Organizações feministas cobram ação de universidade sobre apologia ao estupro
Estudantes foram fotografados segurando uma bandeira com a frase “entra porra, escorre sangue”. Organizações enviaram carta à Universidade Santa Marcelina.
O ‘Movimento Chega de Estupro’, formado por organizações feministas, enviou uma carta à reitoria da Universidade Santa Marcelina, de São Paulo (SP), em que pedem medidas para responsabilizar os estudantes fotografados segurando uma bandeira com a frase que remete à violência sexual: “entra porra, escorre sangue”.
Um grupo da universidade, com sede na Zona Leste de São Paulo, realizou a fotografia durante um evento esportivo no último sábado (15). A frase faz parte de um hino banido da atlética do curso, grupo formado por estudantes para participar de atividades esportivas.
“Minha bixete é exemplo, no boquete engole as bolas. Dá o cú sem vaselina, ela é Santa Marcelina. Se no cu minha piroca, na buceta ou nas teta. Entra porra e sai sangue, tu gritando igual capeta”, diz trecho da letra do hino, banido em 2017 após movimentações do Coletivo Francisca, grupo feminista formado por alunas e ex-alunas de medicina da faculdade.
Nas redes sociais, o coletivo publicou uma nota de repúdio contra a bandeira utilizada no sábado.
“Os machistas, os misóginos e os patriarcais não passaram enquanto nós estamos aqui, juntas, unidas e prontas para lutarmos contra qualquer ato que fira a nossa dignidade humana”, diz trecho.
O grupo também encaminhou um documento de denúncia à diretoria do curso de Medicina.
Também nas redes sociais, a faculdade informou que adotou as seguintes medidas sobre o caso: instauração de sindicância, comunicação dos fatos ao Ministério Público, identificação dos alunos à Delegacia da Mulher e interdição da atlética.
A atlética envolvida privou a conta no Instagram.
Na carta enviada à reitoria, o ‘Movimento Chega de Estupro’ pede que “a administração e todos os responsáveis tomem todas as medidas necessárias e cabíveis para sancionarem de maneira severa, com a toda a responsabilização necessária, os envolvidos nos recentes acontecimentos a fim de coibir situações similares”.
Leia a carta na íntegra:
À Reitoria da Universidade Santa Marcelina
Os recentes acontecimentos envolvendo alunos dessa instituição que fizeram diretas apologias ao estupro são, incontestavelmente, repugnantes e representam uma gravíssima violação dos direitos humanos e da dignidade da pessoa humana constitucionalmente garantidos em nosso país. Tal comportamento é absolutamente inaceitável para toda sociedade e para toda a comunidade acadêmica.
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Qualquer ato que glorifique, trivialize ou justifique qualquer forma e espécie de violência sexual é crime penalmente tipificado no Brasil que reforça e contribui, diretamente, para a perpetuação de um ambiente social hostil, violento e discriminatório, especialmente com mulheres, crianças, jovens e demais grupos vulneráveis.
Os dados de estupro no Brasil são alarmantes. Com base nos estudos e pesquisas do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) de 2023, separamos 5 pontos de suma relevância.
- Uma pessoa é estuprada a cada 6 minutos no Brasil;
- 62% das vítimas têm até 13 anos de idade;
- 84,7% das vezes os agressores são familiares ou conhecidos;
- O Brasil registrou aproximadamente 84 mil ocorrências por estupro em 2023; e,
- 76% dos casos correspondem ao crime de estupro de vulnerável (menos de 14 anos de idade ou incapazes de consentir por qualquer motivo).
As universidades, enquanto espaço de formação de cidadãos responsáveis e críticos, não devem se eximir de sua responsabilidade em educar, conscientizar e ensinar seus alunos sobre princípios basilares de comportamento social, acadêmico, profissional, isonômico e digno.
É fundamental que todas as universidades, aqui em específico a Universidade Santa Marcelina, tome medidas imediatas e rigorosas contra todo e qualquer ato de apologia a crime, incluindo, mas não se limitando, a uma intensa investigação sobre todos os envolvidos nos acontecimentos; aplicação de sanções em conformidade com o regulamento interno da instituição e em conformidade com a legislação brasileira vigente; incessantes campanhas de conscientização que reforcem os valores de respeito à integridade física, psicológica e moral de todos os indivíduos; oferta de suporte às vítimas de quaisquer formas de violência, assédio ou importunação sexual, procurando sempre zelar por um ambiente seguro e acolhedor.
Precisamos ampliar a capacidade da sociedade de combater o estupro. Ressaltamos aqui que é inadmissível a permanência de pessoas que fazem apologia ao estupro dentro de um sistema de ensino e rechaçamos profundamente a postura conivente da universidade que permitiu que seu ambiente institucional tenha se tornado palco para tais manifestações criminosas.
Requeremos que a administração e todos os responsáveis tomem todas as medidas necessárias e cabíveis para sancionarem de maneira severa, com a toda a responsabilização necessária, os envolvidos nos recentes acontecimentos a fim de coibir situações similares.
É dever de toda e qualquer instituição de ensino preservar e preparar seus estudantes e futuros profissionais com a máxima observância, obediência e compromisso com os direitos humanos e sociais constitucionalmente garantidos em nosso país.
Assinam essa carta,
- Instituto Lamparina;
- Instituto AzMina;
- Instituto Patrícia Galvão;
- Associação Gênero e Número;
- Nem Presa Nem Morta;
- CEPIA- Cidadania, Estudo, Pesquisa, Informação E Ação;
- CRIAR Brasil;
- Anis – Instituto de Bioética;
- Grupo Curumim;
- Instituto GENi- Gênero e Interseccionalidades;
- Católicas pelo Direito de Decidir;
- Nós, mulheres da periferia;
- Instituto Incube;
- Casa Marielle Franco;
- GirlUp Brasil;
- Projeto Vivas;
- Associação Portal Catarinas.