Presidenta da União Florianopolitana Dos Estudantes Secundaristas (UFES), Amanda Wenceslau, 22 anos, é candidata ao cargo de vereadora de Florianópolis pelo partido Unidade Popular pelo Socialismo (UP). É mulher preta, cisgênero e heterossexual. Amanda participou das construções das ocupações Antonieta de Barros, uma casa de referência para mulheres vítimas de agressão doméstica, e Anita Garibaldi, ocupação urbana que denuncia a falta de moradias populares em Florianópolis.
Amanda é a décima terceira candidata a responder ao questionário proposto pelo Catarinas para divulgar as candidaturas comprometidas com a agenda política feminista, antirracista, LGBT inclusiva e anticapacitista em Santa Catarina. As entrevistas são publicadas diariamente por ordem de chegada. Dado o volume de respostas recebidas, vamos publicar mais de uma entrevista em determinados dias.
O questionário foi dividido em cinco eixos temáticos, abordando questões centrais para a análise das candidaturas:
- Perfil
- Apoio e financiamento
- Propostas
- Políticas públicas inclusivas e enfrentamento de discursos reacionários
- Violência política e desinformação
Acompanhe a entrevista com Amanda
Perfil
Resuma sua trajetória de vida/militância e o que a motivou a disputar estas eleições.
Comecei no movimento estudantil com 16 anos, no Instituto Federal de Santa Catarina. Dentro de casa, sempre tive referências dos meus pais, que trabalharam a vida inteira como operário e doméstica. Sempre me identifiquei com as pautas da esquerda e, em 2018, participei do Encontro Nacional de Estudantes em Ensino Técnico. No encontro, conheci a União da Juventude Rebelião (UJR) e a Unidade Popular pelo Socialismo (UP), vi pessoas que dedicavam sua vida à luta pelo socialismo, e decidi que queria isso para a minha vida também.
Desde então, fiz parte do Grêmio Estudantil do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina (IFSC), fui diretora da Federação Nacional de Estudantes em Ensino Técnico (FENET), participei da refundação e fui presidente da União Florianopolitana dos Estudantes Secundaristas (UFES). Construo movimentos sociais em Florianópolis, com o Movimento de Mulheres Olga Benário e o Movimento de Luta nos Bairros Vilas e Favelas.
Através desses movimentos, ajudei nas construções das ocupações Antonieta de Barros, uma casa de referência para mulheres vítimas de agressão doméstica, e Anita Garibaldi, ocupação urbana que denuncia a falta de moradias populares em Florianópolis.
Numa discussão coletiva, debatemos na Unidade Popular a importância de uma candidatura que represente a juventude, as mulheres, a população negra e os estudantes pobres de Florianópolis. Agora, estou oficialmente concorrendo à vereança enquanto única mulher preta com menos de 30 anos na disputa eleitoral, e estou, junto com a UP, elaborando um programa político que represente as parcelas da população que são excluídas da cidade e do debate político.
Quais personalidades políticas são suas referências?
Léo Péricles, Angela Davis, Vivian Mendes, Lenin, Indira Xavier, Malcolm X, Dandara dos Palmares e Antonieta de Barros são grandes referências para mim.
Apoio e financiamento
Você tem conseguido verba para a campanha? Quais?
Apoio e recursos do partido, financiamento colaborativo e doações diretas.
Você enfrenta desafios para arrecadar os recursos necessários para sua campanha? Se sim, quais são os principais?
Sim. A UP não recebe fundo partidário e o fundo eleitoral é insuficiente. Nosso partido recebe o menor fundo eleitoral do Brasil, o que dificulta diretamente a divulgação da nossa campanha. Além disso, não temos direito a tempo de rádio e temos pouquíssimo tempo de TV.
Qual é a importância do financiamento coletivo para a viabilidade de sua candidatura?
Nossa campanha é financiada pelas pessoas que acreditam em nosso programa, o programa do socialismo. Temos o princípio de não receber dinheiro de grandes ricos, e somos autofinanciados por nossos militantes e políticas financeiras.
Isso faz com que a gente chegue de forma honesta nos bairros, favelas, escolas e onde mais quisermos levar nosso programa revolucionário, sem ter “rabo preso” com ninguém. Assim, apesar das grandes dificuldades financeiras, sabemos que com o nosso trabalho podemos alcançar muitas pessoas que queiram construir a luta com a gente.
Propostas
Quais são os principais temas a serem debatidos no município e suas propostas para cada um?
Transporte público: redução da tarifa de transporte público garantindo que o gasto com transporte não ultrapasse 5% do salário mínimo. Fim da máfia do transporte: auditoria de todos os contratos de concessão do transporte coletivo e transferência das concessões para empresas públicas. Municipalização das empresas de transporte. Passe livre para os estudantes e desempregados durante toda a semana, incluindo os domingos e feriados.
Luta antirracista: criação da Secretaria de Direitos Humanos e Combate ao Racismo. Objetivo: garantir espaço institucional para ampliar as políticas públicas sobre o tema. Mais verbas para as políticas de combate ao racismo. Objetivo: criar condições materiais para implementação de projetos e políticas de combate ao racismo
Promoção de Saúde da População Negra. Objetivo: garantir mais acesso e melhor tratamento da população negra à saúde pública, impedindo a discriminação racial e promovendo igualdade do acesso. Lei que destine 30% das vagas em concursos públicos municipais aos negros e indígenas.
Quem forma sua base eleitoral? Quais são suas mensagens centrais? E seu slogan de campanha?
Jovens, estudantes, mulheres e pessoas negras são a minha principal base eleitoral. Meu slogan é “por uma jovem negra e socialista na câmara!”.
Tem propostas para promover a igualdade de gênero, LGBTQIA + e racial no âmbito municipal? Se sim, quais?
Sim. Proposta central do tema. Criação de Secretaria de Mulheres e combate a LGBTfobia. Objetivo: garantir espaço institucional para ampliar as políticas públicas para mulheres e LGBTTS.
Realizar mais investimentos em Centros de Atendimentos públicos para mulheres e LGBTT’s vítimas de violência, e construir novos centros nas regiões periféricas dos municípios onde a violência se mostra mais alarmante. Objetivo: pulverizar e democratizar os espaços de proteção às vítimas de violência.
A Guarda Municipal não será militarizada e racista, mas guardiã dos equipamentos e espaços públicos. Sua função também será para combater a violência contra as mulheres, jovens, LGBTT’s, negros e negras.
Criação da Secretaria de Direitos Humanos e Combate ao Racismo. Objetivo: garantir espaço institucional para ampliar as políticas públicas sobre o tema.
Pela implementação da Lei 10.639/2003 que obriga o ensino da história e da cultura africana e afro-brasileira e indígena em todas as escolas. Objetivo: contar a verdadeira história da cultura africana, afro-brasileira e indígena, fortalecendo a consciência e identidade racial da população negra Brasileira.
Garantia aprovação de lei que destine 30% das vagas em concursos públicos municipais aos negros e indígenas. Objetivo: garantir acesso da população negra a postos públicos de trabalho.
Retirada de estátuas, nomes de ruas e praças, que fazem referência a racistas e fascistas. Objetivo: garantir que homenagens sejam feitas apenas a defensores do povo.
Garantir através da secretaria de Direitos Humanos e Combate ao Racismo, medidas contra a intolerância às religiões de matriz africana (Candomblé e Umbanda). Objetivo: garantir a efetividade da liberdade religiosa, combate ao racismo e respeito às religiões de matrizes africanas.
Mais verbas para as políticas de combate ao racismo. Objetivo: criar condições materiais para implementação de projetos e políticas de combate ao racismo.
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Promoção de Saúde da População Negra. Objetivo: garantir mais acesso e melhor tratamento da população negra à saúde pública, impedindo a discriminação racial e promovendo igualdade do acesso.
Criação de campanhas para combater o assédio moral, sexual e toda forma de violência sexista e LGBTTfóbica. Objetivo: debater com a população e garantir os direitos das mulheres e LGBTT’s.
Você tem propostas relacionadas à política do cuidado? Se sim, quais?
Sim. Criação e/ou ampliação de maternidades e centros de parto humanizado. Objetivo: garantir assistência para mulheres durante a gravidez, parto e pós-parto.
Garantia de creches e escolas de educação infantil de turno integral e ampliação do atendimento das creches para os horários noturnos. Objetivo: garantir que mães que trabalham ou/e estudam a noite tenham onde deixar seus filhos em segurança.
Implementar a Função Social da Propriedade prevista na Constituição Federal. Objetivo: destinar imóveis e terrenos ociosos que não estejam cumprindo função social para fins de moradia popular.
Regularização fundiária de moradias em favelas, ocupações e bairros populares. Objetivo: garantir o direito legal à moradia.
Isenção de pagamento do IPTU para as famílias com renda per capita de um salário mínimo. Objetivo: desonerar as famílias de baixa renda.
Ampliação das políticas de restaurantes populares. Florianópolis possui a terceira cesta básica mais cara do país, garantir alimentação de qualidade para as pessoas é um dever da prefeitura.
Socialização dos trabalhos domésticos. Criação de lavanderias comunitárias, ampliação e expansão dos restaurantes populares para os bairros, principalmente para as periferias.
Fim das Parcerias Públicos Privadas na saúde, incluindo fundações e organizações sociais. Defesa do Sistema Único de Saúde (SUS) 100% público e gratuito, com administração direta do Estado.
Realização de concurso para garantir que todos os profissionais da saúde sejam do quadro efetivo dos servidores públicos. Objetivo: garantir que o dinheiro da saúde pública seja utilizado na construção de postos de saúde, unidades de emergência e valorização profissional. Saúde não deve ser uma mercadoria; eliminar o déficit de médicos, enfermeiros, auxiliares de enfermagem e demais profissionais nos postos de saúde e no sistema de saúde como um todo. Essa medida gerará emprego e aumentará a qualidade do serviço prestado a população
Socialização dos serviços de cuidado como centros de atendimento e acolhimento para pessoas com deficiência e pessoas idosas. Criação de espaços públicos acolhedores com profissionais habilitados para desenvolver a socialização e coletivizar o trabalho do cuidado.
Políticas públicas inclusivas e enfrentamento de discursos reacionários
Como pretende enfrentar discursos reacionários que comprometem a equidade de gênero e racial, especialmente na educação?
A extrema direita tem avançado com os discursos reacionário na câmara municipal, para combater isso é preciso que o povo, principalmente os jovens, mulheres, LGBTTS e negros, estejam presentes no debate político diário da cidade, por que hoje, nosso povo é excluído das decisões tomadas nos espaços de poder.
É preciso garantir a livre organização dos estudantes e incentivar a criação dos grêmios estudantis livres e autônomos das direções e secretarias de educação nas escolas municipais, pois esse é o primeiro contato que os jovens têm com a política.
Defender a livre organização dos servidores da educação nos sindicatos para combater os retrocessos e lutar por mais direitos e melhores condições de trabalho. Garantir que a educação municipal não sirva para reproduzir as violências da sociedade e sim para conscientizar os estudantes, pais e comunidades escolar, sobre o papel emancipador e formador de senso crítico da educação.
Como avalia a participação da sociedade civil na construção de políticas públicas municipais?
Hoje as pessoas são excluídas na construção de políticas públicas, os debates acontecem de forma “atropelada”, votações feitas às escondidas e apressadas, sem consulta faz as pessoas se afastarem cada vez mais da política, principalmente a juventude, mulheres, LGBTTS e negros.
Um exemplo: a última conferência municipal de saneamento aconteceu em um local pequeno, com pouca divulgação e sem participação efetiva dos principais afetados pela falta de saneamento na capital. Outro exemplo se trata dos debates do plano diretor, que ignoraram a vontade da maioria da população e ainda reprimiram quem se manifestou contrário. A câmara municipal e os espaços de poder estão servindo para reproduzir a vontade dos ricos, que é vender a cidade e expulsar a população pobre.
Sua plataforma propõe formas de ampliar a participação da sociedade civil na construção de políticas públicas? Se sim, como?
Sim. Propostas Central do Tema: criação do Conselho da Cidade, órgão de participação popular junto a prefeitura, que terá caráter de definir as ações da prefeitura em todos os aspectos da cidade e da administração pública. O Conselho da Cidade será composto por delegados eleitos nas conferências regionais e nos conselhos temáticos e terá poder deliberativo. O Conselho da Cidade se reunirá trimestralmente.
O Prefeito ou prefeita terá a obrigação de prestar contas do seu mandato diante do Conselho da Cidade e acatar as propostas emanadas da participação popular. Objetivo: engajar a população nos debates e decisões da cidade e efetivar a democracia popular.
Realização das Conferências regionais da Cidade e das Conferências temáticas. Objetivo: ampliar a participação popular e dar sustentação ao Conselho da Cidade.
Reduzir os cargos comissionados para 30% do número atual, fazer com que nenhum comissionado tenha, exercendo a mesma função, salário maior que um servidor de carreira e que sejam selecionados pela comunidade. Objetivo: reduzir gastos com comissionados e democratizar os cargos.
Realizar uma auditoria da dívida do município. Objetivo: eliminar a sangria desordenada de recursos públicos e melhorar a capacidade financeira do município para atender os interesses da população.
Reverter todas as privatizações, terceirizações e parcerias público-privadas dos equipamentos e empresas municipais. Investir e tornar as empresas públicas socialmente referenciadas. Objetivo: manter o patrimônio público, impedir a financeirização e o endividamento.
Criar fóruns de orçamento participativo. Objetivo: o povo participar da decisão em relação ao direcionamento da parte principal do orçamento da cidade, com a criação de mecanismos de participação direta do povo.
Qual o papel das minorias políticas na transformação dos serviços de saúde e educação municipais?
As “minorias políticas” precisam se unir enquanto classe, pois essa parcela da população é a mais violentada. Dados de 2023 trazem que no SUS, cerca de 45% das mulheres sofreram violência obstétrica. As mulheres pobres são as que mais sofrem na espera por atendimento primário e encaminhamento para atendimento especializado. Os estudantes negros e LGBTTS são os que mais abandonam as escolas e universidades por preconceitos e falta de auxílios.
Esses dados reafirmam que a população pobre da cidade é excluída quando falamos de saúde e educação, lutar pela melhoria e ampliação dos serviços públicos é lutar por melhores condições de vida para a população pobre, negra, LGBTT e mulheres.
Violência política e desinformação
Já sofreu ataques, incluindo intimidação, durante a sua trajetória devido à sua agenda política? Em caso positivo, pode compartilhar algum caso?
Não.
Nesta campanha, sofreu ataques nas redes sociais ou nas ruas? Se sim, quais?
Não.
Sua candidatura tem sido alvo de desinformação? Se sim, como?
Não.
Tem ações específicas para combater a desinformação? Se sim, quais?
Enfrentar as oligarquias que controlam a imprensa e a grande mídia, pois quem tem dinheiro manda e desmanda no que é publicado, no que as pessoas terão acesso. As “fake news” hoje estão muito vinculadas com as redes digitais e construir leis que regularizem e limitem o uso de IA é um dos caminhos para o combate às desinformações, afinal a internet não pode ser uma terra sem leis, como alguns ricos defendem para retirar a soberania de nosso país.