Tomo a liberdade de acrescentar algumas palavras à frase icônica da feminista Simone de Beauvoir: basta uma crise climática para que os direitos das mulheres sejam questionados. Estamos diante da maior catástrofe climática que o Rio Grande do Sul já viveu e, mais uma vez, as mulheres, e sobretudo as mulheres negras e periféricas, são aquelas que mais sofrem os impactos da irresponsabilidade política e da falta de gerenciamento correto das políticas de proteção ambiental.

Mulheres são minoria nas prefeituras e câmaras municipais e isso também é fator imperativo na falta de cuidado com a terra, com o meio ambiente e com a falta de planejamento para cidades resilientes e pensadas para a segurança das mulheres e, consequentemente, de todas as pessoas.

A água ainda não baixou completamente em nosso estado, conhecido pelos belos pampas e pelo bioma rodeado pela Mata Atlântica.

As enchentes afundaram muitas conquistas, pertences e futuros e arrastaram centenas de pessoas para os abrigos, mas, infelizmente, os lugares criados para acolher se transformaram em mais um local de insegurança para mulheres e crianças.

Inclusive, nosso mandato recebeu e encaminhou ao Ministério das Mulheres e à Câmara dos Deputados denúncias de casos de violência sexual perpetrados nos abrigos temporários contra mulheres desalojadas pelas inundações no Rio Grande do Sul, já na primeira semana do agravamento das enchentes. 

O que nos restou saber era se as águas barrentas, que tomaram conta de nossas ruas, também levaram a humanidade e a decência desses homens que cometeram violências em meio a uma situação tão desesperadora para todas e todos nós.

Percebemos mais uma vez as mulheres sendo reduzidas a um pedaço de carne. Ali, com seus corpos já cansados de sustentar o esforço pela sobrevivência, tinham de resistir também às violações sexuais das mesmas e de seus filhos e filhas.

Ainda bem que nossa conjuntura política nacional pôde intervir no estado e, através da ação atenciosa da nossa Ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, atendendo aos nossos pedidos de ajuda, de mandatos e organizações de mulheres gaúchas, cientes da urgência de uma perspectiva de gênero sobre a crise.

Sabendo da gravidade do cenário em que nosso Rio Grande se encontra e prevendo proteção às meninas e mulheres em outras crises climáticas que possam vir a acontecer no país, o Ministério das Mulheres lançou na última semana o documento: Diretrizes de Proteção às Mulheres e Meninas em Emergências Climáticas.

O documento lançado tem o objetivo de garantir a segurança e assistência adequada às mulheres e meninas, que se encontram em áreas atingidas, deslocadas, em abrigos temporários, com foco em suas necessidades específicas em razão das desigualdades de gênero, o racismo estrutural e as desigualdades econômicas.

Dentre as recomendações destaca-se a importância de medidas como resgate conjunto de familiares, cadastros inclusivos pós-resgate, prioridade no atendimento de grupos vulnerabilizados e ações específicas para casos de violência de gênero.

É preciso reconhecer a importância das diretrizes lançadas, mas também é necessário garantir a responsabilização dos agentes públicos estaduais e municipais na prevenção de desastres ambientais. Isso envolve investimento e lideranças com real comprometimento no cuidado com a terra e com a vida.

As mulheres parlamentares feministas gaúchas têm protagonizado a destinação de recursos para educação ambiental, contenção de encostas e drenagem em áreas de risco. Então, já passou da hora de ter mais mulheres à frente dos municípios!

Que neste ano eleitoral não nos esqueçamos de todo descuido ao qual nós mulheres fomos submetidas. Que a onda feminista mexicana, protagonizada por nossa irmã latina Claudia Sheinbaum, eleita a primeira presidenta mulher do país, chegue aos nossos municípios e nos possibilite cidades com bem-viver, respeito e dignidade para todas e todos.

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