há deturpação clara da imagem das políticas sociais e de saúde. Como exemplo, ela citou o programa Mais Médicos, que sofreu ataque sistemático da grande imprensa nos primeiros anos, no governo Dilma, e que agora, no governo Temer, recebe reconhecimento até mesmo dos veículos mais conservadores.
Outro exemplo de abordagem distorcida pela imprensa tradicional a respeito dos temas da saúde foi a criação de uma falsa epidemia de febre amarela em 2008, segundo o ex-ministro Alexandre Padilha, integrante da mesa “Desafios da Comunicação em Saúde”. A consequência, segundo Padilha, foi uma correria desnecessária pela vacinação que colocou em risco o acesso de quem de fato precisava.
A cobertura midiática superficial sobre a saúde pública também é reflexo das lacunas na formação profissional dos jornalistas e dos modelos das redações, em que os repórteres cobrem cada vez mais editorias com menos espaço para publicação, apontou a jornalista da Fio Cruz e pesquisadora da Universidade de Brasília (UnB), Adriane Cruz. “Na faculdade de comunicação, na maior parte dos cursos, a gente não fala sobre o SUS. Muitos jornalistas já nasceram na era da saúde privada, no advento da saúde privada. Esta visão deturpada passa por isso”, disse a jornalista.
Em meio ao cenário político que também fragiliza a saúde, Cynara destacou a importância de que os profissionais de saúde fortaleçam o que chamou de “boa bolha”: a união dos trabalhadores comprometidos com os princípios da saúde pública, a exemplo dos médicos populares. Também reforçou a importância de que estes profissionais ajudem a pautar os veículos de mídia independente. “É preciso abrir espaços para a comunicação em saúde por meio destas mídias”, afirmou.
Mídia de massa reforça o machismo
Há ainda a invisibilidade dos efeitos da cultura machista na vida das mulheres, lembrou a conselheira do CNS Carmem Lucia Luiz. A sanitarista salienta que as violências vivenciadas pelas mulheres são estruturais na sua condição de saúde e ignoradas pela grande mídia, que reforça a cultura machista. “Sinto na pele o que a comunicação faz cotidianamente com as mulheres, como estimula nossa desvalorização, como reafirma ditos populares negativos para mulheres, como constrói o imaginário popular e, a partir dele, se reproduz não só nas mídias hegemônicas mas também em grande parte nas mídias alternativas e nas relações interpessoais”, afirmou.
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A 1ª Conferência Nacional de Comunicação e Saúde é uma realização do Conselho Nacional de Saúde, órgão máximo do controle social da área no país. O evento pretende oportunizar espaço para que se defina ações capazes de fortalecer a saúde pública por meio da qualificação da informação divulgada à sociedade. Apesar de ser reconhecida mundialmente como a maior política pública de acesso à saúde, o SUS carece de reconhecimento social. A fragilidade da percepção social em torno do sistema abre espaço para o seu desmonte e privatização.
Ainda na tarde desta quarta-feira (19), a programação segue com a mesa “O SUS na sala de aula”, com a participação da educadora e ativista digital Conceição Oliveira e a presidenta do Fórum Nacional de Democratização da Comunicação (FNDC), Renata Miélli. Simultaneamente, acontece também a mesa “Novas Mídias e o SUS”.
Confira a programação
DIA 20/04
9h – MESA 5 – Informação em saúde como direito
Mediador: Moysés Toniolo (Conselheiro do CNS – Articulação Nacional de
Luta Contra a Aids)
Convidados: Rodrigo Murtinho (Fiocruz), Élida Graziane (Ministério
Público de Contas de São Paulo – MPCSP) e Jandira Feghali (Deputada
Federal).
9h – MESA 6 – Experiência de coletivos de comunicação
Mediadora: Charô Nunes (Blogueiras Negras)
Convidados: Marina Pitta (Coletivo Intervozes), Pablo Capilé (Mídia
Ninja) e Bruno C. Dias (Associação Brasileira de Saúde Coletiva –
ABRASCO)
14h às 14h30 – Atriz Ana Petta, protagonista da série médica Unidade
Básica, do Universal Channel, fala sobre a experiência do trabalho com
o Sistema Único de Saúde (SUS).
14h30 – consolidação dos debates realizados pelas mesas
15h30 – Palestra com Tereza Cruvinel (Ex-presidente da EBC)
Tema: O preconceito contra o SUS
17h – MESA DE ENCERRAMENTO