Elas são mulheres de várias profissões, a maioria sequer tinha tocado um tambor, ou qualquer outro instrumento, antes de dar corpo ao bloco que já soma mais de 100. Cores de Aidê, com suas alas de dança, percussão e canto, estreou nesse carnaval em cinco apresentações na capital catarinense. A edição “Quem é essa mulher?” sugeriu a pergunta que ecoava por onde passavam. E a resposta seguiu como um hino “Somos Aidê, todas Aidês”. Com apenas sete meses de idade, o bloco de samba-reggae que nasceu por iniciativa da banda homônima, deixa sua marca nesta festa tradicional com a promessa de novas alas com bambolês, palhaçaria e capoeira.

Aidês levaram suas cores para um carnaval de empoderamento que teve seu encerramento, por ironia, na quarta-feira de cinzas. A ala “É da nossa cor”, formada por crianças da comunidade Monte Serrat, uniu-se ao bloco no cortejo de despedida pelas ruas centrais, até chegar à histórica Figueira, símbolo turístico da cidade.

O colorido, no entanto, vai além da paleta, está na diversidade de etnias, idades, classes e orientações de gênero. “Todas as mulheres estão convidadas a participar: as cis e as trans”, afirmou Dandara Manoela, na primeira apresentação na Praia da Armação.

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Foto: Paula Guimarães

“Pra que pés? Se tenho asas para voar”, a frase da mexicana Frida Kahlo é a resposta da integrante Carmem Vera Ramos para explicar a força que empreende ao carregar seu tambor por duas horas. “Sou uma das mais velhas do bloco e me orgulho dessa transgressão geracional. Faço questão de dizer a minha idade pra mostrar que todas podemos. Claro, a gente não pode sozinha, mas juntas podemos. É muita energia, realmente como a diz a música, é ‘empoderamento e posicionamento’. Você se sente livre, como uma mulher completa, uma pessoa completa, acima de tudo. Você se sente voando. A sensação é de quero mais”, revela Carmem.

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Foto: Paula Guimarães

A liberdade inegociável é a essência do bloco no resgate à figura mitológica que reina num cântico de capoeira: Aidê, a escrava que fugiu do seu senhor para viver no quilombo de Camugere. “Estou com muito orgulho por essas mulheres incríveis. Interpretar Aidê é muita responsabilidade. Me concentro e coloco todo o amor e força que tenho para oferecer. O empoderamento das mulheres resume tudo que a gente faz. Que elas olhem mais pra dentro de si mesmas e vejam a força que têm”, afirma Fernanda Jerônimo que encarna a Aidê com uma performance de resistência.

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Foto: Paula Guimarães

Elisiane Henler, funcionária pública, assistiu pela primeira vez a passagem do bloco e voltou pra casa com o desejo de tonar-se uma Aidê. “O toque do tambor, a força que trazem essas mulheres e todo o histórico das nossas ancestrais e suas lutas arrepiam o corpo todo. Essa apresentação com tudo que representa chega a ser um ato transgressor. É uma representação da força da união das mulheres para mudar a sociedade. A gente se fortalece e quer fortalecer outras”, conta.

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Foto: Paula Guimarães

A irmandade
“Estais de parabéns, que energia. Oh querida, vais viver muitos anos”, diz um senhor ao final da apresentação para a maestrina Sarah Massi que está à frente da formação das integrantes. Sarah, que iniciou seu caminho na música aos 8 anos de idade, leva os ensinamentos de samba-reggae que recebeu dos mestres Pacote e Júnior do Pelourinho. Ela integra a banda Cores de Aidê com outras mulheres há dois anos e há nove sonhava em criar um bloco com essa proposta de irmandade. “O bloco é tudo que acredito: estar entre pessoas que se amam, se escutam”, revela.

Foto: Paula Guimarães
Foto: Sandra Alves

A tensão durante as cinco apresentações no carnaval deu lugar à emoção nessa quarta-feira de cinzas, ao chegar à Figueira. “Quando vi essa figueira, pensei na raiz de tudo, nos mestres que me ensinaram tanto. Me emocionei muito, lembrei das escadas da casa do mestre Pacote, no Pelourinho, onde nasceu esse ritmo. A cultura popular é isso, é generosidade, é distribuir o que a gente tem. Eu tava tensa, lembrar deles foi um presente”, emociona-se.

Segundo a regente, o mais importante no bloco é a relação humana e menos a técnica do instrumento. “O empoderamento é muito forte. Observo como tudo se movimenta na sociedade para estarmos sozinhas. É empoderador estar com outras mulheres, compartilhando dificuldades, carinhos, doçuras, olhar no olho. Vejo o empoderamento como a forma de estar na vida do jeito que a gente é, ao invés de corrigir, apoiar ‘sobe lá que eu te ajudo daqui’.”

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As atividades do bloco Cores de Aidê cessam nesse período e têm início daqui a um mês. A data de retorno será informada na página do bloco no Facebook.

 

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  • Paula Guimarães

    Paula Guimarães é jornalista e cofundadora do Portal Catarinas. Escreve sobre direitos humanos das meninas e mulheres. É...

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