Nesta quarta-feira (07/04), o Portal Catarinas transmitiu a live “Não nos calaremos mais!” em solidariedade à atriz argentina Thelma Fardin que denuncia um caso de estupro. A violência ocorreu em 2009, quando ela tinha 16 anos, durante uma turnê da peça infantil “Patito feo” (patinho feio) pela Nicarágua. A acusação foi formalizada nesta terça-feira (06/04) pelo Ministério Público de São Paulo, pois o ator abusador argentino-brasileiro Juan Rafael Pacífico Dabul, conhecido como Juan Darthés, está foragido e, segundo informações, permanece escondido no estado.

Thelma Fardin deu início ao Movimento #MeToo na Argentina e fez a denúncia em 2018 após uma outra atriz, Calu Rivero, denunciar abusador em 2017. Em nota, o movimento em apoio à Thelma apresenta o percurso do caso onde a investigação perpassa três países. 

Todos esses atores trabalham em um complexo processo de extradição e cooperação internacional, validando a denúncia de Thelma Fardin, concordando que o acusado deve ser submetido ao processo penal no qual seja julgado por esses fatos. Desta forma, o Ministério Público Federal de São Paulo se une à investigação da justiça nicaraguense, do Ministério Público argentino – que colaborou por meio da UFEM na investigação realizada em Manágua -, da Interpol e dos diversos peritos que intervieram na causa. 

A live foi realizada por iniciativa da Rede Latino-americana de Combate à Violência no Meio Artístico, pela ONG Respeito em Cena Brasil e América Latina, em parceria com Me Too Brasil, Portal Catarinas, As justiceiras, Tamo Juntas, HDMF, retransmitida pelo Planeta Ella e Mídia Ninja.

Durante a live, a advogada Marina Ganzarolli do Me Too Brasil falou sobre o processo que envolve um alerta feito na Nicarágua, um pedido vermelho da Interpol, contra o ator Juan Darthés. Com o apoio do Ministério das Relações Exteriores, o crime pode ser apurado no Brasil. A advogada busca ferramentas para romper com os silêncios. “No Brasil, a denúncia de estupro de vulnerável e abuso sexual foi instaurada em 6 de abril. Como conseguiremos romper o silêncio de Thelma? Como conseguiremos romper o silêncio de tantas outras?”, questiona.

“Iremos transpor a muralha do patriarcado. Estaremos fortes e unidas para defender todas”

Luciana Sérvulo Cunha, fundadora da ONG Respeito em Cena, coordenadora e embaixadora da Campanha Latino-americana, documentarista e ativista, mediou o debate. Ela comentou que as provas das denúncias são tão robustas que o Ministério Público vai apurar o caso. Para ela, é necessário “tomar coragem e romper o silêncio, mas cada vítima tem o seu tempo”. Luciana, que já foi vítima de abuso emocional, diz que as violências vão minando a autoestima e deturpando a personalidade. “A sociedade vem naturalizando abusos por séculos. Chegou o tempo de sabermos que não é natural, não é normal os abusos de nossos corpos e de nossos espíritos”.

“#OlhaComoVocêMeDeixa transfere a culpa para a vítima. A vítima nunca é a responsável

A atriz Maíra Dvorek, conta que a primeira vez que foi estuprada tinha 18 anos e entrou em estado de choque. “É uma tarefa para toda vida saber o que é o silêncio. As pessoas perguntam o porquê do nosso silêncio. Nós já sabemos a cultura e os valores da sociedade à qual pertencemos. As pessoas perguntam que roupas estamos, como uma suposta culpa, não nos falam da Lei 12.845 do Minuto Seguinte*. Nós sabemos que somos postas em dúvidas”. Ela comenta que há situações em que a violência não está declarada, por isso a necessidade de os sindicatos ficarem mais atentos, pois os algozes contam com os silêncios.

“Denunciar um abuso é trabalho de sobrevivência e de resistência para o resto da vida”, afirma Maíra Dvorek

Conforme a ativista, é necessário que haja a mudança dos valores machistas, mas a escuta das vítimas é essencial. “A escuta é algo que vai fazer com que as coisas se transformem. Às vezes não é a pessoa que se cala, são as pessoas que não escutam. É necessário que mudem a sua postura na escuta, mas se você não muda você também é conivente. Quando você fala de violência é a ponta de um iceberg”, relata.

Paola Lattus Ramos da Redes de Atrizes Chilena (RACH) diz que um ponto importante do depoimento da Thelma foi o fato de que ela só rompeu o silêncio porque outras vítimas abriram o caminho antes. “Temos o feminismo, não se pode pensar que nessa sociedade viemos ao mundo para procriar. Basta! Por isso é tão importante esse espaço. Para lutar! Estamos juntas!”. Ela enfatiza que a palavra da mulher deve ser ouvida, pois nessa sociedade patriarcal se duvida das mulheres. “Que as companheiras sintam que não vão estar sozinhas nunca mais. Que a justiça não seja a favor de abusadores. As acusações prescrevem. Por quê? As mulheres chegam a levar 20 anos para denunciar. São grandes muros que temos que derrubar”, acredita.

A bailarina Laura Azcurra defendeu uma nova justiça, com equidade de gênero, “que seja mais feminista”. Segundo avaliou, o depoimento de Thelma foi “um marco nas denúncias”, pois deu início a um processo no país. A atriz e ativista Natália Badgen disse ser “um caso que representa todas as mulheres”. Ambas participaram da Coletiva de Imprensa na Argentina em que a vítima falou sobre o crime.

Entenda o caso

Juan Darthes, ator argentino-brasileiro, acusado por 6 atrizes argentinas de estupro e assédio, fugiu para o Brasil. Após vários anos, finalmente uma das atrizes, Thelma Fardin, que foi estuprada com 16 anos, conseguiu fazer com que o Ministério Público de São Paulo, estado onde ele está vivendo, o acuse.

Em novembro de 2019, a Justiça da Nicarágua ordenou a prisão e captura internacional do ator Juan Darthés, acusado formalmente pela promotoria do país por estupro agravado. Mas Darthés, nascido no Brasil, fugiu para cá aproveitando o fato de o país ter como princípio constitucional não extraditar brasileiros.

A Rede Latino-americana de Combate à Violência no Meio Artístico, organizada pela ONG Respeito em Cena no Brasil, e o Me Too Brasil trabalham para visibilizar a denúncia e colaborar para que a justiça seja feita e o ator Juan Darthés responsabilizado.

*A Lei do Minuto Seguinte (Nº 12.845) foi sancionada em 1º de agosto de 2013 pela ex-presidente Dilma Rousseff. Dispõe sobre o atendimento obrigatório e gratuito de pessoas que passaram por violência sexual.

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