A ativista e youtuber Louie Ponto trata de temáticas feministas e lésbicas o ano todo, mas preparou um projeto especial para o mês da visibilidade lésbica. A produção audiovisual que inclui dois vídeos, além do making of, estreou no dia 23 de agosto, trazendo uma leitura poética protagonizada por mulheres lésbicas de diferentes gerações e também suas experiências pessoais de autoaceitação e descoberta. O elenco e a equipe criadora são compostos inteiramente por mulheres lésbicas.
Louie conta que começou a projetar o conteúdo há cerca de três meses para que tudo ficasse pronto a tempo de marcar a data na maior plataforma de compartilhamento de vídeos do mundo. “Muitas vezes eu vi agosto passar despercebido. Sinto um apagamento muito grande. Dentro do próprio movimento (LGBT), são poucos os sites e os espaços feministas em que esta questão é tratada de fato, com recorrência”, observou.
Habituada ao trabalho solitário das produções em formato de vlog, a mestranda em crítica feminista, cantora e compositora escolheu um estilo poético para a produção. “Queria uma linguagem que tocasse as pessoas, que desse uma sensação de surpresa para quem segue o meu canal e também pras pessoas que não acompanham mas precisam pensar sobre essa questão”. A produção ganhou corpo com o apoio de outras cinco mulheres: Thalita Coelho fez o texto; Mariana Smania, a fotografia; Maria Fernanda Bin, a produção; Lara Koer, a edição; e Solana Llanes produziu o making off. A trilha é da cantora espírito-santense Ana Muller.
Time montado, Louie recorreu às próprias redes sociais para convocar as entrevistadas e viu chover inscrições. Cerca de 170 mulheres se dispuseram a participar do projeto. “Eu fiquei super surpresa e feliz porque senti confiança no meu trabalho”, conta. A seleção foi feita por sorteio e, ao mesmo tempo, procurando garantir a multiplicidade do elenco. “Tomamos cuidado pra que tivesse um grupo bem diversificado porque a nossa intenção era mostrar que somos todas diferentes, com as próprias vivências e marcas”.
“Se alguém disser que é fácil, tá mentindo”, diz Bruna. “É difícil sim, mas é mais difícil não ser você mesma”, completa Aymée.
Foi espontaneamente, após declarações como estas e a partir da riqueza do material colhido no dia da gravação em estúdio, que surgiu o segundo vídeo. As experiências de autoaceitação e de acolhida social e familiar (ou não) relatadas pelas participantes, fizeram mudar a perspectiva do projeto. A parte dois tem tom documental e será lançada exatamente no Dia da Visibilidade Lésbica, em 29 de agosto.
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“Comecei a fazer algumas perguntas e a gente percebeu que as respostas eram muito significativas e que precisava deste conteúdo também”, conta Louie. O clima de empatia do grupo no estúdio reflete no resultado. “As mulheres chegavam meio tímidas, não tinham experiência com câmera, e todas saíram muito emocionadas. A gente percebeu como cada situação é diferente, mas ao mesmo tempo parecida. Foi um dia muito emocionante, choramos várias vezes”, conta Louie.
A fotógrafa Chris Mayer foi uma das que chegou ao estúdio para gravar o texto e acabou contando como foi se descobrir lésbica em plena ditadura militar. 53 anos, gorda e lésbica mais que assumida, como se autodefine, ela conta que valeu a pena superar a timidez para contar sua história diante das câmeras. “Como é bom ser você mesma sem medo nenhum, como é incrível ser respeitada e tratada com delicadeza por ser exatamente assim. A equipe nos deixou muito à vontade. A gente mergulhava no poema que vociferava nossas gargantas engasgadas e sem engolir sapos, regurgitamos amor, orgulho, inteirezas, brilho nos olhos e a voz forte, os sentimentos intensos”, recordou.
Por sugestão de uma amiga, Sueli Adriano também se inscreveu e foi chamada para as gravações. Só no estúdio é que soube que participaria do projeto de um canal que tem mais de duzentos mil inscritos e inscritas no Youtube. “Eu não conhecia o trabalho da Louie. Depois que gravei é que eu soube qual era o alcance dos vídeos do canal dela. Então, comecei a tomar a dimensão da importância que essa gravação teria”, conta a professora. O projeto, na opinião de Sueli, pode ajudar quem não se sente forte para assumir a sua sexualidade. “É importante alguém botar a cara pra bater e fortalecer outras mulheres que estão acuadas, com medo de assumir quem são na sociedade, seja pela rede familiar ou pelo mundo machista em que nós vivemos”, acredita.
A expectativa de Chris e Sueli é a de que suas experiências, visibilizadas a partir do projeto, possam transformar as histórias de outras mulheres lésbicas. Louie conta que ouviu de muitas entrevistadas que gostariam de ter visto algo semelhante quando eram mais jovens. “Eu fiquei muito feliz por fazer um projeto coletivo e acho que é tão importante pra todas nós quanto pra uma geração de mulheres lésbicas que, eu tenho certeza, estão vivendo uma realidade diferente”, avalia. “O vídeo contribui pra que muitas dessas mulheres se sintam empoderadas pra começar a se expor e a viver a sua vida como deve ser vivida. Amar o outro independente do sexo. Amar não o sexo, mas as pessoas”, afirma Sueli. “É muito importante essa fala poética. É fundamental dar lugar e voz pra todas as pessoas oprimidas. Mas voz real, sem a indução do que somos ou querem que a gente seja. Esse vídeo é inspirador e multiplicador de certezas: somos mulheres e somos lésbicas. Com muito amor”, concorda Chris.
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