À vítima o medo, ao agressor a fiança
Santa Catarina teve 14 cidades entre as piores para ser mulher no Brasil.
A Tewa 225 divulgou, em março, um estudo inédito que traz as piores cidades para ser mulher no Brasil. Santa Catarina teve 14 municípios no ranking nacional que analisou 319 cidades com mais de 100 mil habitantes. E os índices alarmantes não param por aí. Segundo dados da Polícia Civil, de janeiro até 25 de março deste ano, cerca de 26 mil mulheres catarinenses sofreram algum tipo de violência doméstica.
E, infelizmente, nas últimas semanas, fomos testemunhas da falta de sensibilidade da justiça com as mulheres que sofrem ataques de homens.
Em Lages, bastou uma fiança de pouco mais de sete mil reais, para que um agressor – em flagrante ato de terror contra a ex – se visse livre da cadeia.
E o escárnio não é exclusividade brasileira. Ser mulher no exterior também é desesperador, a exemplo do caso do ex-jogador Daniel Alves, que foi solto pela justiça espanhola das acusações de estupro – mesmo com provas e testemunhos.
São quase 300 denúncias de violência doméstica registradas na Polícia Civil por dia em nosso Estado. Conforme o relatório da Violência Contra a Mulher do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, o crime com maior número de ocorrências em 2024, foi o de ameaças, resultando em mais de 47% dos 76.308 mil crimes relatados. Em seguida vêm lesões corporais (22%), depois injúria (14%).
O TJSC também destacou, no documento, as cidades catarinenses em que mais ocorrem crimes contra as mulheres. Liderando o ranking, em números absolutos, está a nossa capital Florianópolis, seguida de Joinville, Blumenau, Chapecó e Itajaí.
Contra fatos não há o que negar. Porém, onde estamos errando? Todas as ações voltadas ao combate a este crimes sempre colocam na vítima o peso da denúncia. Porém, nem sempre essas mulheres encontram o respaldo necessário para se sentirem seguras após uma agressão, um ataque.
Em 2024, mais de 30 mil medidas protetivas foram requeridas em Santa Catarina. Somente entre janeiro e fevereiro de 2025, quase seis mil medidas foram concedidas, de acordo com o TJSC. Por sua vez, em grande maioria dos casos, o agressor não se importa com a medida, e segue perseguindo e atacando a vida da vítima, esta que vê seu algoz livre depois de pagar determinadas quantias ao judiciário.
Às mulheres o medo, aos criminosos a fiança, a liberdade. Uma disputa desleal, já que a vítima não terá paz. Essa mulher seguirá seus dias sem saber quando ou como será novamente atacada por aquele que, em tese, deveria estar preso. Não podemos mais normalizar essas decisões. É inadmissível que ainda mulheres morram dentro de suas casas nas mãos de maridos, filhos, namorados.
Lembro aqui, de um outro fato que podemos, quem sabe, correlacionar com os dados da violência doméstica. Há 365 dias o Governo Federal, liberou um relatório de Transparência Salarial, que revelou que Santa Catarina supera a média nacional, com as mulheres ganhando 29% a menos que os homens pelo exercício da mesma função. Conseguimos atribuir aos números, diversos fatores, entre eles a falta de mulheres em postos de decisão, tanto nas empresas, como nos parlamentos.
É muito difícil ignorar que Santa Catarina segue sendo um Estado que lidera os números em relação à violência contra a mulher.
Sabemos bem que esta violência não é somente física, é também psicológica, sexual e patrimonial. Poderíamos interligar estes dados de violência com este dado sobre salários? Afinal, exercer a mesma função, ganhando 29% a menos, é um baque na estrutura da vida desta mulher.
Ansiamos por igualdade salarial e por liberdade de viver uma relação sem o risco de morrer. Mas, para isso, precisamos de uma atuação com mais entusiasmo, com disposição e principalmente com desejo de acabar com este problema. Mas enquanto isso, assistimos ao Governo do Estado negando a realidade, ao parlamento comemorando um projeto que pouco vai mudar a realidade desta vítimas. Proteger identidade na denúncia não me parece tão eficaz, afinal, o olho roxo não tem como esconder.