Todo tempo é novo e nossa jornada como jornalistas é construir a história enquanto registramos o tempo presente. Produzir jornalismo hoje tem seus desafios. Por um lado, temos um campo fértil com a descentralização do conteúdo permitida pela web e sua convergência de formatos. Acompanhamos o que acontece aqui e acolá em tempo real e estamos conectadxs 24 hora por dia, rompendo barreiras culturais e territoriais. Por outro, nunca estivemos tão longe das pessoas. A individualização é um aspecto de nossa época e o jornalismo sente como nenhuma outra profissão o encarceramento dos indivíduos em bolhas que nos recortam cada vez mais a realidade.

Mas é também tempo de mudanças nas tradicionais compreensões sobre o jornalismo e seu exercício. O modelo vigente do jornalismo-produto segue em contradição. Ainda fornece lucro as grandes corporações, mas esgotando seus recursos produtivos. Profissionais sub-valorizadxs e adoecidxs e a concentração dos meios de comunicação de massa sufocam o exercício profissional ético e reflexivo.

O mundo está em transformação e o capitalismo, cada vez mais, responde à crise com o acirramento da violência. A fragmentação do pensamento, a desterritorialização, o consumo, o individualismo, as diásporas contemporâneas e a guerra nos mostram que, como humanidade, precisamos trilhar novas perspectivas, construir novas modalidades de vida em sociedade que não destruam, num futuro próximo, a vida tal qual conhecemos até aqui.

É nesse contexto difícil que se torna clara a necessidade de insurreição. O jornalismo-direito se reforça em detrimento do jornalismo-produto, demonstrando que o seu exercício deve ser atraído pela vontade de contar o tempo presente a partir das mais diversas vozes, dos mais diversos pontos de encontro e desencontro, das mais diversas perspectivas.

Catarinas nasce nesse novo tempo em que a tradição é contestada. E radicalizar é o lema: sobre o prisma do jornalismo, sob o sonho de uma vida menos desigual. A proposta é fazer jornalismo a partir da lógica do direito fundamental à informação, tendo em vista o seu exercício político impresso nas escolhas, mas sobretudo, amparado na pluralidade dispersa no mundo real. Fazer jornalismo em sua essência, essa é a radicalidade.

Diante desse desafio, apostar no gênero como especialidade está de novo ligado às zonas de tensões de nosso tempo e à necessidade de se caminhar enquanto humanidade, sem retrocesso de direitos e com a ideia do avanço social em nosso horizonte.

Somos muitas mulheres espalhadas pelo mundo. Vivemos uma onda de visibilidade das causas que nos tocam, mas ainda é cedo para dizer que já atingimos aquilo que é direito humano. Mulheres e meninas são violadas a cada minuto em todo o globo terrestre. A fome ainda é uma realidade em todo o mundo e as mulheres ainda são as grandes vítimas das guerras. A intolerância com as diferenças demonstra que discutir direitos básicos dos seres humanos é premente. Habitar o século XXI deveria nos impor a necessidade de discutir os direitos da mulheres, sobretudo a partir da ideia de equidade, necessária para atingirmos a igualdade num ambiente desigual. É nesse sentido que o feminismo nos atravessa como uma estratégia de ação essencial para a superação desta sociedade que ainda determina papéis, reserva lugares e inviabiliza o que não é hegemônico.

Do singular para o plural, Catarinas parte do seu lugar para o mundo. Nosso trabalho considera o contexto de nosso tempo e seus diálogos com nosso aqui e agora. Nossas pautas e fontes, sempre que possível, partem de nosso cotidiano, porque entendemos que o jornalismo e a luta pela transformação do mundo passam pela observação atenta do nosso meio, da nossa realidade, da vida de nossas mulheres.

Jornalismo em perspectiva de gênero é o jornalismo especializado no direito a ser quem se é. Somos uma gota no oceano, trabalhando para que o mundo em crise seja transformado pelo melhor, pelo bom e pelo justo.

Imagem em destaque: Angela Davis, de Edgar Garcia. O artista plástico estadunidense assina a capa do livro “Feminismo e política: uma introdução”, de Luis Felipe Miguel e Flávia Biroli.

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