Manifestantes protestaram contra as violências econômicas, machistas e misóginas do governo.
No último sábado (4), mulheres de diversas idades e ocupações se reuniram no centro de Florianópolis para manifestar contra o governo Bolsonaro. O ato #BolsonaroNuncaMais foi mobilizado por vinte e nove organizações, e teve participação em todas as cinco regiões do país.
Na capital catarinense, a concentração se iniciou no Largo da Alfândega, às 9h30, com a chegada do caminhão de som e dos primeiros manifestantes, que traziam consigo faixas, cartazes e equipamentos. “Mulheres contra a fome e a carestia!”, “Mulheres contra o fascismo”, manifestaram nos cartazes erguidos na linha de frente.
Nesta edição do protesto contra Bolsonaro, as mulheres foram as principais protagonistas da resistência popular – papel já ocupado desde de 2018, como relembra Íris Gonçalves Martins, advogada e integrante do 8M. “A gente já estava na rua. Inclusive antes da eleição, a gente já disse #EleNão”.
A ativista Fafá Capela, da União Brasileira de Mulheres (UBM), ressalta a importância de um ato onde as reivindicações tenham como foco a desigualdade de gênero que também se relaciona com as opressões econômicas e raciais.
“A política genocida do Bolsonaro atinge mais a vida das mulheres, sobretudo as periféricas, que perderam o emprego, que não conseguem ter crédito, que a pandemia atingiu pela falta de política pública específica. [É preciso] reivindicar o ForaBolsonaro com recorte de gênero, pensando na mulher inserida no Brasil de hoje”, explica.
Ocupar as ruas é fundamental para que as violências promovidas pelo governo sejam constantemente denunciadas. Além do impeachment do atual presidente, as manifestantes denunciaram o alto custo dos alimentos e do combustível, o crescimento da fome no país e o fim de programas de transferência de renda, como o Bolsa Família.
Em um ato simbólico contra a fome que assola a população, manifestantes chegaram ao local com doações de alimentos não perecíveis. No local, também houve distribuição de absorventes, organizada pela UBM.
Apesar de algumas ofensas proferidas por apoiadores do presidente, o ato percorreu algumas das principais ruas do centro da cidade, com boa receptividade das/os trabalhadoras/es locais e transeuntes, aceitando os panfletos produzidos pela organização.
No encontro entre gerações, o grito de meninas e mulheres jovens se fez presente. Uma delas foi Eliziane Cristina Vieira, 16 anos, integrante do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), da União Juventude Revolução e do Coletivo Olga Benário.
Eliziane se fez presente para lutar por aquelas que estão ainda mais vulneráveis neste período: mulheres que têm o seu direito à moradia digna negado, e que vivem na ocupação Anita Garibaldi, no bairro Capoeiras.
Resistindo a uma ordem de despejo, as moradoras e moradores se inspiram em outras mulheres fortes para seguirem firmes na luta.
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“O Estado prefere ver as pessoas morando na rua do que ver um prédio sem função social sendo ocupado por moradores, por pessoas pobres da periferia, mulheres com crianças. Assim como Anita Garibaldi resistiu até a última, assim como Olga resistiu, a gente vai resistir também”.
A fome como projeto político
As mulheres indígenas e povos indígenas, assim como demais trabalhadoras/es pelo Brasil inteiro, saíram às ruas para denunciar a fome, a carestia, mas também para denunciar as violências específicas que essas populações sofrem, seja nas aldeias ou nas cidades. Como enfatiza Ingrid Sateré Mawé, 34 anos, professora e assessora parlamentar, filiada ao PSOL, a unidade das lutas sociais que mobiliza o país vem de um objetivo: derrubar o governo genocida.
“A população indígena sofre os efeitos da pandemia e não tem segurança alimentar. Tudo isso é feito de forma invisível, porque os dados não são colocados no Mapa da Fome e os povos indígenas ficam de fora dos registros. Essa situação se agrava devido ao desmatamento e ao avanço do agronegócio. Não se tem renda, não se tem terra, se tem fome, e isso é um ciclo sem fim (…). Nas comunidades dos povos originários a fome chegou antes mesmo do vírus, a sobrevivência veio da mobilização social”, relata a entrevistada.
Os efeitos predatórios do agronegócio na vida da grande maioria da população brasileira também foram destaque na faixa assinada pela Via Campesina Brasil. “Soberania alimentar: contra o agronegócio para o Brasil não passar fome”, dizia a mensagem. Uma das integrantes a erguer a faixa, a dirigente do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), Adriane Canan, analisa que a fome é um projeto político do governo Bolsonaro, que mata no campo e na cidade.
Conforme explica, há mais de dois anos o campesinato não recebe recursos para seguir a produção de alimentos saudáveis, que vêm da agricultura camponesa e familiar. “Nós, que sempre lutamos pela soberania alimentar, denunciamos o governo genocida de Bolsonaro, que só investe no agronegócio e que mata o povo de fome, pela Covid-19, pelas violências que são ainda mais pesadas sobre as mulheres. Estivemos nos atos em todo o país e seguiremos dizendo #BolsonaroNuncaMais”, afirma Canan que também integra a Brigada Gina Couto da Via Campesina, que atua em Florianópolis.
Além das denúncias contra o machismo, racismo e capitalismo, manifestantes se posicionaram contra as violências transfóbicas que também hierarquizam corpos. A jovem Luna Vanzela, integrante do coletivo LGTB Comunista, e da União da Juventude Comunista, reforça que somente com a luta das mulheres, sejam cis ou trans, enquanto classe mais explorada socialmente, será possível resistir a este governo.
“A importância de a gente estar juntas, em unidade de luta, de ação. As mulheres cis, as trans, travestis, pessoas transfeministas, pessoas não binárias, porque a gente precisa vencer a luta juntos. A nossa força vem da unidade de classe, como mulheres, como pessoas femininas, como trabalhadoras.”
Para Vanzela, somente através da luta unitária, é possível enfrentar um inimigo em comum: a burguesia.
“Essa burguesia cis, hetero, escravocrata, misógina e machista. É contra essa burguesia que a gente vai conseguir ter a nossa libertação, nossa emancipação sexual, de gênero, de trabalho, de classe. E a gente faz isso lutando pelo poder popular, todo dia, nas ocupações e nas ruas”.
Integram a organização do ato: Campanha Nacional Fora Bolsonaro, Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB), Confederação de Mulheres Brasileiras (CMB), Central de Movimentos Populares (CMP), Coletivo Juntas! Coletivo Nacional de Mulheres da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), Coordenação Nacional de Entidades Negras (CONEN), Evangélicas pela Igualdade de Gênero (EIG), Frente Internacional Brasileira (FIBRA), Levante Popular da Juventude, Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Marcha Mundial das Mulheres (MMM), Movimento Negro Unificado (MNU), Movimento de Mulheres Olga Benário, Movimento Sem Terra (MST), Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores por Direitos (MTD), Rede Nacional de Feministas Antiproibicionistas (RENFA), Comissão Nacional de Mulheres Trabalhadora Rural da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), Secretaria Nacional de Mulheres da Central de Trabalhadoras e Trabalhadores do Brasil (CTB), Secretaria Nacional de Mulheres da União Nacional dos Estudantes (UNE), Secretaria Nacional de Mulheres do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), Secretaria Nacional de Mulheres do Partido dos Trabalhadores (PT), Setorial Nacional de Mulheres do Partido Socialismo e Liberdade ( PSOL), Stop Bolsonaro Mundial, União Brasileira de Mulheres (UBM), União da Juventude Socialista (UJS), União de Negras e Negros pela Igualdade (UNEGRO).