Quando Mary chegou à ONG Seccond Chance, moradora do Estado norte-americano da Virgínia, trazia as marcas da violência doméstica na alma e no rosto. Tinha cicatrizes e não olhava ninguém nos olhos. Havia concluído o ensino médio e era boa datilógrafa, mas nunca havia trabalhado: era dependente do marido, o agressor que lhe causou as cicatrizes. Sem experiência profissional, não conseguia emprego, e sem emprego, não tinha como sobreviver. Após passar por tratamento psicológico, estético, cirurgia facial e treinamento, é funcionária requisitada em um hotel e alcançou a independência econômica.

Ludy Green abriu o encontro “Mulheres em Ação: 10 anos da Lei Maria da Penha”, promovido pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina e Coordenadoria Estadual da Mulher em parceria com o Consulado Geral dos Estados Unidos em São Paulo
Ludy Green abriu o encontro “Mulheres em Ação: 10 anos da Lei Maria da Penha”, promovido pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina e Coordenadoria Estadual da Mulher em parceria com o Consulado Geral dos Estados Unidos em São Paulo

Mary é um dos casos de sucesso da ONG Seccond Chance Employment Services apresentados pela sua fundadora Ludy Green durante a palestra “Combate à Violência Doméstica mediante Empoderamento Econômico da Mulher”, proferida na abertura do encontro “Mulheres em Ação: 10 anos da Lei Maria da Penha” nesta quarta, 28 de setembro. A ong atua há 16 anos nos Estados Unidos e já recolocou no mercado de trabalho cerca de 8 mil mulheres vítimas de violência e de tráfico humano.

As beneficiadas pela Seccond Chance são encaminhadas por abrigos e pelos serviços sociais. Após entrevistas, as mulheres têm acesso a atendimentos de saúde, psicológicos e também estéticos para reforçar a autoestima.  Antes da fase das entrevistas de emprego em empresas previamente cadastradas pela ong, as mulheres também passam por treinamentos. “Procuramos atendê-las com uma visão holística e sem julgamentos para ajudá-las a apagar as cicatrizes da violência”, conta Ludy Green.

A inspiração para criar a Seccond Chance veio da própria experiência. Filha de mãe vítima de violência doméstica, Ludy Green percebeu logo cedo que a dependência econômica é, com frequência, a principal barreira para que as mulheres rompam as relações com seus agressores. A ong que fundou após superar suas próprias barreiras como vítima secundária da violência doméstica hoje tem diversas filiais e pretende estender-se a todos os 52 estados norte-americanos e também para outros países.

Com formação na área de Recursos Humanos, a palestrante apresentou dados do impacto da violência doméstica para o mundo corporativo. Ela estima que o prejuízo das empresas com estes casos alcance R$ 3 milhões e custe outros R$ 728.8 milhões às empresas anualmente. Entre as causas, estariam a baixa produtividade e licenças médicas concedidas às vítimas. “A violência afeta o desempenho das mulheres no trabalho e também toda a comunidade”, afirmou.

Ao responder às perguntas da plateia, Luddy Green declinou os questionamentos políticos. Perguntada sobre os reflexos da possível eleição de Donald Trump para as lutas das mulheres norte-americanas, disse que “não estava ali para falar de política, mas de violência”. Também não se concentrou nas políticas do Estado Americano para a superação da violência doméstica. A palestrante emitiu sua opinião sobre a Lei Maria da Penha. “Fiquei impressionada com a criação desta lei, mas um pouco decepcionada. Esta mulher lutou tanto por vocês e seu agressor não foi preso”, lamentou.

A palestra em Florianópolis foi promovida pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina e Coordenadoria Estadual da Mulher em parceria com o Consulado Geral dos Estados Unidos em São Paulo. A palestrante, que viaja o mundo divulgando seu livro “Ending Domestic Violence Captivity: A Guide to Economic Freedom” (“Eliminando o aprisionamento pela violência doméstica: um guia para a liberdade econômica”), também tem agenda em Porto Alegre (30/09), Recife (3 a 5/10) e Fortaleza (6 e 7/10).

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