A volta às aulas em 2025 varia conforme o estado e a rede de ensino, e em Santa Catarina está programada para esta segunda-feira, 10 de fevereiro. A divisão do trabalho de cuidar de crianças e adolescentes – seja nas férias escolares ou durante o ano letivo – varia conforme a dinâmica de cada família, mas, na prática, observa-se que as mães e irmãs mais velhas tendem a assumir uma parcela maior dessas responsabilidades. 

Um relatório da Oxfam de 2020 aponta que as mulheres e meninas do mundo dedicam 12,5 bilhões de horas por dia ao trabalho de cuidado não remunerado. Elas também são dois terços de quem os realiza, e responsáveis por mais de três quartos do total.

Outro relatório, este divulgado em 2018 pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), destacou a importância econômica do trabalho doméstico de cuidado não remunerado, estimando que se fosse financeiramente recompensado, seu valor seria equivalente a 9% do PIB global – aproximadamente US$11 trilhões. Essa estimativa é baseada em pesquisas sobre uso do tempo, com métodos de valoração que contabilizam as horas dedicadas a atividades de cuidado e manutenção do lar – tarefas que são desempenhadas, majoritariamente, por mulheres e meninas. 

O relatório enfatiza como o trabalho de cuidado doméstico não remunerado continua sendo um pilar essencial e invisibilizado, sustentando o mercado de trabalho e o bem-estar social. Adiciono que este trabalho beneficia sobretudo homens adultos, que efetivamente enriquecem mais às custas de trabalhos que realizam menos.

Em 1884 Friedrich Engels, em A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado, já argumentava que a solução para a desigualdade de gênero deveria passar pela socialização do trabalho doméstico, permitindo a participação plena das mulheres na produção e na vida política. Isso implica que é socialmente relevante que homens realizem tarefas domésticas, cuidem das crianças, e abram mão de representatividade nas esferas de poder institucional, ao invés de atrapalharem processos rumo a mais justiça social reclamando da “cultura woke” ou do “identitarismo“, por exemplo. 

A ONU Mulheres divulgou, em 2017, que não há nenhum país onde mulheres e homens compartilham de forma igualitária o trabalho de cuidado doméstico não remunerado.

Esse desequilíbrio tem consequências sociais e econômicas significativas, limitando a participação das mulheres no mercado de trabalho e na política, e afetando nossa autonomia social e econômica. Ainda sobre o tempo empregado em trabalhos de cuidado doméstico não remunerado, globalmente as mulheres e meninas dedicam aproximadamente 2,8 vezes mais horas do que os homens e meninos, gastando em média cerca de 4,3 horas por dia com essas atividades, enquanto eles dedicam apenas 1,6 hora por dia. Estes dados também são da ONU Mulheres, de 2023.

Um outro relatório da OIT, de 2018/19, investiga o que há por trás da média global de 20% de diferença salarial que incrementa as finanças dos homens em detrimento das mulheres, e indica que fatores como discriminação e segregação baseadas em gênero, bem como responsabilidades desproporcionais com o trabalho de cuidado não remunerado, continuam a afetar negativamente os nossos rendimentos em comparação aos deles.

Até o momento a OIT não publicou uma atualização mas continua divulgando análises relevantes, e em outubro de 2024 publicou um resumo estatístico destacando que cerca de 708 milhões de mulheres, em todo o mundo, estão fora da força de trabalho remunerado devido ao trabalho não remunerado que fazem. 

Em 2023 escrevi um artigo em conjunto com Izabel Belloc para o Catarinas, destacando a importância da educação e das políticas públicas para combater preconceitos de gênero e normas abusivas. Conforme um relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) sobre o Índice de Normas Sociais de Gênero, a necessidade de fortalecer formação e educação especializadas e garantir políticas públicas específicas é a melhor forma de acelerar a igualdade de gênero.

O relatório também enfatiza o papel crucial do Estado em alterar normas sociais, como as percepções sobre os trabalhos de cuidado não remunerados, historicamente realizados por mulheres e meninas. Essas medidas são urgentes para promover a igualdade e desafiar atitudes patriarcais.

A OIT defende que o reconhecimento, redistribuição e redução deste trabalho se dará com políticas públicas – em linha com nosso texto, e com a velha recomendação de Engels – investindo em serviços, licenças parentais e medidas de promoção da igualdade de gênero nas esferas pública e privada.

Ao quantificar a contribuição econômica do trabalho doméstico de cuidado não remunerado, e o quão desproporcional é a dedicação das mulheres para com eles em comparação aos homens, fica evidente que governos e legisladores devem propor e implementar reformas que reconheçam e valorizem as trabalhadoras como componentes essenciais para o desenvolvimento econômico sustentável. Na volta às aulas, que a gente exija e ofereça cada vez mais educação feminista sobre gênero. 

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  • Joanna Burigo

    Joanna Burigo é natural de Criciúma, SC e autora de "Patriarcado Gênero Feminismo" (Editora Zouk, 2022). Formada pela PU...

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