30 horas de viagem, saindo de Florianópolis dia 22, rumo ao Ocupa Brasília. A ansiedade mal cabia no peito. Todos sabíamos que seria um dia histórico, de luta, contra um governo e as reformas que retiram direitos dos trabalhadores. E quem consegue dormir no ônibus ou consegue pensar em outra coisa que não neste dia 24, na chegada em Brasília e como seria este dia no marco da luta para barrar as atrocidades do governo Temer contra a classe trabalhadora?

Não tinha a certeza se teria muita gente e de qual o enfrentamento seria travado lá. Perto de Brasília a tensão só aumentava. Notícias chegavam pelas redes sociais de que haveria revista e o material, bandeiras, dos sindicatos não passaria pelo bloqueio policial. Que até mesmo isso teria sido fruto de acordo entre as centrais e a PM para realização de uma passeata “pacífica” e “ordeira”, do jeitinho que o capital e o governo queriam, tudo comandado lindamente pela PM do DF.

Mas nem tudo são flores na luta de classes. Ainda bem! A Macha saiu do Mané Garrincha até o Congresso. 150 mil segundo as centrais. 35 mil segundo a mídia burguesa. Um mar de bandeiras coloridas e de variados movimentos, centrais e forças políticas tomou Brasília. Uma grande demonstração de força. Porém, mesmo uma marcha pacífica, a PM já nos esperava com um arsenal de bombas às portas da casa do povo.

Algumas centrais como Força e a Nova Central passaram pelo bloqueio policial de revista no início da Esplanada. O carro de som da organização da marcha também passou. Nada mais passava. Faixas, carros de som, bandeiras, cartazes em forma de pirulito. Todo mundo tendo que abrir mochilas e ser revistado. Aquela conformidade me incomodou e resolvi não passar pelo bloqueio e esperar o bloco que considero de esquerda e de luta que vinha formado logo atrás. Trabalhadores e estudantes de várias correntes de esquerda. Me emociona dizer isso, jovens e pessoas dispostos à luta e a dar um recado ao governo.

O primeiro bloco a furar o bloqueio da polícia foi o da CSP Conlutas que avisou de cima do caminhão que iriam passar, que não tinha acordo com a PM. A coluna vinha fechada com blocos de madeiras que pediam o Fora Temer e que serviram de escudo. Escuto um “hu hu hu hu hu” homens e mulheres de escudo na mão, trabalhadores e estudantes disposto à tudo, a lutar e morrer por uma causa. Essa me foi a impressão. Aos berros de “nenhuma bandeira nossa ficará para trás”, “nenhum companheiro vai parar no bloqueio” e “avancem”, a coluna liderada pelo PSTU passou e atrás delas todos os demais movimentos de esquerda como MAIS, correntes do Psol, juventude, anarquistas, sindicatos ligados às centrais não pelegas, me dou o direito de não citar mais nenhum porque no meio do enfrentamento foi o que consegui ver mais nitidamente. Literalmente, a marcha seguiu com suas bandeiras de luta! Mas, do gramado perto do Congresso já se ouviam as bombas.

Nunca vi nada igual. As bombas vinham de todos os lados, com o intuito de dispersar a multidão que ali chegava. Cavalaria, truculência, balas letais, de borracha, os estilhaços das bombas quando caiam nas calçadas voavam para todos os lados. A nuvem de fumaça era tanta que me era quase impossível enxergar, fotografar e muito menos respirar. Do outro lado, a resposta veio. Barricadas, paus e pedras. Porque só quem vive em sua zona individual de conforto diante do que está acontecendo no País acha que a massa não iria responder.

Mais uma vez bravamente o carro de som da CSP Conlutas avisou “não iremos abandonar o front”. Algumas centrais pediam calma e outras dispensaram suas gentes, pedindo para que fossem embora. Daí eu vi o que para mim mais significou este ato. Os militantes ficaram. Bravos companheiros que ainda estão no PT e PCdoB, ligados à CTB e CUT, mesmo com o recuo de suas lideranças, muitos ainda ficaram ali somando à linha de frente da batalha. O que demonstra que as cúpulas que querem a paz enfiada a goela abaixo e acordos com este governo ilegítimo, que está cada vez mais sem aprovação popular, serão atropeladas por suas bases!

Líderes sindicais parlamentares que se dizem de esquerda fizeram um papelão pior que o da bancada da bala que pediu para a polícia recuar e parar de ferir o povo! Pasmem, alguns destes líderes sindicais e parlamentares que se dizem de esquerda, insisto nisso, pediram a prisão dos manifestantes e diziam que era um grupo de 40 vândalos e que deveriam ser isolados.

Pois bem, senhores parlamentares, somos todos baderneiros então! E a marcha praticamente toda teria que ser lavada presa!

Ali não tinha vândalos. Só lutadores! Às massas responderam com veemência à truculência não só dos policiais, mas da luta de classes que assola este País. Um dia o povo se revolta e quem não tiver com ele, estará contra ele!

Foram horas de confronto. Até exaurir as foças dos que estavam na linha de frente. Sem poder avançar mais, e aí cabe a desorganização das centrais, pois havia gente suficiente na linha de trás para isso, sendo que, estes estavam mais receosos, porém se mantiveram ali como apoio aos que lutavam nas trincheiras, inclusive socorrendo muitos deles, a Marcha sai da Esplanada e volta ao Mané Garrincha. Cansados da batalha, mas não derrotados, pois é só o começo, os bravos militantes seguiram com suas caravanas retornando aos seus estados, fortalecidos na luta. Na próxima é organizar melhor e tomar o Congresso. Greve Geral e mobilização nos estados são fundamentais para que esta luta que surgiu em Brasília no dia 24 não esfrie. Brasília foi um divisor de águas, entre os que querem manter a ordem do capital e os que querem construir um novo mundo! Fica o recado para direita e os burocratas da esquerda!

Marcela Cornelli é jornalista.

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